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Velha estação do Sul e Sueste renasce para turismo no Tejo

08 set, 2016 - 12:17 • Ana Carrilho

Obras devolvem ao edifício os elementos projectados no fim dos anos 20 pelo arquitecto Cottinelli Telmo, com adaptações para bilheteiras, dois restaurantes e uma loja de produtos turísticos.

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O Governo e a Câmara de Lisboa assinaram esta quarta-feira o protocolo de cedência da antiga estação Ferroviária Sul e Sueste à autarquia. O edifício, em adiantado estado de degradação, vai ser reabilitado para acolher o novo Terminal de Actividade Marítimo-Turística.

Vão ser feitas obras para devolver ao edifício todas as marcas e elementos projectados no fim dos anos 20 do século passado pelo arquitecto Cottinelli Telmo, com as necessárias adaptações para bilheteiras, dois restaurantes e uma loja de produtos turísticos.

O custo previsto é de sete milhões de euros, que saem do orçamento da Associação de Turismo de Lisboa, entidade a quem cabe também a gestão do espaço. Apesar de não se querer comprometer com prazos, o director do Turismo de Lisboa, Vítor Costa, afirmou à Renascença que gostaria que estivesse tudo pronto antes do fim de 2017.

A intervenção vai abranger o interior da antiga estação, mas também o exterior. Do lado do rio, aos dois pontões já existentes e que serão usados por barcos para circuitos no Tejo, será acrescentado um mais pequeno para embarcações pequenas ou tradicionais. Do outro lado, frente ao Ministério das Finanças, está prevista a instalação de esplanadas. A zona do Cais das Colunas também será arranjada.

“Esta é a última peça do projecto de requalificação da frente ribeirinha de Lisboa”, afirmou o presidente da autarquia, Fernando Medina. “Com a construção do Terminal de Cruzeiros em Santa Apolónia, as obras de requalificação no espaço público do Campo das Cebolas, Ribeira das Naus e Cais do Sodré, havia aqui “uma mancha, uma ferida, que era esta estação Sul e Sueste”.

O edifício estava encerrado há cinco anos, desde que a nova estação, mesmo ao lado, foi aberta ao público para garantir as carreiras regulares entre Lisboa e o Barreiro e o acesso à rede de Metropolitano. Neste período, alguns sem-abrigo procuravam refúgio junto aos portões.

De projecto em projecto até à construção definitiva da Estação Sul e Sueste

A ideia de fazer um interface ferro-fluvial em Lisboa tem mais de 160 anos e deve-se ao rei D. Luís I. A pensar em grande, a ideia do monarca é que aí convergiriam os caminhos-de-ferro da Europa e os barcos para o continente americano.

Após várias propostas e alterações, a estação de Santa Apolónia foi inaugurada no dia 1 de Maio de 1865. Por essa altura, o Estado contratou a construção de uma rede ferroviária entre a Margem Sul e o Alentejo.

Foi construída uma estação provisória, frente à capitania e ao torreão do Ministério da Guerra, no Terreiro do Paço. Um barracão de madeira e ferro, assente em estacarias que nos anos sucessivos foi sofrendo alterações sem, no entanto, conseguir responder às necessidades de um número cada vez maior de passageiros em tamanho, salubridade e comodidade.

No fim do século XIX voltou a ideia de construir uma estação de grandes dimensões na zona do Cais do Sodré, mas, entre as opiniões diversas e os pareceres, ora contra ora a favor, o projecto da estação definitiva foi ficando na gaveta.

Grandes eventos aceleram grandes obras

Finalmente, em 1928, a ideia de construir uma nova gare fluvial no Sul e Sueste passou do papel. E porquê? Porque se esperava que um grande número de turistas passasse por Lisboa no âmbito da Exposição Ibero-americana de 1929, em Sevilha. do rio naquela zona. O projecto foi entregue ao arquitecto Continelli Telmo.

Mas as alterações diversas atrasaram as obras e a estação só foi inaugurada na manhã do dia 28 de Maio de 1932, pelo Presidente Óscar Carmona, simbolicamente, para assinalar os seis anos do regime. No resto do dia a estação permaneceu aberta para que milhares de pessoas pudessem admirar a obra mas só no dia 2 de Junho começou a funcionar em pleno.

Com estilo "Art Déco", a Estação Sul e Sueste foi considerada como parte integrante da política de desenvolvimento iniciada pelo governo após a Revolução de 28 de Maio de 1926. Sóbria no exterior, no seu interior e sobretudo no átrio central, destinado aos passageiros e bagagens, revelava grandiosidade. Pilares revestidos a mármore de Vila Viçosa, serralharias com ornamentação de tipo geométrico, com círculos, ziguezagues, diagonais e triângulos cortados, estilo que se repetia nos mosaicos das paredes e na caixilharia das janelas das bilheteiras. Mas a maior atracção da Estação Sul e Sueste eram os dez painéis de azulejos desenhados pelo capitão Vitória Pereira e que representavam as principais estações de comboios do Alentejo e Algarve e da cidade de Lisboa. Todos os materiais usados na construção do edifício eram de origem nacional.

Ao longo de quase 80 anos, milhões de passageiros cruzaram a estação para atravessar o Tejo.

Em Setembro de 2011, esta estação fechou portas e deu lugar à nova estação Sul e Sueste, mais moderna, adaptada às actuais necessidades dos passageiros e com ligação ao Metropolitano que, entretanto, alargou a rede até Santa Apolónia.

Ao longo dos últimos anos, muitos foram os que se bateram pela sua classificação como “edifício de interesse público”, o que veio a acontecer em Novembro de 2012. De então para cá, a Câmara de Lisboa, com António Costa e, depois, Fernando Medina na presidência, tentou que o edifício passasse do Estado para a autarquia. Depois de muitas negociações, o protocolo foi assinado na quarta-feira. A recuperação que deverá ser iniciada em breve é liderada pela arquitecta Ana Costa, neta de Continelli Telmo. Fica tudo em família.

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