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Crónicas da América
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Os 11 desafios mais importantes de Guterres

13 out, 2016 - 01:17 • José Alberto Lemos, em Nova Iorque

António Guterres é esta quinta-feira confirmado na Assembleia Geral das Nações Unidas como secretário-geral. Português necessita de maioria simples para passar no teste e assumir o lugar de Ban Ki-moon.

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Todas as organizações geram culturas próprias e até uma linguagem própria. E quanto maiores e mais poderosas são, maior é a tendência para criar o seu próprio jargão que passa a fazer parte da identidade da “casa”.

As Nações Unidas não são excepção, naturalmente. Uma das características da “casa” é que não há problemas para resolver, mas desafios para enfrentar. A palavra ‘problema’ raramente se ouve no Palácio de Vidro, em Nova Iorque. Os responsáveis preferem falar em ‘desafios’.

Quando se candidatou ao cargo de secretário-geral da ONU, António Guterres apresentou um programa e definiu algumas metas a alcançar. Um programa que enuncia mais métodos de actuação do que propriamente prioridades de intervenção. Essas, como sabemos e Guterres sabe melhor do que ninguém, são mais impostas pela realidade mundial do que escolhidas pelas Nações Unidas.

Vejamos por isso sucintamente alguns dos desafios mais importantes que o secretário-geral português vai enfrentar.

Salvaguardando o eclodir de crises inesperadas que podem, de um momento para o outro, alterar prioridades, as grandes questões mundiais que dominarão o mandato de cinco anos passarão inevitavelmente pelos seguintes problemas (por ordem decrescente de importância):

Guerra na Síria

A Síria será seguramente a prioridade de Guterres, à luz da tragédia que devasta o país há cinco anos. Não há nenhuma situação no mundo actual que se lhe compare em termos de sofrimento humano. E também não há conflito que mais tenha contribuído para minar a relação entre os EUA e a Rússia, hoje quase em clima de guerra fria. Com os campos políticos extremados e a situação militar no terreno num impasse – nem Assad será derrubado, nem os rebeldes que o combatem se renderão – não se vislumbra qualquer saída para o conflito. Não será surpreendente se esta for a maior dor de cabeça de Guterres durante todo o mandato.

Refugiados

Nunca houve tantos como agora desde a II Guerra Mundial. A ONU calcula que tenham atingido os 60 milhões. Nada que Guterres não tenha previsto. Em 2007, disse à Renascença que “este vai ser o século do povo em movimento”. Há-os de muitas proveniências – Afeganistão, Iraque, Etiópia, Somália, Mali, Iémen – mas a premência da questão resultou sobretudo do conflito sírio e das ondas de choque que a fuga em massa provocou (e provoca) na Europa. É um problema que Guterres conhece melhor que ninguém e para o qual advoga no seu programa um apoio decisivo aos países de acolhimento como o Líbano, a Jordânia e a Turquia. Além da resolução dos problemas dos países que geram os refugiados, claro. E é um problema em que até talvez possa encontrar um consenso internacional para mitigar a tragédia humanitária em curso, mas que a onda populista e xenófoba na Europa ameaça frustrar.

Terrorismo

Já existia antes do conflito sírio, naturalmente, mas assumiu outras proporções desde que ele começou. A emergência do auto-proclamado Estado Islâmico (ISIS) deve-se sobretudo ao terreno favorável que encontrou no território sírio. Embora continue actuante e mereça a maior vigilância e preocupação, é uma ameaça em recuo. O consenso internacional quanto à necessidade de cooperar na luta anti-terrorista não só tem produzido resultados palpáveis como facilitará a vida a Guterres. Poderá ser uma das questões que registe franco progresso no fim do mandato.

Afeganistão e Iraque

Dois países “vítimas” do 11 de Setembro requerem atenção e recursos infindos para estabilizarem política e militarmente. Afeganistão e Iraque são hoje a maior responsabilidade da ONU em termos logísticos e políticos. Não há maior desafio operacional do que este “state building” em curso em ambos depois da retirada de quase todas as tropas americanas. Uma verdadeira dor de cabeça porque nem o exército afegão nem o iraquiano se estão a revelar capazes de dar um mínimo de estabilidade aos respectivos países. No caso afegão há mesmo um recuo do controlo territorial perante as ofensivas crescentes dos talibãs. E no Iraque os terroristas de vários matizes continuam a controlar largas porções de território e cidades importantes. Dilacerado entre xiitas, sunitas e curdos, o Iraque já leva 13 anos de guerra e não deverão ser os próximos cinco que vão trazer a paz e muito menos a estabilidade. O mesmo se diga do Afeganistão, que já leva 15 anos de conflito.

Líbia

É hoje um país (?) com três “governos”. Dois de facção e um terceiro colocado pela comunidade internacional que tenta sobrepor-se às facções armadas e restaurar alguma ordem. Evitar a divisão do país em duas regiões dominadas por milícias antagónicas é o primeiro grande desafio. Mas desarmar os inúmeros grupos que emergiram após o derrube de Khadafi e a intervenção internacional está a revelar-se uma tarefa quase impossível. Sem Estado e sem controlo, transformou-se na plataforma mais perigosa para albergar terroristas do ISIS e outros que querem chegar à Europa. É o pátio das traseiras europeu donde podem vir as piores tempestades. Os próximos cinco anos requerem medidas eficazes para evitar a continuação do caos, sob pena de a situação se tornar endémica.

Ucrânia

O típico conflito congelado por obra e graça de Moscovo. Da Crimeia já quase não se fala. Os russos invadiram e ocuparam a província fazendo de conta que não eram eles e depois organizaram um “referendo” em que a maioria votou pela tutela do Kremlin. Mas do Leste da Ucrânia continua a falar-se e muito. Houve até um acordo firmado em Minsk que prevê a retirada das tropas russas da região. Letra morta? Talvez nem tanto. Talvez aqui Guterres consiga melhorar o diálogo no Conselho de Segurança e garantir progressos. Talvez o Leste da Ucrânia regresse à tutela de Kiev nos próximos cinco anos. Seria um óptimo sinal de como as relações Leste-Oeste teriam melhorado. Linguagem de guerra fria, note-se.

Expansão chinesa

A expansão chinesa nos mares do sul da China é potencialmente explosiva. Talvez não a curto prazo, mas o assunto já está inscrito na agenda mundial e merece a maior atenção e preocupação. Porque tem o potencial de envolver os Estados Unidos na região para garantir a liberdade de circulação marítima e aérea, mas também para proteger os vizinhos de Pequim que reclamam soberania sobre as ilhas que os chineses estão a ocupar à revelia do direito internacional. Nada menos de cinco países – Vietname, Filipinas, Taiwan, Malásia e Brunei – confiam na protecção americana para travar o expansionismo chinês. E Washington não se faz rogado em assumir esse papel. Recentemente houve uma deliberação do Tribunal Internacional de Justiça a dar razão às Filipinas quanto à soberania de algumas ilhas. Mas Pequim ignorou a sentença. Que poderá Guterres fazer para aplicar uma decisão de um tribunal das Nações Unidas? Neste caso pouco, muito pouco, dado o poderio de Pequim. Será provavelmente um conflito de baixa intensidade durante todo o mandato, mas que não vai diluir-se nas águas salgadas dos mares do sul da China.

Coreia do Norte

O programa nuclear norte-coreano tem suscitado crescentes preocupações graças ao aumento de ensaios com mísseis que Pyongyang vem fazendo. A obstinação do líder norte-coreano e a ineficácia chinesa em pressionar mais o seu aliado na região para congelar os ensaios e desistir do nuclear não auguram nada de bom nos próximos cinco anos. A previsível instalação de um sistema anti-míssil pelos EUA na Coreia do Sul deixa Pyongyang a espumar de raiva a Pequim com insónias. A influência chinesa sobre o novo líder Kim Jong Un é hoje uma incógnita, mas talvez o programa nuclear continue a servir os mesmos propósitos que tem servido até hoje: garantir ajuda internacional à população faminta quando as colheitas são más. Uma chantagem que dura há décadas e que não está ao alcance de um secretário-geral da ONU desmontar. Serão cinco anos em que o melhor que se pode esperar é a diminuição dos testes de mísseis.

Índia vs. Paquistão

Noutro ponto da Ásia mora um conflito recorrente. A tensão entre Índia e Paquistão, duas potências nucleares, que ainda há duas semanas exercitaram os seus militares em escaramuças fronteiriças em Caxemira. É um conflito entre dois países que tem contornos claramente étnicos e religiosos, mas as actuais lideranças em Nova Deli e Islamabade parecem hoje mais sensatas e disponíveis para o diálogo. Já se visitaram mesmo mutuamente, o que é um bom sinal. Talvez Guterres consiga aqui uma détente duradoura, o que seria uma grande proeza.

Desenvolvimento e ambiente

Estes serão os nove desafios mais importantes que Guterres vai ter em cima da mesa durante todo o seu mandato. Claro que, além deles, há a guerra no Iémen, que está a pôr frente-a-frente sauditas e iranianos por interpostas milícias, mas que dificilmente escalará mais do que até aqui num país onde não há quaisquer riquezas apetecíveis.

E há ainda a preocupante situação na Somália, no Sudão do Sul, na Etiópia, na República Centro-Africana, no Mali, na Nigéria, no Congo, na Geórgia, sem esquecer o “eterno” conflito israelo-palestiniano. Mas estes são problemas menos prementes do que os anteriores para a estabilidade internacional.

No entanto, a agenda do secretário-geral não se faz apenas de conflitos internacionais, que o mesmo é dizer da paz. Há as questões do desenvolvimento sustentável, do ambiente, dos direitos humanos. E em cada uma delas as perspectivas parecem mais risonhas do que na paz. Talvez a excepção sejam os direitos humanos, onde se regista um recuo a nível mundial.

Mas Guterres tem pela frente a Agenda 20/30 em que se definiram os novos desafios do Milénio e que passa sobretudo pelas chamadas metas do desenvolvimento sustentável. E que consistem antes de mais em garantir o fornecimento de água potável e saneamento básico às populações que dele ainda não usufruem.

Parece elementar para quem vive em países desenvolvidos, mas esta meta vai ser uma das mais perseguidas nos próximos cinco anos. O presidente da Assembleia Geral, proveniente das ilhas Fiji, é um grande advogado desta causa e vai certamente pressionar para que ela se concretize. Uma causa que Guterres, que conhece bem os dramas de quem vive sem o mínimo de condições sanitárias, abraçará certamente com determinação.

Outra questão fulcral é o ambiente. A ONU teve um papel fundamental na concretização do Acordo de Paris sobre alterações climáticas assinado este ano precisamente em Nova Iorque. Considerado um progresso significativo em relação ao Protocolo de Quioto e ao falhanço de Copenhaga, o Acordo de Paris tem de ser ratificado pelos países signatários e implementado no terreno.

Da sua concretização depende a evolução do aquecimento global, hoje uma ameaça evidente. Também neste aspecto o presidente da Assembleia Geral pressionará, já que provém de um país ameaçado de submersão se as águas dos oceanos continuarem a subir.

Estes são dois desafios em que Guterres poderá eventualmente registar sucessos e aliviar as angústias provocadas pelas questões “insolúveis”.

A reforma institucional

Por fim, convém não esquecer aquele tema de que sempre se fala, mas que nunca se concretiza: a célebre reforma da ONU. Guterres não a inscreveu no seu programa como tal. Sobretudo teve a sensatez de não abordar a reforma institucional, como a do peso relativo dos seus órgãos e a do Conselho de Segurança.

Porquê? Primeiro porque isso lhe retiraria hipóteses de vencer a corrida, já que era justamente no Conselho de Segurança que precisava dos votos. Depois porque, pragmático como é, sabe bem que as hipóteses de alterar alguma coisa neste domínio são quase nulas.

Há 70 anos com a mesma estrutura e o mesmo centro de poder, a ONU não é propriamente reformável. Dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança não se espere que abdiquem do poder que têm. Como dizia com ironia um diplomata, “talvez a reforma do CS seja algo para os netos dos meus filhos”.

Há, contudo, medidas que podem ser tomadas noutros domínios e que trarão mudanças significativas. Como gerir melhor os recursos, angariar mais receitas no sector privado e na filantropia, avançar na paridade de género em cargos de responsabilidade, melhorar a imagem pública da organização.

Em alguns destes domínios Guterres tem provas dadas no Alto Comissariado para os Refugiados. Aumentou as receitas provenientes do sector privado, diminuiu o pessoal e avançou no equilíbrio de género. Neste último aspecto, está profundamente comprometido no seu programa, com metas temporais e avaliações periódicas. Hoje, mais de 80% das missões e cargos de responsabilidade são desempenhados por homens. Não será difícil alterar isso.

Se fizer o que fez em Genebra, o novo secretário-geral melhorará por tabela a imagem externa da organização, hoje vista por muitos como um monstro burocrático, demasiado gastador e pouco eficiente no alcançar dos seus objectivos.

Eis um último desafio para Guterres que talvez não seja propriamente um problema.

Comentários
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  • Os 11 desafios:
    13 out, 2016 lisboa 16:13
    1- Islamizar a Europa 2 -fazer da europa um pântano mululmano 3- perseguir de forma facciosa as potencias inimigas dos USA 4- colocar varios "cavalos de troia" islamicos em solo europeu 5-tirar da barriga dos necessitados europeus para dar aos de fora (subsidios) 6- seguir em frente com o "Plano kalergi" e o seu programa de miscigenação racial e exterminio progressivo da raça branca na Europa 7-ser marioneta do clube bielderberg 8- receber um chorudo de um ordenado e não dar um centimo a qualquer instituição de caridade 9- limpar a sua imagem politica em Portugal 10- seguir à risca os metodos do Instituto Tavistock (conrolo da mente das massas) 11-Criar pessoas como aquelas que me estão a criticar neste momento....
  • 13 out, 2016 lisboa 09:34
    Com a esquerdalhada no poleiro vai ser fácil para esse Guterres encher Portugal de muçulmanos e assim fazer figura de muito humano lá fora!! Humano com os impostos e descontos dos outros claro!!! Cheira-me pelo andar da carruagem que estamos lixados!!!

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