Emissão Renascença | Ouvir Online

Gravidezes na pré-adolescência: “Um trauma não se resolve criando outro trauma”

09 mai, 2015 • Marina Pimentel

Os casos de gravidez na pré-adolescência, que têm vindo a público nas últimas semanas, servem de ponto de partida para o debate semanal “Em Nome da Lei”.  

Gravidezes na pré-adolescência: “Um trauma não se resolve criando outro trauma”
O pedo-psiquiatra Pedro Afonso lembra que todas as semanas há raparigas nas urgências por tentativa de suicídio, devido a traumas deixadas pelo aborto. "Não se resolve um trauma criando outro", insiste.
“Um trauma não se resolve criando outro trauma”, considera o pedopsiquiatra Pedro Afonso, referindo-se aos casos de jovens adolescentes ou pré-adolescentes que engravidam.

Durante o programa “Em Nome da Lei”, o psiquiatra compara o aborto como solução para estes casos à prática médica antiga de fazer sangrias aos doentes. “Pensavam que estavam a curar uma doença, mas estavam a criar outra, causavam anemia”.

“O maior trauma aconteceu com a violação, mas importa sublinhar que qualquer aborto, mesma numa criança, num adolescente, numa mulher, é sempre um trauma. Um trauma não se resolve criando outro trauma.”

O médico, que tem experiência em lidar com casos destes e colaborou alguns anos com instituições que se dedicam a ajudar mulheres e raparigas em situações de gravidez precária ou não-planeada, lamenta a “demagogia” que se tem criado à volta das situações recentemente vindas a público e recorda que “todas as semanas há raparigas nas urgências hospitalares que fizeram tentativas de suicídio”, por causa de abortos feitos anteriormente.

“Devidamente apoiadas, estas raparigas podem sair deste ciclo de miséria. Não é o aborto que vai fazer isso”, insiste.

Outra questão abordada no debate foi da capacidade, ou não, de uma rapariga de 11 ou 12 anos, por exemplo, tomar uma decisão deste tipo. A psiquiatra forense Rute Agulhas diz que isso depende das situações: “Um processo de tomada de decisão é um processo racional. Devíamos pensar qual é a influência dos factores emocionais para esta decisão. Uma menina de 12 anos tem capacidade e maturidade cognitiva e emocional para isso? Pode ter ou pode não ter. Isso exige uma avaliação e é isso que nos é pedido enquanto peritos forenses”, explica.

Maria Fernanda Palma, ex juíza do Tribunal Constitucional, actualmente presidente do Instituto de Direito Penal e Ciências Criminais, diz que no sistema português há um vazio legal. “Alguns países europeus têm mesmo uma previsão específica, uma indicação de aborto relativamente a menores de 14 anos, ou nalguns casos de 16 anos. Nós não temos e penso que devíamos ter”.

“A justificação por aborto terapêutico para uma gravidez de cinco meses só seria legal se não existisse alternativa alguma, nenhum outro meio, de remover o perigo para a saúde física ou psíquica da mulher. Admito que medicamente se possa dizer isso nalguns casos, ou em todos os casos, de menores de 14 anos. Mas não é claro, é uma área em que há controvérsia ética e provavelmente médica também”, acrescenta a especialista de direito.

Neste debate participaram ainda o procurador Rui do Carmo, membro do Observatório Permanente da Adopção da Faculdade de Direito de Coimbra; a juíza dos tribunais de família Maria Perquilhas, agora a exercer funções no CEJ, a escola dos magistrados e o juiz desembargador Eurico Reis, comentador habitual deste programa.

O Em Nome da Lei passa todos os sábados a seguir ao noticiário das 12h.