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Opinião

​Cortar contratos, coarctar a liberdade, agravar a desigualdade

18 mai, 2016 - 16:42 • José Luís Ramos Pinheiro

A liberdade de escolha no ensino fica reservada aos mais ricos. Aos mais pobres resta-lhes a escolha que o Estado faz por eles.

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O corte dos contratos de associação com os colégios privados tem uma raiz ideológica. Falta o Governo assumir se a raiz é meramente economicista ou tendencialmente estatizante.

Ouvindo o ministro da Educação no parlamento, o problema parece ser económico. Diz Tiago Brandão Rodrigues que a redução dos contratos de associação é uma forma de “não duplicar a factura paga pelo contribuinte”. Se à demagogia devesse responder-se com demagogia, valia a pena perguntar ao ministro qual é então o valor do reembolso que o contribuinte vai receber, com a medida agora tomada. Se o contribuinte está a pagar demais, vai agora pagar menos?

Para além de demagógico, o argumento do ministro parece aproximá-lo da linha ideológica meramente economicista que a anterior oposição, agora apoiante do Governo, militantemente zurziu (por vezes, com razão) durante a última legislatura.

Mas debaixo do (aparente) zelo económico, surge a ideologia do Estado. O preconceito contra outras propostas educativas que não as do Estado. A compressão da liberdade de escolha. A limitação da liberdade de ensino. Daí que os cortes em discussão incidam sobre as turmas em início de ciclo – 5º, 7º e 10º anos – dissuadindo as famílias de matricular os seus filhos em escolas privadas, num momento de alteração do respectivo ciclo escolar.

A visão estatizante comprova-se ainda por um despacho publicado há umas semanas em Diário da República. Nesse despacho, o Governo restringe a frequência dos colégios financiados pelo Estado aos alunos que residam na respectiva área geográfica. Este “controleirismo” do Estado sobre as famílias fez-me recordar que antes do 25 de Abril, era prática generalizada a mudança artificial de moradas, de modo a que os pais conseguissem matricular os filhos na escola (estatal) que mais garantias lhes dava. Faz sentido este regresso ao passado? Ninguém percebe o anacronismo desta exigência?

Pode haver, nestes contratos de associação (como em muitas outras situações, tanto na esfera do Estado como no sector privado), negociatas ou abusos que devam ser corrigidos e resolvidos. Mas nada do que se disser consegue apagar o serviço que tantos colégios privados – católicos ou não católicos - têm prestado à sociedade portuguesa, designadamente a famílias pobres ou com fracos recursos económicos.

Ao cortar, nestes termos, o financiamento a estas escolas, o Estado parece apostar no seu esvaziamento progressivo e na redução das respectivas competências educativas. Claro que os alunos mais ricos poderão sempre suportar aumentos de propinas, que permitam a viabilização de algumas destas escolas. Deve então concluir-se que a medida do Governo tem como principais vítimas as crianças oriundas de famílias pobres ou “remediadas” que deixarão de ter condições mínimas para frequentar outra escola que não a do Estado.

A liberdade de escolha fica reservada aos mais ricos. Aos mais pobres resta-lhes a escolha que o Estado faz por eles. Escapa-se-me o conceito de liberdade e a noção de igualdade subjacentes a estas decisões.

Cortar estes contratos de associação significa, na prática, coarctar a liberdade e agravar a desigualdade: entre aqueles que podem continuar a pagar um projecto educativo diferenciado e aqueles que deixam de poder sonhar com ele.

A menos que, por absurdo, o objectivo fosse a total asfixia do ensino privado. Nesse caso, continuaria a não haver liberdade de escolha, mas todos – pobres e ricos – condenados a frequentar as escolas do Estado (esse verdadeiro educador das massas), estariam em pé de igualdade.

Este “amanhã que canta” pode entusiasmar o PC, mas não envergonha ninguém?

Comentários
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  • fernando coelho
    21 mai, 2016 souselas 08:58
    Tenho dois filhos n 11 e outro n 6, tenho escola cooperativa a menos d 3km, O meu filho mais novo vai ter d sair pra o 7ano para uma escola d estado k fica a 9km, vai ter d ir d transporte publico. Pois ate agora eu levava o, pois tb trabalhava n zona. Para o continuar a levar a k horas abre a escola publica? Não o posso deixar sozinho pois ele sofre d paralisia cerebral, ou o Sr. Governo vai dar o ordenado minino para acompanhar o meu filho.É k s fossemos uma família com rendimentos nunca tinha ido trabalhar depois d meu filho ter nascido. A escola dos meus filhos é tao publica como as outras. Mais d metade dos alunos são alunos carenciados, os mais carenciados ate teem o lanche d escola k lhe é oferecido. Os trinta procentro tem nessidades educativas especiais. E tb tem 20 alunos, onde um deles é o meu filho, com cirriculo especifico individual. Qual é o futuro d meu filho??????
  • Carlos
    20 mai, 2016 porto 18:17
    O meu filho saiu de uma Escola Pública para um Colégio Privado, mas tive de o pagar. Não foi para o Colégio por ser melhor, pelo contrário, nem tinha instalações adequadas como pavilhões ou recintos adequados para as aulas de Educação Física. Só pelo simples facto de ter mudado, subiu logo a média em cerca de 2 valores. Esses 2 valores foram muito importantes para passar à frente de centenas ou milhares de alunos provenientes das Escolas Públicas, que se calhar melhores alunos do que o meu filho, não conseguiram entrar na Faculdade do meu filho. Portanto essa história de que os Colégios Privados são de qualidade, não passa de uma vigarice. Só servem para promover a desigualdade de oportunidades. Quem tem dinheiro safa-se, quem não tem, ou é muito bom ou não passa da cepa torta.
  • fernando silva
    20 mai, 2016 coimbra 10:55
    O articuliosta pretende que sejam outros a pagar os estudos dos seus filhos, se os tiver.POis eu que tenho filhos criados e os fiz estudar no ensino publico, não fui nem sou capaz de chegar a esse estado de pretender que os outros paguem as minhas responsabilidades como humano, acho que a seriedade, a ética, a moral não chega a tanto. Conheço muitos meninos da mamã que fizeram isso, mas não há honestidade neste processo indecoroso. Liberdade sim, roubo a quem mais precisa para dar a quem menos precisa, NÃO. O governo faz muito bem, quem quer o que Portugal pode oferecer aceita, quem quer mais, (não melhorcomo a propaganda oportunista reaza)paga.Assim é a justiça , a ética, a seriedade . O resto , podem-lhe chamar igualdade como outro nome qualquer, trata-se de corrupção que querem empacotada á sua maneira e aos seus interesses! Já basta de tanto roubo ás claras !! O articulista tem pouca ética e muita oportunidade política na sua opinião.....
  • José
    19 mai, 2016 Braga 16:18
    Olá Boa tarde, (parte 2) Ou daquelas pessoas, que viram as suas poupanças de uma vida de trabalho árduo, serem arrastadas por um furacão de contornos apocalípticos e de difícil descodificação... Então eu pergunto, onde está a liberdade de escolha desta gente Humilde... A espécie Humana é tão perversa, defendemos com força de Golias os “nossos direitos”, que mal vemos as injustiças que paira há nossa volta...Não podemos esquecer que Portugal apesar de pequeno é imenso no que diz respeito ás desigualdades sociais... Também, não podemos esquecer, de que quando “Deus”, se assim podemos dizer, fez o homem deu-lhe um par de olhos, que estão orientados para olhar em frente (ver o outro) e não para nos vermos de cima a baixo, numa perpectiva egoísta e egocêntrica... E depois, fantasiamos,contamos ás crianças, histórias de conto de fadas; idealizamos uma sociedade perfeita, justa e solidária...E como se isto não bastasse, depositamos nas novas gerações grande Esperança...Com estes exemplos vamos longe...
  • José
    19 mai, 2016 Braga 16:14
    Olá Boa tarde, (parte 1) Nas ultimas semanas, muito se tem proferido e escrito, acerca de um assunto muito importante, que diz respeito a gestão de dinheiros públicos, que afinal são de todos nós. ...”Anda o estado a financiar o privado, nada mau, em tempos de crise”... ...“Quem quer ensino privado que acarrete com os custos”… ...” O financiamento só se justifica, quando o estado não tem capacidade de resposta”… ...”Se existe oferta pública, não se justifica esbanjamento de dinheiros públicos”... ...”Estão-nos a privar da liberdade de escolha”... Nos meandros da educação, ainda há muito para esclarecer, até porque nesta área do Estado Democrático, existem muitos esqueletos guardados no armário, muitos deles fechados a sete chaves... Mas, gostaria de falar sobre o argumento “liberdade de escolha”... Então, eu pergunto, os alunos que frequentam a escola publica, por ventura, alguma vez lhes foi perguntado, se queriam frequentar aquela escola... Ou então, a um doente que está sentado horas, num hospital publico a espera de uma consulta...Ou a um cidadão, que vive numa zona rural, onde fecharam o centro de saúde,o posto de correios ou o tribunal...alguma vez, lhe foi perguntado se concorda com tal situação... Cidadão este, que não possui carta de condução, nem sequer é beneficiado por uma rede de transporte diária, e a sua fraca reforma, depois de uma vida inteira de trabalho, e de pois de pagas todas as contribuições ao estado, não dá para pagar um táxi... (continua...)
  • José
    19 mai, 2016 Braga 14:56
    Olá boa tarde. Não partilho dos argumentos citados no seu artigo,ser pobre, não é sinonimo de uma vida ou futuro desgraçado... Existem, escolas publicas de muito boa qualidade, como também existem colégios de duvidosa qualidade… Desde que, se deu a massificação do ensino publico, muitos e bons profissionais se formaram, nas mais variadas áreas. Mal estaríamos, se só fossem bons profissionais, aqueles que frequentaram o ensino privado…Ainda, existe a ideia burguesa, de que, o que é privado é que é bom. Quem por ventura, não acredita que a escola pública, pode prestar um serviço de qualidade, que pague tão simples quanto isso… Hora bolas, ter regalias com a carteira dos outros, como diz a sabedoria popular, também eu. Não estamos a falar de gestão de dinheiros públicos!!! Por outro lado, estes colégios com contrato de associação, não se destinam aos mais desfavorecidos, como refere no seu artigo; são sim frequentados por alunos de famílias com posses... Para nos certificarmos disso, basta pormo-nos a porta destes colégios, para verificarmos que muitos destes alunos, são levados pelos pais em carros topo de gama, gabam se e até postam no facebooK as ferias de sonho que fazem, e os filhos ostentam roupas de marca. Por outro lado, não há igualdade de oportunidades, pois os colégios seleccionam os alunos… Que publiquem as listas dos alunos, para sabermos quantos alunos existem provenientes de bairros sociais, bem como de outras religiões ou etnias… Vamos ficar surpreendidos...
  • José Luís Lopes
    19 mai, 2016 Coimbra 09:45
    A defesa do indefensável. O exercício de retórica é interessante, mas quem o percebe não compra a este vendedor.
  • marcelo
    18 mai, 2016 amadora 17:51
    Qual liberdade de escolha? Aonde estão os colégios privados da zona de Lisboa com estas condições? Então só há liberdade de escolha na província? A liberdade de escolha não é critério. Percebo que quem beneficiou de largos anos de um estabelecimento de ensino privado, com acesso restrito, com população educativa selecionada a dedo, sem as regras de transparência e igualdade do setor público, queira manter o beneficio, mas é injusto e desigual para os demais. Em Lisboa essa opção custa 500 euros por filho! Não estou para pagar a escolha que os outros têm e eu não tenho.
  • Coartar?
    18 mai, 2016 lx 17:45
    a liberdade? Mas onde é que a liberdade está coartada? Só porque o governo pretende cumprir a lei que o anterior governo deixou?...Será que o articulista está a ser intelectualmente honesto?...Ou, são só as paixões que o movem e que lhe permitem escrever tudo?
  • António Ferreira
    18 mai, 2016 Faro 17:28
    Eu estudei num colégio particular durante algum tempo mas eram os meus pai quem pagava e não aprendi nada por lá que não pudesse ter aprendido numa escola pública. Os meus filhos estudam em escolas públicas e recuso-me a pagar para subsidiar escolas onde depois só alguns podem estudar e que muitas vezes ainda cobram mensalidades absurdas aos alunos criando-se desta forma condições de profunda desigualdade concorrencial com as escola publicas. Mas, ainda mais grave é que, depois, venham afirmar uma suposta superior qualidade em relação às escolas públicas mas que, além de ser falsa se verdadeira seria conseguida à custa dos financiamentos públicos.

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