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Papa diz que mercado inteiramente livre “não funciona”

16 mai, 2016 - 19:57

Numa entrevista a um jornal francês, Francisco sublinhou a importância do direito humano à objecção de consciência, sobretudo em casos como leis de uniões homossexuais e eutanásia.

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O Papa Francisco voltou a realçar que o mercado inteiramente livre não funciona, sendo necessário um poder moderador.

A resposta do Papa surgiu, curiosamente, no meio de uma questão sobre as relações com o Islão e as questões dos refugiados.

O “La Croix” perguntou a Francisco até que ponto a Europa devia aceitar todos os refugiados que chegam à Europa.

“É uma boa pergunta, porque não se pode abrir os portões sem critério. Contudo, a questão de fundo é porque existem agora tantos migrantes? O problema de fundo são as guerras no Médio Oriente e em África, bem como o subdesenvolvimento em África, que causa fome. Se há guerras é porque existem fabricantes de armas – o que se justifica para razões de defesa – e porque há traficantes. Se há subdesenvolvimento é porque há falta de investimento capaz de gerar emprego, de que África tanto precisa”.

“De forma mais geral”, continuou o Papa, “isto levanta a questão de um sistema financeiro mundial que se transformou numa idolatria do dinheiro. A maior parte da riqueza da humanidade concentrou-se nas mãos de uma minoria. Um mercado inteiramente livre não funciona. Os mercados em si são bons, mas precisam de um terceiro, de um estado para os monitorizar e equilibrar. Por outras palavras, uma economia de mercado social”.

Ainda sobre os refugiados, Francisco disse que mais do que acolher quem precisa, importa não permitir que se criem guetos. “A pior forma de acolhimento é criar guetos. Pelo contrário, é preciso integrá-los. Em Bruxelas os terroristas eram belgas, filhos de migrantes, mas cresceram num gueto. Em Londres, o novo Presidente da Câmara [o muçulmano Sadiq Khan, filho de imigrantes paquistaneses] assumiu o seu cargo numa catedral e certamente vai conhecer a rainha. Isto mostra que a Europa precisa de redescobrir a sua capacidade de integrar. Esta integração será tanto mais necessária agora uma vez que, devido a uma procura egoísta de bem-estar, a Europa está a passar por um grave problema de natalidade”.

O “La Croix” perguntou ainda a Francisco até que ponto os católicos serão livres de viver conforme as suas crenças face a leis modernas no campo da homossexualidade, aborto e eutanásia. O Papa defendeu a importância de respeitar a objecção de consciência.

“Cabe ao Parlamento discutir, argumentar, explicar e raciocinar estas questões. É assim que uma sociedade cresce. Contudo, uma vez que a lei é adoptada, o Estado deve também respeitar as consciências. O direito à objecção de consciência deve ser reconhecida no contexto da estrutura jurídica porque se trata de um direito humano. Isto abrange também os funcionários públicos, que também são humanos.”

Por fim, Francisco disse ao jornal francês que o sistema de laicidade francês exagera a separação entre a Igreja e o Estado. “Os Estados devem ser seculares. Os Estados confessionais acabam mal; É contra o rumo da história.”

“Eu acredito numa versão de laicidade acompanhada por uma lei sólida que garante a liberdade religiosa e oferece um enquadramento para se poder avançar. Somos todos iguais enquanto filhos e filhas de Deus, com a nossa dignidade pessoal. Contudo, toda a gente deve ter a liberdade de mostrar a sua fé. Se uma muçulmana quer usar véu, deve poder fazê-lo. Igualmente, se um católico quer usar um crucifixo também deve poder”, afirmou Francisco, referindo-se precisamente à proibição em França de usar símbolos religiosos em espaços públicos.

“As pessoas devem poder professar a sua fé no coração e não apenas nas margens da sua própria cultura. Eu diria, modestamente, que a França exagera a laicidade. Isto deriva de pensar que a religião é uma sub-cultura e não uma cultura por direito. Temo que esta abordagem, que se compreende enquanto herança do Iluminismo, continua a existir. França tem de dar um passo em frente a este respeito para aceitar que a abertura ao transcendente é um direito de todos”.

A entrevista do Papa Francisco ao jornal católico “La Croix” pode ser lido na íntegra, em francês, aqui.

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  • rfm
    18 mai, 2016 Coimbra 09:21
    “De forma mais geral”, continuou o Papa, “isto levanta a questão de um sistema financeiro mundial que se transformou numa idolatria do dinheiro. A maior parte da riqueza da humanidade concentrou-se nas mãos de uma minoria. Um mercado inteiramente livre não funciona. Os mercados em si são bons, mas precisam de um terceiro, de um estado para os monitorizar e equilibrar. Por outras palavras, uma economia de mercado social”. os "grandes" comentadores ditos católicos, cuja "fé..." se transferiu fanaticamente pata o ultraliberalismo /maoista (Cabral e das neves, 2 fanáticos do famoso mercado "livre" sem regulação e sob domínio da especulação financeira, por exemplo ) devem aproximar-se mais do Papa do que dos banqueiros e do ulraliberalismo7maoismo/expropriado a que tem adorado fervorosamente. As coisas tem de voltar ao seu lugar, recentrando-se nas pessoas, no humanismo e doutrina social da Igreja por muito que isso custe aos fazedores de opinião ditos "católicos" da direta de mercado anárquico e do egoísmo
  • indignado
    17 mai, 2016 Santarém 21:53
    O mercado livre funciona bem para os países asiáticos enquanto na Europa as fábricas se deslocam para lá e provocam por cá milhões de desempregados tudo isto com o apadrinhamento da União Europeia.
  • indignado
    17 mai, 2016 Santarém 21:53
    O mercado livre funciona bem para os países asiáticos enquanto na Europa as fábricas se deslocam para lá e provocam por cá milhões de desempregados tudo isto com o apadrinhamento da União Europeia.

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