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Reportagem

Os mimos dos voluntários fazem a diferença na Casa de Saúde do Telhal

26 mar, 2015 • Ana Carrilho

A Casa de Saúde do Telhal acolhe cerca de 430 utentes na área de psiquiatria e saúde mental. Além dos profissionais de saúde, conta com 24 voluntários.

O dia começa cedo no Bazar da Casa de Saúde do Telhal, perto de Sintra. É o espaço do voluntariado neste centro da Ordem Hospitaleira de S. João de Deus, que dá apoio a doentes com perturbações mentais.

Maria Luísa Câmara Lemos é a voluntária mais presente – seis dias por semana, de manhã e à tarde. E é por ela que muitos dos utentes chamam. Vão ver televisão, fazer desenhos, cantar, ouvir música, conversar ou, simplesmente, falar da família.

"A família vem buscá-los ao fim-de-semana, nas épocas festivas ou quando pode", conta Maria Luísa. Isto com os "que ainda a têm porque em muitos casos, sobretudo os mais velhos, já perderam o grande apoio, que são os pais".

"A família lembra-se deles ou não. Mas eles lembram-se sempre! Perguntam pelo pai, pela mãe, pelos irmãos. E até há os que vêm aqui ao calendário ver quanto tempo é que falta para os virem buscar", revela esta voluntária, há três anos na Casa de Saúde do Telhal.

Há dias de maior tristeza e revolta, de maior ansiedade. E é nesses momentos que os voluntários podem ter um papel determinante para acalmar estes doentes que vivem todos os dias da sua vida no Telhal.

"Até se vê nos desenhos", diz Maria Luísa. "Quando estão satisfeitos e felizes, usam cores alegres. Mas quando estão tristes é só pretos, castanhos, borram tudo com cores carregadas. Temos que brincar com eles, arranjar outras conversas e depois eles esquecem e aquilo passa".

Os mimos dos voluntários…
A Casa de Saúde do Telhal acolhe cerca de 430 utentes na área de psiquiatria e saúde mental. Além dos profissionais de saúde, conta com 24 voluntários. Cada um deles apresenta o seu próprio projecto que, depois de aprovado, tem que cumprir.

Maria Teresa é um dos 24 voluntários. Vai ao Telhal duas vezes por semana, durante a manhã. Normalmente leva alguns doentes a passear pelos jardins ou ao bar.

Diz que gostam muito de ir beber um café e comer um bolo. Os que podem, aqueles a quem a família abre uma conta no bar. Só que os outros, que não têm dinheiro, também querem.

Nada que não tenha solução. "As voluntárias passaram a trazer um termo de café com leite, quentinho e assim, todos podem beber. É um miminho de que eles gostam muito", diz Maria Teresa. Luísa: "Mas aqui não lhes falta nada. Só que eles gostam de mimos, como toda a gente".

As datas festivas são sempre assinaladas, do Dia do Pai ao da Mãe. E "gostam muito que se lembre o Dia da Criança ou o dia de anos". "Normalmente trago-lhes sempre um bolinho e cantamos os parabéns, recebem um chocolate", diz Luísa, de sorriso aberto.

… e a terapia dos passarinhos
Ultimamente, as visitas ao Bazar tornaram-se mais assíduas. Um dos casais de pássaros teve seis passarinhos. " É uma loucura", confessa Luísa. "Vêm vê-los, querem dar-lhes comer, ajudam a limpar a gaiola, a mudar a água…".

Todos têm nome, excepto os pequenitos. "Mas já há aí um concurso para ver quais são os nomes que vão ser escolhidos".
Alguns são mais atrevidos. É o caso do Joãozinho, que muitas vezes voa fora da gaiola e pousa na mão ou no ombro de algum dos utentes. "O que é que uma coisinha tão pequenina te pode fazer?", perguntava Luísa aos mais receosos. Mas o medo já passou e agora impera a brincadeira. "Até ajudam na terapia".

"Está a ver como eles ficam contentes por nos ver?", pergunta Maria Teresa, depois de ser saudada efusivamente por alguns doentes que passam na rua. "Estão sempre a perguntar: ‘Quando é voltas? Vens amanhã?’"

Luísa admite que não consegue criar uma "couraça" para lidar com estes doentes que sofrem de perturbações mentais.

"São pessoas com uma grande sensibilidade. Vir trabalhar para o Telhal foi uma das melhores coisas que me aconteceu na vida."

Esta reportagem, emitida no último programa Princípio e Fim, faz parte de um ciclo de trabalhos da Renascença que partem do desafio do Papa Francisco na sua mensagem para esta Quaresma. A Renascença partiu à procura de cristãos que se dão aos outros em áreas habitualmente esquecidas ou periféricas, contrariando a "indiferença" denunciada por Francisco