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Eclipse

Dizem-lhe que é de luas? Não tem nada a ver com os astros

26 jul, 2018 - 16:30

Com o aproximar do eclipse total da Lua mais longo do século, são muitos os artigos que têm associado a Lua Vermelha a alterações de humor. O destruidor de mitos David Marçal é perentório: não culpe a lua pelo seu mau humor.

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Veja em que horários pode ver a Lua Vermelha


Quando olhar para o céu na noite desta sexta-feira, é bem provável que se surpreenda com uma Lua "pintada de vermelho". O fenómeno, que na realidade é um eclipse total da Lua, vai poder ser visto por umas horas - algo extremamente raro, que só volta a acontecer em 2100.

Com o aproximar do fenómeno, têm sido vários os artigos publicados na internet que têm associado a Lua Vermelha a alterações de humor.

Um artigo publicado no site da estação de rádio britânica Heart, partilhado centenas de vezes na rede social Facebook, fala da influência da Lua "nos níveis de serotonina" e cita um ex-polícia que afirma que, durante este fenómeno, os níveis de violência nas cidades tendem a crescer. Algo que David Marçal, bioquímico e jornalista de ciência, classifica como mito, não encontrando qualquer evidência científica para isso.

“A memória das pessoas tende a sobrevalorizar coisas que parecem interessantes e a esquecer as outras. Haverá certamente muitos polícias e bombeiros que não notaram nada de especial durante uma Lua vermelha, mas que não têm tanto entusiasmo em relatar essas experiências”, conclui o jornalista de ciência e destruidor de mitos.

Sobre a influência que este fenómeno pode ter sobre o seu humor, não tente justificar uma manhã mal humorada com a Lua. É verdade que a gravidade da Lua influencia fenómenos terrestres, como as marés, mas não o seu humor. Para as pessoas que o afirmam, David Marçal é bastante claro: não culpe a Lua pelo seu mau humor.

Questionado sobre o porquê de as pessoas tenderem a acreditar na influência dos astros nas coisas mundanas, o co-autor de "A ciência e os seus inimigos" lembra que os acontecimentos astronómicos com particular espetacularidade e sem uma regularidade evidente sempre foram alvo de mitos, da narrativa de medos e maus presságios.

O “grande rigor” oferecido pelos estudos matemáticos e físicos em torno dos fenómenos veio afastar algumas das ideias preconcebidas, mas algumas crenças populares subsistiram. “Basta ver a quantidade de vezes que o fim do mundo é previsto, muitas vezes com razões alegadamente astronómicas. Ou, por outro lado, a popularidade de que ainda gozam os horóscopos, que alegam uma influência (inexistente) da posição de estrelas no céu no momento do nascimento de cada pessoa”, observa Marçal.

Em tempos também já foi acreditado o mito de que nascem mais bebés em noites de Lua cheia, mas o investigador resolve a dúvida com um gracejo: “Como notou o astrónomo e divulgador de ciência Carl Sagan, no momento do nascimento a influência da gravidade do obstetra é maior do que a da Lua: a Lua tem mais massa, mas o obstetra está mais perto.”

Porque é que esta é a Lua Vermelha mais longa do século?

O que vai acontecer, de facto, é que a Lua vai ficar no cone de sombra da Terra, onde ainda existe alguma luz do Sol, “essencialmente, a componente vermelha do espetro”, conforme clarifica Rui Agostinho, do Observatório Astronómico de Lisboa, à Renascença.

“A lua recebe essa luz avermelhada e reflete-a também na nossa direção", continua o cientista. É nos momentos finais do pôr-do-sol que se nota uma paleta de várias tonalidades de vermelho e a refração da luz pelas camadas atmosféricas prolonga-se no espaço. Quanto mais saturada estiver a atmosfera, com poeiras resultantes da atividade vulcânica ou acontecimentos meteorológicos de larga escala, mais escuro será o eclipse e mais forte será a coloração da Lua.

Apesar de haver dois eclipses da Lua todos os anos, o fenómeno de sexta-feira é ímpar pela extensão temporal. A Lua pode apenas passar por uma corda do cone - corte na circunferência que não corresponde ao seu diâmetro - de sombra, ou, como acontecerá neste caso, a Lua pode atravessar “o cone de sombra da Terra pelo seu diâmetro e, por isso, demorará mais tempo.”

Os portugueses em território nacional não se encontram no melhor lugar para assistir à Lua vermelha de sexta-feira. “Quando a Lua nascer para nós, já estará eclipsada. A primeira metade do eclipse não será visível no nosso território”, acrescenta Rui Agostinho. “Veremos apenas quando a Lua aparecer no horizonte, já próxima de metade do eclipse."

No entanto, a Lua vai pintar-se de vermelho entre as 21h22 e as 23h19, em Lisboa, no Porto, em Coimbra, Faro e Funchal, e entre as 21h14 e as 22h19 em Ponta Delgada, segundo os dados do Observatório Astronómico de Lisboa.

Se perder este eclipse, “neste século, haverá outros eclipses que vão durar apenas entre um a dois minutos a menos do que este”, assegura Rui Agostinho.

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