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Baixo investimento em ciência. "Um país que desperdiça os seus melhores está completamente perdido"

02 jun, 2015 • André Rodrigues

“Europa 2020” fixa meta nos 3% de investimento público para a área científica. Portugal só investe metade. Carlos Fiolhais lamenta “falta de vontade política” para inverter uma tendência que está a expulsar cérebros nacionais para o estrangeiro.

Baixo investimento em ciência. "Um país que desperdiça os seus melhores está completamente perdido"
A parcela de investimento público que Portugal destina à ciência e tecnologia é de 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB). Carlos Fiolhais,  investigador da Universidade de Coimbra, na área da Física, defende que a dotação pública para o sector “devia duplicar” para ir ao encontro dos objectivos fixados pela União Europeia.

Até 2020, Bruxelas quer atingir a média dos 3% de investimento público na área do conhecimento e da ciência, mas, do lado português, Carlos Fiolhais nota que há “falta de vontade política”, apesar de Portugal “ter assinado esses acordos europeus”. O professor diz que “assinar só não chega, é preciso planear uma estratégia para que assim seja”.

Caso contrário, alerta o investigador, “vamos continuar a ter uma descontinuidade entre o mundo da ciência e o mundo real, das empresas, da sociedade”. Tudo resumido numa ideia simples: falta cultura científica em Portugal. E isso “não se resolve apenas pedindo mais dinheiro”.

É preciso demonstrar que “aquilo que os cientistas fazem é útil para a sociedade e essa ligação entre ciência e sociedade tem de ser fortalecida”.

Os anos da crise ditaram “um recuo evidente” na política de consolidação da ciência e da investigação “que vinha a ser seguida nas duas últimas décadas”. Foi o tempo necessário para que os investigadores formados em Portugal perdessem a confiança no país, “sobretudo pela falta de perspectivas quanto a uma carreira estável e remunerada de acordo com a formação de excelência destes profissionais”.

“Esse é o drama maior”, afirma o investigador da Universidade de Coimbra. As estatísticas oficiais revelam que 100 mil portugueses emigram anualmente. Quantos desses são doutorados ou mestres? “Provavelmente, não serão a maior parte, mas são em número significativo. Isso deve preocupar-nos”.

Se o cenário não for invertido, dificilmente os cérebros em fuga regressam a Portugal. Perde-se capital humano, e o país perde qualquer hipótese de obter retorno do investimento na formação destes cientistas.

“E um país que desperdiça os seus melhores, está completamente perdido”, conclui Carlos Fiolhais.

Este é o assunto central do encontro nacional de cientistas que vai decorrer durante todo o dia no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. A iniciativa é da Associação Portuguesa de Sociologia à qual se juntaram outras associações dos ramos científico e das ciências sociais e humanas.