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Desmontado caso do “Evangelho da mulher de Jesus”

21 jun, 2016 - 01:09 • Filipe d'Avillez

A revista americana “The Atlantic” desmonta a história sobre um fragmento de um texto antigo que incluía referências a uma alegada esposa de Jesus.

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A revista americana “The Atlantic” acaba de publicar uma longa reportagem de investigação que desmonta totalmente a história, posta a circular há alguns anos, sobre um fragmento de um texto antigo que incluía referências a uma alegada esposa de Jesus.

Assinada pelo jornalista Ariel Sabar, a reportagem revela um bizarro esquema que conseguiu enganar vários especialistas e que leva o leitor da Alemanha Oriental para a Flórida e inclui ainda passagens pelos submundos da pornografia de fetiche.

O papiro, alegadamente um fragmento de um evangelho apócrifo, contém várias linhas legíveis, incluindo uma em que Jesus fala e se refere a “a minha mulher”. Em Setembro de 2012 o “achado” foi revelado numa conferência em Roma por Karen L. King, uma investigadora, causando imediatamente uma enorme sensação mediática.

O Vaticano desdramatizou o incidente, classificando o fragmento como uma falsificação mal feita e outros investigadores apontaram aparentes incongruências, incluindo erros gramaticais no copta antigo e uma gralha idêntica à que aparece noutro documento apócrifo, o que parecia confirmar a tese de cópia.

Contudo, vários exames levados a cabo não conseguiram provar cientificamente que o papiro não era genuíno.

Sabar, que na altura tinha sido o único jornalista presente na sala da conferência em Roma, acompanhou o caso desde o início e ficou com várias dúvidas. As suas investigações acabaram por desvendar um longo trilho de mentiras e falsificações, incluindo de cartas de peritos já falecidos e que alegadamente comprovavam a origem do fragmento.

King sempre disse que estava impedida de revelar o nome do dono do fragmento, que lhe tinha sido cedido, mas os documentos mostram que este já tinha sido pertença de um alemão residente na Flórida. Ao tentar saber mais sobre a personagem, já falecida, Sabar descobre um ex-parceiro de negócios dele, chamado Walter Fritz que acaba por admitir, depois de o ter negado várias vezes, ser ele o dono actual do papiro.

Fritz é, porém, uma figura extraordinária que desistiu do curso de egiptologia mas, logo após a queda do Muro de Berlim conseguiu ser nomeado responsável do museu da Alemanha de Leste, na antiga sede da polícia secreta, Stasi, onde permaneceu apenas alguns meses antes de desaparecer e reaparecer na Flórida, onde esteve metido em vários negócios.

Entre estes empreendimentos encontrava-se uma série de sites pornográficos com imagens e vídeos da sua própria mulher a ter relações sexuais com outros homens, tudo filmado e fotografado pelo próprio Fritz.

O artigo de Sabar termina com um encontro frente a frente entre o jornalista e Fritz em que este, continuando a negar que tenha sido ele a falsificar o papiro, acaba por tentar convencer o seu interlocutor a juntar-se a ele para escrever um romance ao melhor estilo de Dan Brown, mas insiste que não se podem limitar aos factos, uma vez que será necessário “inventar muitas coisas” para agarrar os leitores, e que “a verdade não é absoluta, depende das perspectivas”.

Depois de publicado o artigo no “The Atlantic”, a investigadora Karen King admitiu, em declarações à Associated Press, que tudo indica agora que o fragmento é uma falsificação.

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