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2018, o ano em que a Grécia abandonou a sharia

10 jan, 2018 - 16:04

Quase um século depois de a vizinha Turquia ter proibido os tribunais islâmicos, a Grécia aprova uma lei que desvincula a pequena minoria turca que vive na Trácia Ocidental de seguir a lei islâmica em assuntos de casamento e heranças.

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A Grécia aprovou esta quarta-feira uma lei que acaba com um bizarro resquício histórico que a tornou o único país da Europa a manter a obrigatoriedade de se seguir a lei islâmica.

A obrigação aplicava-se apenas a uma pequena parte da população de etnia turca que vive na fronteira, na região da Trácia Ocidental.

Com a mudança da lei, os muçulmanos turcos da Trácia podem continuar a seguir a sharia para lidar com assuntos relacionados com direito familiar, de casamento e de heranças, caso assim entendam, mas deixam de ser obrigados a fazê-lo, como eram até agora.

A lei não era apenas texto morto. O caso tornou-se polémico quando duas muçulmanas recorreram ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) por causa de uma questão de heranças. Queriam que o caso fosse decidido ao abrigo da lei grega, mas no seu caso seriam obrigadas a seguir a sharia. Antecipando uma embaraçosa decisão contrária por parte do TEDH, Alexis Tsipras pôs em marcha a mudança da lei. Depois da aprovação disse tratar-se de um “passo histórico” que “expande a igualdade diante da lei a todos os gregos”.

A peculiaridade jurídica data de 1923, quando a Grécia e a República da Turquia, herdeira do Império Otomano, negociaram uma complexa troca de populações. Mais de um milhão de pessoas de etnia grega mas que viviam na Turquia foram enviados para a Grécia, a troco de cerca de 400 mil muçulmanos.

Mas as negociações permitiram duas excepções. A população grega de Istambul pôde permanecer, e a população muçulmana da Trácia Ocidental, na Grécia junto à fronteira com a Turquia, também. Não só as respectivas populações puderam permanecer, como os estados garantiram-lhes alguns privilégios, permitindo que nalguns assuntos fossem governados de acordo com as suas próprias regras religiosas. No caso dos muçulmanos da Trácia, imperava a sharia para inúmeros assuntos, como casamento, divórcio e assuntos relativos a heranças.

Três anos mais tarde a Turquia instituiu uma grande reforma, modernizando e ocidentalizando o país, abandonando a lei de inspiração islâmica e adoptando um código e uma constituição de estilo ocidental. Mas a Grécia continuou a respeitar o seu acordo, o que significou que os únicos muçulmanos na Europa que continuaram a ter de se submeter à sharia eram os da Trácia.

Com a alteração da lei os muçulmanos da Trácia continuam a ter esse direito, mas já não são obrigados a tal.

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