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Carlos Freire, o fotógrafo de escritores e não só

25 set, 2016 - 14:55 • Maria João Costa

No Festival Literário Internacional, o Fólio em Óbidos, está patente a exposição “Retratos de Autores, encontros nos caminhos da vida” do fotógrafo brasileiro Carlos Freire, cuja objectiva já captou os olhares de figuras como Jorge Luis Borges, Samuel Beckett ou Octávio Paz. Uma entrevista que também chega à tragédia de Alepo, onde viveu durante dois anos.

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Começou a fotografar em 1973. Em Paris, aos 23 anos, Carlos Freire iniciou os seus retratos da forma mais auspiciosa. “O meu primeiro retrato foi o Claude de Lévi-Strauss” explica-nos no Fólio, em Óbidos onde tem a exposição “Retratos de Autores, encontros nos caminhos da vida”. Na Tenda dos Autores, onde decorrem os debates desta segunda edição do Festival Literário Internacional, há a oportunidade de ver o resultado dos encontros que Carlos Freire foi tendo ao longo da vida.

A preto e branco, impressas em papel, estão fotografias de nomes como os do poeta Octávio Paz, das escritoras Doris Lessing, Marguerite Yourcenar, do filósofo Michel Foucault, dos autores Júlio Cortazar ou Jorge Luis Borges. Por baixo de cada quadro está escrito à mão por Carlos Freire, a tinta preta, a história de cada retrato. Para este fotografo esta mostra é a “ponta do iceberg” ou seja “um resumo pequeno” do que é o seu percurso no retrato.

Não incluídos nesta mostra estão retratos que fez dos escritores portugueses José Saramago ou Lídia Jorge. Ficou a faltar-lhe Miguel Torga, um escritor que diz adorar mas que já não foi a tempo do fotografar antes de morrer. Questionado pela Renascença sobre as “estrelas” que reuniu ao longo da sua vida, Carlos Freire explica-nos que “é uma constelação de estrelas de valor. Merecem todos eles a designação de estrelas porque fizeram alguma coisa por nós. Deixaram obra”.

Os livros são também matéria-prima deste fotografo. Carlos Freira admite que é um leitor. Talvez por isso, os retratos que fez destes escritores tenham também uma dimensão que vai para além do simples olhar de um fotógrafo. “Estas fotografias não são o resultado de um encontro breve. Eu pude estar com essas pessoas e conversar com elas” indica. “O momento fotográfico cruza-se com o momento do leitor que eu sou” diz o brasileiro que tem arrancado os melhores elogios no livro onde o público pode deixar a sua impressão sobre a exposição no Fólio.

Na conversa com a Renascença, Carlos Freire recorda o momento em que captou a imagem de Samuel Beckett. “Ele não gostava de fotografias” diz o retratista sobre o dramaturgo. “Era um momento grave para ele” recorda, e Carlos Freire era o único fotografo naquele momento em que captou Beckett de cabeça baixa e boina na cabeça.

No curriculum deste fotógrafo estão também outros artistas. Entre eles destacam-se o pintor Francis Bacon, o realizador Manoel de Oliveira, o arquitecto Óscar Niemeyer, ou os artistas Andy Wharol e Maria Helena Vieira da Silva.

A cidade síria de Alepo que já não existe ficou registada

Numa vitrina na exposição no Fólio encontra-se um dos livros que Carlos Freire fez. Trata-se de um dos exemplos dos trabalhos que ainda hoje desenvolve de retratar “lugares”. Agora trabalha num novo projecto com o arquitecto português Álvaro Siza Vieira sobre a cidade do Porto, mas já antes retratou a cidade de Génova do arquitecto italiano Renzo Piano ou com o poeta sírio Adonis fotografou a cidade de Alepo, hoje destruída pela guerra.

Carlos Freire, que viveu “quase dois anos em Alepo” fala em tragédia. O fotógrafo recorda as palavras de Adonis que “descreve a doçura que era a vida em Alepo” e acrescenta que hoje em dia o seu livro “virou um livro de referência porque é ao mesmo tempo documentário e artístico”.

“Os onze quilómetros de mercado subterrâneo que existiam em Alepo foram todos destruídos”, lembra com dor Carlos Freire, que sublinha que era uma cidade com mais de dois milhões de habitantes.

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