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Opinião

Carlos Fiolhais sobre o OE 2015. Para a ciência não houve uma saída limpa

17 out, 2014 • Carlos Fiolhais

A Renascença convidou 12 personalidades a escreverem sobre o Orçamento do Estado. Palavra ao físico Carlos Fiolhais.

Carlos Fiolhais sobre o OE 2015. Para a ciência não houve uma saída limpa
As notícias trazidas pelo Orçamento do Ministério da Educação e Ciência não são nada boas.

Os cortes vão continuar, mutilando um tecido que já está muito ferido.

No ensino superior ligado de muito perto à ciência (apesar das duas secretarias de Estado estarem separadas, parecendo de costas uma para a outra), os cortes, embora menores que nos outros graus de ensino, vão prosseguir.

Os reitores têm-se queixado com muita razão e vamos ver se o novo presidente do Conselho de Reitores faz ouvir a sua voz contra as malfeitorias às universidades. Os politécnicos não estão melhores, agravada que está a situação pelas muitas vagas deixadas em aberto no recente concurso de acesso.

Os novos cursos curtos e as bolsas para o Interior vieram tarde e sabem a pouco.

Na ciência, apesar de estar indicado um pequeno aumento, de modo que a ciência e o ensino superior subam de 0,1% (um décima de ponto percentual!) relativamente ao magro orçamento do ano passado, os actuais tempos de penúria não vão ser ultrapassados mas sim prosseguir. Para a ciência não houve uma saída limpa.

A FCT resolveu cortar arbitrariamente 50% das unidades de investigação, em todas as áreas científicas, e este orçamento enquadra-se nessa estranha ideia de destruição de uma parte da ciência nacional.

A avaliação feita pela European Science Foundation, seguindo as ordens da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), está cheia de erros. É certo que a FCT quer distribuir seis milhões como uma esmola a alguns centros chumbados, mas isso é ridículo se pensarmos que o Estado quer meter mais 28,5 milhões no buraco do BPN em 2015, para não falar já no gigantesco buraco do BES, que, conforme a ministra das Finanças e o primeiro-ministro admitiram, poderá trazer prejuízos para os contribuintes portugueses.

A ciência, ao contrário dos bancos mal geridos, é uma fonte de riqueza e mal vai o país que não sabe plantar a semente da ciência para recolher e saborear depois os frutos. A Assembleia da República ainda vai a tempo de emendar o orçamento da ciência.

Se estivesse à frente do sector, suspenderia a avaliação defeituosa em curso, mantendo a anterior vigente até se poder fazer uma outra justa e transparente.

Isso exige a manutenção dos recursos para as unidades científicas de méritos reconhecidos nas avaliações internacionais anteriores.

Procuraria meter a investigação mais nas universidades e politécnicos, promovendo a salutar competição entre elas. Não prejudicaria as universidades, retirando-lhes fundos para dar a fundações privadas. Procuraria dar contratos nas instituições de ensino e investigação aos jovens talentos que estão a fugir do país.

Por fim, alimentaria a interacção de universidades e politécnicos com empresas, fomentando a inovação. Para isso, impõem-se medidas imediatas de promoção do emprego de jovens cientistas nas empresas.

Para o próximo ano, com este Governo, não espero nenhuma alteração na política para o sector. Espero que o Governo seja alterado, para benefício de Portugal e dos portugueses. Este Governo julga que são duas coisas separadas mas não são: Portugal são os portugueses. Quando ouço dizer que os portugueses estão mal e Portugal está bem, eu protesto. Portugal existe por causa dos portugueses e deve existir para os portugueses.

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