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Alfie Evans, o menino que não deixa de lutar

24 abr, 2018 - 19:47 • Filipe d'Avillez

A pedido dos médicos, e contra a vontade dos pais, o tribunal mandou desligar o suporte de vida deste bebé. Contra todas as expetativas aguentou horas a respirar sozinho. A surpreendente história de um menino doente que espoletou uma crise diplomática e ética.

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Alfie está vivo. Tendo em conta os desenvolvimentos dos últimos dias, esse facto em si constitui surpresa e notícia.

Alfie Evans tem 23 meses e sofre de uma doença degenerativa para a qual não existe diagnóstico. A progressão da doença obrigou ao seu internamento, até se encontrar em estado semivegetativo, respirando com assistência de uma máquina.

Os médicos disseram aos pais que não valia a pena continuar a auxiliar a respiração do bebé, mantendo-o vivo artificialmente. O suporte de vida deveria ser desligado e administrados cuidados paliativos, deixando-o morrer sem sofrimento. Mas os pais, Tom e Kate, recusaram. Alfie estava vivo e a sua vida ainda tinha sentido. Não parecia estar em sofrimento e eles não desistiriam dele.

Como costuma acontecer nestes casos em que médicos e pais discordam sobre o interesse superior da criança, o caso foi parar aos tribunais, que deram consistentemente razão ao hospital. O pai de Alfie lançou uma campanha online, reuniu um exército de apoiantes – #AlfiesArmy – e, sendo católico, pediu ajuda à Igreja. O Papa escutou o seu apelo e pediu que fossem respeitados os desejos da família. O hospital pediátrico do Vaticano disse que estava disposto a recebê-lo. O juiz foi irredutível.

Médicos querem desligar máquinas. Papa apoia famílias dos doentes
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Na segunda-feira, esgotados os recursos judiciais, o Papa apelou novamente e ao mesmo tempo o ministro dos Negócios Estrangeiros falou com o seu congénere britânico. Quando se percebeu que isso não estava a funcionar, o Governo italiano tomou a medida excecional de atribuir cidadania a Alfie. O embaixador de Itália em Londres avisou que se o hospital desligasse a máquina e o bebé morresse, Itália agiria contra o Estado Britânico por homicídio de um cidadão seu.

Pouco depois das 21h os médicos desligaram o suporte de vida de Alfie. Os pais tinham sido avisados que dado o estado da criança, e a sua incapacidade de respirar sozinha, poderia morrer dentro de minutos. Seis horas mais tarde, “pasmados”, segundo Tom Evans, os médicos aceitaram voltar a oxigenar e hidratar Alfie. Durante todo aquele tempo o menino respirou sozinho, com mais ou menos dificuldade, provando, na opinião de Tom, que o seu filho não estava num estado de saúde tão deplorável como os médicos tinham garantido. O presidente do Parlamento Europeu recorreu ao twitter para mostrar o seu apoio à família, dizendo que "a força do amor está a derrotar o cinismo dos que desligaram a máquina. Todo o meu apoio para #Alfie e para os seus pais extraordinários.

Durante a longa noite em que Alfie só dependia de si e do amor dos seus pais, perante a inação dos médicos britânicos, uma equipa do hospital Bambino Gesù, em Roma, esteve em comunicação com os Evans a dar-lhes indicações sobre o que fazer para salvar Alfie. O Governo italiano manteve um avião em prontidão para ir buscar o rapaz caso Londres desse “luz verde”, as redes sociais incendiaram-se com apelos de britânicos e de italianos para que a vontade dos pais fosse respeitada.

Perante esta nova realidade, o juiz aceitou novamente ouvir os pais de Alfie. O tribunal disse temer que o bebé morresse em trânsito se fosse permitida a sua evacuação para Roma, mas ao mesmo tempo pediu ao hospital que deixasse os Evans levar Alfie para casa. Até lá, Tom Evans tinha sido ameaçado com detenção caso tentasse remover o seu filho do hospital, levando o conhecido perito em direito canónico e comentador Ed Condon a sublinhar a ironia de que: “No Reino Unido pode-se levar um familiar para a Suíça para pôr fim à sua vida. Mas se tentar levar o seu filho para Itália para salvar a sua vida, a polícia mantê-lo-á como refém até morrer”.

Os médicos queixam-se que toda a publicidade à volta deste caso gerou hostilidade contra os profissionais de saúde e dizem ainda que mesmo que o menino seja transferido para casa, isso só será possível dentro de alguns dias e não no imediato. Contudo este é já um cenário que parecia fora de alcance para a família Evans.

Pouco antes das 20h o juiz tomou a sua decisão. Alfie não viajará para Itália, mas a família e os médicos receberam ordens para dialogar no sentido de preparar um plano paliativo para o bebé, que poderá implicar a sua ida para casa. Contudo, um dos médicos que falou na audiência disse que neste momento isso não é possível dado a quebra de relação entre a equipa médica e os pais, afirmando que seria necessário uma mudança nessa relação para que isso pudesse ser considerado.

Alfie não vai recuperar e não vai ter uma vida “normal”. Mas o debate, as emoções e mesmo as discussões que a sua luta despertou são impressionantes para uma criança que nem dois anos tem.

Ao rejeitar o seu derradeiro recurso, negando à família a possibilidade de poder levar Alfie para Itália, o juiz descreveu a sua decisão como “o último capítulo no caso deste menino extraordinário”.

[Notícia atualizada às 22h29]

Comentários
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  • José Granja
    27 abr, 2018 Santo Tirso 09:12
    Como é possível que um tribunal , que deveria ser o garante da vida, decreta o termo da vida para uma criança que não pode fazer nada por si mesma. Não respeitam a vontade dos pais que têm amor, carinho , afecto para com aquele menino que geraram. É desumano. È inacreditável. Perdi todo a consideração que tinha pela justiça Inglesa. Que este caso venha a ser um apelo a rever muitas leis injustas, desumanas, que promovem um retrocesso na civilização da Europa.
  • João Lopes
    26 abr, 2018 Viseu 09:16
    A defesa da vida, em todas as circunstâncias, é a defesa da humanidade. Os promotores da cultura da morte − aborto e eutanásia − atentam contra a dignidade da pessoa humana: são os "bárbaros" e os "monstros" destes tempos… A eutanásia e o suicídio assistido são diferentes formas de matar. Os tribunais, os médicos e os enfermeiros existem para defender a vida humana e não para matar nem serem cúmplices do crime de outros...
  • António dos Santos
    25 abr, 2018 Coimbra 22:53
    Esta notícia vem confirmar outras, em que, o comportamento incompetente dos pseudo-tribunais britânicos. Como não entendo os médicos terem poder superior à família, bem como, demonstraram ser totalmente incompetentes. Para finalizar, sabemos que na área da acção social (crianças), justiça a inglaterra não é exemplo para nenhum país, são uma autêntica anedota.

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