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Colapso do BES é "deplorável, chocante e machucou" a banca

12 nov, 2014

Irregularidades "foram uma surpresa muito grande" e a conta do BES pode sobrar para clientes de toda a banca, afirma o presidente da Associação Portuguesa de Bancos, em entrevista ao programa "Terça à Noite", da Renascença.

Colapso do BES é "deplorável, chocante e machucou" a banca

O que aconteceu no Banco Espírito Santo (BES) "é simplesmente deplorável, chocante" e provocou um "dano enorme" na reputação do sector, afirma o presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB).

Em entrevista ao programa "Terça à Noite" da Renascença, Faria de Oliveira diz que os outros bancos, que têm feito um "trabalho notável" numa conjuntura de crise, "acabam por ser machucados" pelo colapso do BES.

"Não se trata apenas de falarmos do dano de imagem. A verdade é que ainda não sabemos, também, o que é que vai representar o custo para o conjunto do sector bancário da solução adoptada para resolver um problema com características sistémicas", sublinha o presidente da APB.

"Nunca mais falei com Ricardo Salgado"
Faria de Oliveira garante que, apesar da "amizade de natureza profissional" que o une a Ricardo Salgado, “nunca mais falou” com o antigo presidente do BES desde o colapso do banco, em Agosto. No entanto, admite que gostava de ouvir Ricardo Salgado justificar "as muitas dúvidas que muitos de nós temos" sobre o que levou à queda de um dos maiores bancos privados portugueses.

Para o antigo ministro, o que aconteceu no BES foi uma "verdadeira ocultação de dados", "eventualmente manipulações" e "promiscuidade nas relações de grupo", que "contaminaram" o banco, quando a instituição aparecia com uma almofada financeira "significativa" e um balanço que "parecia rigoroso".

"Todos estes elementos, que foram descobertos numa fase já avançada do processo, foram uma surpresa muito grande até para os tais organismos de controlo dentro da instituição e a nível da supervisão", sublinha Faria de Oliveira, que não relaciona colapso do BES com a saída da "troika" de Portugal.

Conta do BES pode sobrar para clientes de toda a banca
O presidente da APB não garante que os clientes bancários não venham a pagar a conta no BES, caso a venda do Novo Banco se faça com prejuízo.

“Se as instituições bancárias tiverem de registar prejuízos por força desta operação, para melhoria da sua rentabilidade poderão ter que tomar algumas medidas de gestão que pudessem ter alguma repercussão nos clientes mas, neste momento, não é de prever que isso aconteça”, sublinha.

Sobre a comissão parlamentar inquérito ao caso BES, Faria de Oliveira espera um debate com grande elevação e questões pertinentes, que se apurem responsabilidades e retirem conclusões para o futuro, nomeadamente sobre relações de grupo. Em relação à proposta do presidente do BPI, Fernando Ulrich, para que o inquérito fosse conduzido pela APB, Faria de Oliveira explica que a associação não tem tempo nem meios para uma tarefa destas.

O presidente da APB é uma das pessoas que os deputados querem ouvir. Nesta entrevista à Renascença, conta que tomou conhecimento da solução para o BES um dia antes de ela ser tornada pública. Recebeu um telefonema, em que o avisaram que “estava muita gente no Banco de portugal, se isso queria dizer alguma coisa”.
 
Depois de saber que estes movimentos estavam ligados ao BES, Faria de Oliveira decidiu pedir uma reunião ao governador Carlos Costa, com mais três presidentes de bancos membros da direcção da APB. Foi então que tiveram “conhecimento do problema” e questionaram o governador porque não se optava por outra solução, como a recapitalização. Nesse mesmo sábado, perto das 22h00, foram ainda recebidos pela ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, de quem ouviram também “as explicações” da decisão. Na noite seguinte, a divisão do BES em dois seria anunciada ao país pelo governador do Banco de Portugal.

Banca queixa-se de "aumento brutal de todo o tipo de custos"
No programa “Terça à Noite” da Renascença, Faria de Oliveira admite que a banca "não esperava de todo" o agravamento da contribuição extraordinária cobrada ao sector, medida prevista no Orçamento do Estado para 2015.

Lamenta não só a subida como a permanência desta contribuição extraordinária, que "continua a existir ao fim de cinco anos", isto num cenário em que a banca enfrenta um "aumento brutal de todo o tipo de custos". Apesar destes encargos, o presidente da APB acredita que o sector da banca portuguesa vai conseguir regressar aos lucros já no próximo ano.

O ex-presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD) considera que o banco estatal está a cumprir o seu papel de financiar a economia. Acrescenta que a banca portuguesa já não tem problemas de liquidez, antes pelo contrário, está interessada em emprestar, é a forma mais rápida de obter lucros, no entanto, neste momento os reguladores estão mais exigentes com a avaliação de risco.

"Não" ao resgate da PT
O repto para que o resgate da Portugal Telecom (PT) foi lançado por um conjunto de personalidades da esquerda à direita, mas não convence Faria de Oliveira. Nesta entrevista à Renascença, Faria de Oliveira gostava que a PT continuasse a ser uma empresa de referência nacional, mas a palavra agora é dos accionistas.

Não subscreve que seja dada liberdade total aos mercados e até admite que, "em casos que se justifiquem, há que defender o interesse nacional". No entanto, "neste momento, ainda estamos numa fase em que não se justificará nenhum tipo de intervenção" estatal na PT, acrescenta Faria de Oliveira.

Taxas e taxinhas sem avaliação de impacto são má decisão
Em relação às polémicas taxas turísticas anunciadas pela Câmara de Lisboa, o antigo ministro do Comércio e Turismo defende que a equipa de António Costa "agiu mal" se não  avaliou previamente o impacto destas taxas sobre o turismo da capital.

"São matérias que devem ser profundamente ponderadas. Em todas as medidas que são tomadas devemos fazer uma análise muito rigorosa dos impactos que essas medidas têm. Essa medida é instrumental, é para aumentar as receitas da Câmara Municipal. Se fizeram uma avaliação do que isso pode representar em termos de diminuição das receitas de turismo que podem ser captadas em Lisboa e verificaram que o efeito é relativamente reduzido, talvez tenha justificação. Se não foi feita essa avaliação, acho que se agiu mal", argumenta Faria de Oliveira.