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"Apostei que PSD e CDS não ganham as eleições"

12 jan, 2014 • José Bastos

Daniel Bessa, Manuel Carvalho da Silva e Álvaro Santos Almeida debatem o pós-troika, a “saída à irlandesa” e as suas alternativas no “Conversas Cruzadas” deste domingo.

"Apostei que PSD e CDS não ganham as eleições"
O economista Álvaro Santos Almeida considera que um segundo resgate seria a melhor solução no final do programa de ajustamento, preferível até a um programa cautelar. Daniel Bessa, Manuel Carvalho da Silva e Álvaro Santos Almeida debatem a “saída à irlandesa” e as suas alternativas no “Conversas Cruzadas” deste domingo.

O PSD e o CDS não vão ganhar as próximas eleições legislativas, apesar de os indicadores económicos começarem a dar sinais de recuperação, afirma o antigo ministro Daniel Bessa, no programa “Conversas Cruzadas” da Renascença.

Os meses vão passando e surgem indicadores económicos positivos, mas as interpretações são contraditórias. Já se lê o que os números não dizem? Responde Daniel Bessa: “Para a vida concreta das pessoas – para quem o importante é basicamente ter ou não emprego, ter um salário maior ou menor e pagar mais ou menos impostos – é preciso que o processo esteja mais avançado”.

“Não posso estar mais de acordo em que as pessoas, nas ruas, nas suas casas, não estão ainda a sentir nada de especial. São bons indicadores, mas daí até chegar ao bolso das pessoas, ainda demora”.

O ex-ministro da Economia reconhece, ainda assim, boas novas nos números, mas que não produzirão resultados em tempo útil de reconduzir este Governo. “Acho que há realmente um conjunto de boas notícias. Contudo, há dias, fiz uma aposta no sentido de que não vai chegar para o PSD e CDS ganharem as eleições. Porque, na hora de votar as pessoas não vão sentir mudanças suficientes”, antecipa Daniel Bessa.

Na edição deste domingo do programa “Conversas Cruzadas”, Manuel Carvalho da Silva alude a uma “propaganda” do Governo que a realidade não sustenta. “O que está em andamento é uma operação de consolidação para a política de austeridade ficar por muito tempo. Uma política que não tem nada a ver com esta propaganda de êxitos. As pessoas estão em mais e maiores dificuldades."

"As pensões continuam a ser cortadas e depois assistimos a cenas como aquela do vice-primeiro ministro Paulo Portas a fazer declarações como esta ‘não esta medida não tem nada a ver com a TSU dos pensionistas do passado, nós estamos é a proteger os que têm pensões mais baixas’. Já vale dizer tudo,” diz o antigo líder da CGTP.

Economista Álvaro Santos Almeida defende segundo resgate
O economista Álvaro Santos Almeida considera que um segundo resgate seria a melhor solução no final do programa de ajustamento, preferível até a um programa cautelar.

“Sendo a diferença fundamental a condicionalidade estrutural – basicamente um conjunto de medidas que já deveriam ter sido adoptadas há 15 anos e muitas delas não o foram nem sequer durante o programa – a minha opinião é de que até preferia um segundo resgate em vez do programa cautelar”, defende o professor, no “Conversas Cruzadas” da Renascença, deste domingo.

Álvaro Santos Almeida quantifica a poupança gerada. “Pelo menos saía-nos mais barato. Um segundo resgate implicava um financiamento de cerca de 150 pontos base abaixo do que está neste momento. São 3.120 milhões de euros por ano. É muito o que está aqui em causa” defende.

Já o ex-ministro da Economia Daniel Bessa prefere, ao contrário, o programa cautelar, “embora ninguém saiba ainda muito bem o que é”. “É verdade que o segundo resgate fica mais barato, mas essa diferença só se aplica ao financiamento que está para vir. O ‘stock’ da dívida, muito dele com prazos já definidos, não vai mudar” sustenta o director geral da Cotec Portugal.

Álvaro Santos Almeida insiste nos custos acrescidos do programa cautelar por comparação com um segundo resgate. “Sair sozinho vale 3.120 milhões de euros que equivale a quase 2% do PIB e que dava para pagar muitas pensões, muita saúde, muita educação em vez de dar para pagar juros."

"Obviamente que isso implicaria um conjunto de restrições, mas, na minha opinião, até era preferível que essas restrições fossem impostas externamente, porque a nossa experiência dos últimos 40 anos demonstra que quando não há restrições externas há, geralmente, o descalabro, há o descontrolo das contas públicas”, aponta.

“Ter alguém externamente a impor rigor nas contas públicas e em contrapartida a financiar-nos mais barato do que conseguimos em mercado, não me parece que fosse um mau compromisso” sustenta.

Carvalho da Silva diz que “não há solução sem renegociação da dívida”
O regresso de Portugal aos mercados pode constituir um trunfo negocial para o “pós-troika” e, como tal, um elemento de esperança? “Mais que um trunfo negocial, é uma condição para que não se tenha de recorrer a um segundo resgate. Um programa cautelar ou uma saída limpa, qualquer uma destas hipóteses pressupõe que Portugal tenha capacidade de aceder aos mercados a taxas razoáveis. Esta emissão de dívida é um passo nesse sentido,” sustenta Álvaro Santos Almeida.

Já Manuel Carvalho da Silva volta a defender a renegociação da dívida. “Por mais voltas e voltinhas que se queira dar, enquanto não houver uma efectiva renegociação da dívida nós não temos solução no sentido de encontrar soluções base suficientemente estáveis, suficientemente estruturadas, para termos um tempo de progresso e de desenvolvimento do país”, considera o sociólogo.

“É preferível fazer reformas sem a ‘troika’ cá.” A afirmação de Paulo Portas à Renascença é feita num contexto de defesa da tese de melhorias e “recuperação de soberania” depois do fim do programa de ajustamento. Mas será assim tão diferente?

Daniel Bessa responde: “Eu não compartilho inteiramente essa visão. Estamos na aproximação do termo de um programa, de um conjunto de coisas que tinham de ser feitas num determinado período de tempo e esse período está a esgotar-se. Agora, no dia 18 de Maio não vai mudar tanto como às vezes se pensa,” indica o ex-ministro da Economia.

“Eu digo que não vai mudar nada. Porque nós temos um conjunto de compromissos, de restrições por pertencer à União Europeia e à zona euro e essas restrições não desaparecem. Vão continuar a condicionar a políticas económicas de qualquer Governo, seja deste ou de outro qualquer, porque não se esgotam em Maio de 2014 nem sequer no Verão de 2015."

"São restrições que continuarão enquanto Portugal pertencer à zona euro e que não serão muito diferentes quer num programa cautelar quer no segundo resgate. No essencial, as  condicionantes resumem-se ao país ter uma situação orçamental equilibrada, ou próxima do equilíbrio, e das medidas necessárias para o alcançar”, defende Álvaro Santos Almeida.

“Eusébio não está mal no Panteão”, diz Daniel Bessa
 
Faz sentido discutir Eusébio no Panteão ou a (quase) unanimidade deve ser celebrada? Daniel Bessa reflecte sobre um dos temas da actualidade.

“Vou fazer um mea-culpa: não sou um aristocrata de nascimento, mas tornei-me um aristocrata da valorização da ciência, da universidade, do conhecimento, de achar que esses são os vínculos fundamentais de promoção e valorização humana. Mas aqui está o meu ponto-fraco: quando olho para uma pessoa como o Eusébio – e é difícil ser mais humilde, manifestando essa humildade em múltiplos aspectos do seu comportamento – quando se vê o que essa pessoa atingiu e o que eu próprio me revi nele, acho que Eusébio não está mal no Panteão. Acho é que é tudo depressa demais”, opina o director-geral da Cotec Portugal.

“Acho que é depressa demais no sentido em que a transladação tem de ser algo pensado, mas daqui a cinco anos eu estaria seguramente a apoiar que o Eusébio estivesse no Panteão, porque o Panteão é para figuras símbolo-nacional e o Eusébio é um símbolo nacional”, analisa Álvaro Santos Almeida.

Manuel Carvalho da Silva soma argumentos à unanimidade na análise feita no “Conversas Cruzadas”.

“Estou de acordo com o que foi aqui dito, mas talvez esta situação nos deveria levar a reconsiderar alguns critérios quanto àquilo que deve ser o Panteão Nacional como espaço para portugueses. Era bom que essa questão fosse debatida. Quanto ao Eusébio, não me choca,” conclui o sociólogo.