Tempo
|

Entrevista

Sollari Allegro: "Prémio de presença no hospital reduziu absentismo para metade"

23 jan, 2015 • João Carlos Malta (texto) e Joana Bourgard (vídeo)

O problema do absentismo nos serviços de saúde é transversal, no Hospital de Santo António, no Porto, era de 8% a 9%. Sollari Allegro, em entrevista à Renascença, diz que conseguiu resolver o problema com a atribuição de prémios salariais.

Sollari Allegro: "Prémio de presença no hospital reduziu absentismo para metade"
Há casos nas mortes que ocorreram nas urgências dos hospitais nas últimas semanas que com uma nova retriagem podiam não ter acontecido. A convicção é do presidente do Hospital de Santo António, Sollari Allegro. Este médico fala ainda dos anos da troika e das suas consequências. Há quem não esteja a comprar medicamentos por falta de dinheiro.
Premiar quem vai trabalhar pode parecer um método pouco ortodoxo para combater o absentismo nos hospitais públicos. Pode parecer, mas funciona. É isso que diz em entrevista à Renascença, o presidente do Centro Hospital do Porto (junta o Hospital de Santo Antonio, Maternidade Júlio Dinis, Hospital Maria Pia), Sollari Allegro, que passou a dar um incentivo de 20% do salário a quem não falte ou tenha apenas uma falta por mês.

"Estabelecemos um prémio de presença de que os sindicatos não gostam nada. Quem não faltar ou apenas o dizer num dia por mês recebe um prémio de 20% do salário", explica Allegro.

Com esta medida conseguiu reduzir o absentismo em 50%. No entanto, apenas no conjunto de profissionais que não são funcionários públicos. Nesse grupo, em cada 100, são oito os que faltam todos os dias.

O director do hospital de S. João fala muitas vezes do alto absentismo dos profissionais de saúde....
Os profissionais de saúde têm um absentismo grande não por serem profissionais de saúde, mas por serem funcionários públicos. As regras da função pública não são as melhores para a reduzir.

É um problema no Santo António?
É um problema no Santo António, mas não tanto como no S. João. O número não é exactamente o que o doutor António Ferreira [presidente do Conselho de Administração do Hospital de São João] disse. É mais baixo, anda nos 8% ou 9%, não chega aos 11%. Todos os dias faltam 9% das pessoas pelas razões mais diversas, ou porque estão no período de parto, ou de férias, ou porque meteram atestado.

Como se poderia atacar esse problema?
Nós fizemos uma experiência que foi muito bem-sucedida, em que atingimos um absentismo equivalente à iniciativa privada. Estabelecemos um prémio de presença de que os sindicatos não gostam nada. Quem não faltar ou apenas o dizer num dia por mês recebe um prémio de 20% do salário.

Quais foram os resultados?
O absentismo desceu para metade, porque as pessoas deixaram de faltar. Nesse grupo temos 4 ou 5% de faltas. Não é generalizado porque não podemos aplicar aos funcionários públicos, que são a maioria. Gostávamos de poder alargar isso a toda a gente.

É estranho premiar as pessoas por irem trabalhar.
Pois é. Mas funciona.

O Apesar de ser uma pasta difícil, muitos observadores dizem que Paulo Macedo está a fazer um bom mandato. É essa a sua opinião também?
É um gestor experimentado e realmente o Ministério da Saúde precisava de gestão. E nisso ele é exímio. Do ponto de vista da gestão as coisas estão melhores. Agora, o ministério não é só o ministro. Tem muita gente lá a trabalhar sem qualidade e isso depois tem repercussões. É um ministério muito grande com gente eficiente e muita gente ineficiente.

Diria que é o melhor titular da pasta desde que está à frente do hospital Santo António?
Não. O que eu gostei mais foi o doutor Correia de Campos. Além de ser gestor, entendia de saúde e as decisões eram fundamentadas. Os outros ministros com quem lidei, este já é o sexto ou sétimo, funcionam muito pelo conselho. E isso tem ineficiências. Nem sempre o conselho é a melhor coisa a fazer. É preciso ter opiniões próprias sobre as coisas.

O professor prevê uma subida imparável dos custos este ano com fármacos. Porquê?
Vai haver, porque há novos fármacos inovadores, como no caso da hepatite C, que cura 90% das pessoas, e não podemos deixar de os usar. Isso trará um acréscimo de custos. Há também o envelhecimento da população de que já falámos o que também aumenta os custos da saúde.

Mas qual é a situação com os medicamentos da hepatite C?
Até agora tem-se conseguido, porque o Infarmed e o ministério têm decidido tratar apenas os doentes em risco. Conseguiram um acordo com a empresa, mas os preços vão subir e se não for este ano é para o ano. Estimamos que o número de doentes de hepatite C chegue aos 100 mil. Se os for tratar a todos são 48 mil euros por pessoa, ou seja, 4.800 milhões de euros.

É um número astronómico. É possível de acomodar no Orçamento do Estado?
Não se consegue acomodar. Isso era mais de 50% do orçamento total da Saúde. A única solução é conseguir que a empresa pratique preços iguais aos que pratica na África do Sul, em que custa 2.000 dólares (1.700 euros), ou no Egipto que é 700 dólares (600 euros). Em Portugal é mais de 50 mil dólares (43 mil euros).