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Escrever é um ato político e os livros dão um contributo, diz quem escreve

14 mar, 2018 - 21:57 • Maria João Costa

Segunda sessão do Festival Literário da Madeira juntou os escritores José Luis Peixoto, Sofi Oksanen e Elanor Catton.

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“Sinto que escrevo para dar um contributo, para acrescentar alguma coisa a esta grande construção de que todos fazemos parte” diz José Luis Peixoto, o escritor que quase ameaçou a moderadora da conversa quando esta perguntou a um painel de três escritores porque escrevem livros. O único autor português presente na segunda sessão do Festival Literário da Madeira acabou por explicar que foi “contagiado pelo pai com o gosto de construir e sentir realização com isso” para justificar porque tem já uma carreira que soma 18 anos de livros publicados.

O mesmo José Luis Peixoto que começou por afirmar que a pergunta “porque escrevem livros” não tinha resposta acabou assim por explicar que para si escrever é a sua forma de “contribuir”. Presentes também na sessão estiveram as escritoras Sofi Oksanen e Eleanor Catton. Esta última que em 2003 venceu o Man Booker Prize com a obra “Os Luminares” explicou que escrever para si é sentir-se viva. Nas suas palavras, “a experiência de criar algo a partir de nada é quase intoxicante” mas a autora nascida no Canadá e que cresceu na Nova Zelândia acrescentou que não sabe responder à pergunta “Qual é o objectivo em escrever”. Catton tem a esperança que escrever, como “qualquer acto criativo possa enriquecer o mundo”.

De nacionalidade finlandesa e estónia, Sofi Oksanen começou por falar do “chamamento” para escrever que sentia desde os seis anos. A autora de “A Purga” compara a sua arte com a representação: “escrever é como representar, a questão é que está no papel”. Para Oksanen que já recebeu entre outros os Prémios Femina e o Europeu de Melhor Romance, os livros e a literatura têm hoje um papel importante no combate “ao mundo das fake news”. Na opinião da escritora que considera “escrever um acto político”, os livros são “importantes para criar opinião”.

Mas a ideia desta segunda sessão do Festival Literário da Madeira tinha outro mote dado por uma frase do escritor norte-americano David Foster Wallace que diz “O trabalho da boa ficção é confortar o perturbado e perturbar quem está confortável”. A moderadora da sessão, a jornalista Ana Daniela Soares começou por quer saber a opinião dos intervenientes.

Eleanor Catton disse que adorava a frase e a literatura de David Foster Wallace, o escritor que classificou como pós-moderno. Contudo, a autora quis discordar da frase de Wallace. Catton defendeu “o prazer do final feliz” num livro, embora reconheça que “hoje pensamos que é ridículo acabar um romance com um casamento”.

Mais fraturante na escrita e na opinião é Sofi Oksanen que não se considera “uma escritora comercial” Segundo ela, os seus livros “não têm finais felizes”, mas isso não é intencional, “a culpa é das personagens”. Já José Luis Peixoto considerou que “é perigoso quando se apontam tarefas ou obrigatoriedades à literatura”. Para o autor de “Cemitério de Pianos” “sempre que se tentou constangir a literatura em definições, a literatura encontrou forma de se libertar”. Peixoto falou da sua carreira e lembrou que “depois da crise” sentiu “muita necessidade de escrever livros mais otimistas porque o ambiente geral era pessimista. Era quase proibido ter esperança”.

Numa sessão menos concorrida em termos de público do que a primeira, com Ricardo Araújo Pereira e Mick Hume, José Luis Peixoto falou ainda da razão pela qual escreveu o livro “Dentro do Segredo. Uma viagem na Coreia do Norte”. O autor português explicou ao público do Teatro Municipal Baltazar Dias que nasceu em setembro de 1974 e como tal não viveu a experiência da ditadura. Nesse sentido, viajar foi “sentir essa experiência” que traduziu em literatura. Nas palavras de Peixoto “escrever e publicar não são [atos] isentos. É ter a oportunidade de comunicar com os outros. É um contributo importante para a consciência coletiva”.

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