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Porque estão cansados os nossos enfermeiros?

19 ago, 2014 • Ricardo Vieira

Sindicato diz que faltam 25 mil enfermeiros nos hospitais e centros de saúde de Portugal. Os próximos dias vão ser marcados por uma onda de greves.

Porque estão cansados os nossos enfermeiros?
Os enfermeiros estão em luta. Cerca de 15 mil profissionais de saúde protestaram em Lisboa por melhores condições na carreira. MÁRIO CRUZ/LUSA.

Os enfermeiros iniciam, esta terça-feira, uma série de greves em protesto contra a escassez de profissionais e o incumprimento de horários de trabalho.

Os profissionais da saúde manifestam sintomas agudos de um descontentamento e cansaço que aumentam ao ritmo dos cortes no sector. Os médicos já fizeram greve e os enfermeiros avançam, agora, com o protesto que vai prolongar-se pelos próximos dias.

Guadalupe Simões, dirigente do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP), considera que é preciso quase dobrar o número de profissionais de enfermagem que existem actualmente. Faltam 25 mil, pelas contas do sindicato, uma carência que se reflecte na deterioração das condições de trabalho e dos cuidados prestados aos doentes.

Onda de greves
Os enfermeiros do Hospital de Santarém são os primeiros a parar. A greve começa às 8h00 desta terça-feira e só termina sexta-feira ao final da noite.

A razão? A falta de enfermeiros e a sobrecarga dos que trabalham naquela unidade de cuidados de saúde que serve uma população de aproximadamente 192 mil habitantes. O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP) considera que faltam 170 enfermeiros naquele hospital e fala num cenário de "caos" e "ruptura iminente" nos serviços.

Segue-se o Algarve. Todos os profissionais de saúde da função pública da região vão paralisar na sexta-feira, dia 22. Os motivos são idênticos: falta de condições e de pessoal.

O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses também convocou uma greve no Centro Hospitalar Barreiro Montijo, a 25 de Agosto.

No dia seguinte, o protesto chega a seis hospitais de Lisboa. A greve dos enfermeiros no dia 26 vai fazer-se sentir nos Hospitais de S. José, Capuchos, Santa Marta, de D. Estefânia, Curry Cabral e na Maternidade Alfredo da Costa.

A Norte, os enfermeiros da Unidade de Saúde Local do Alto Minho, composta pelos hospitais de Santa Luzia e Conde de Bertiandos e pelos centros de saúde do distrito de Viana do Castelo, também vão parar a 28 e 29 de Agosto.

Ministro explica exaustão dos enfermeiros com acumulação de funções
Confrontado com o descontentamento dos profissionais de saúde, o ministro Paulo Macedo considera que a exaustão de que muitos enfermeiros se queixam deve-se à acumulação de funções nos sectores privado e social.

"Não podemos esquecer que, tipicamente, um enfermeiro desempenha, muitas das vezes, o seu horário num hospital público e depois tem uma outra função, ou às vezes mais duas, com que acumulam", referiu à margem de uma visita ao Hospital de Braga.

Para Paulo Macedo, a exaustão física e psicológica não  é uma questão "que deva levar à greve".

Ainda assim, o ministro da Saúde reconheceu que há “falta de enfermeiros”. Garantiu que o Governo está a fazer, ao longo deste ano, um recrutamento "significativo" daqueles profissionais.

Ordem responsabiliza decisores políticos
Na sequência destas declarações de Paulo Macedo, a Ordem dos Enfermeiros (OE) alertou para o estado de exaustão em que se encontram estes profissionais. Apelou ao ministro da Saúde que reconheça a importância deste cansaço na segurança e qualidade dos cuidados prestados.

A Ordem responsabiliza, em comunicado, “os decisores políticos pelas consequências que podem advir para a qualidade e segurança dos cuidados de enfermagem se continuarem a ser ignorados os sinais de exaustão dos profissionais". 
 
Os serviços de saúde portugueses "estão em clara ruptura" pela falta de preocupação dos decisores políticos, acusa a Ordem, que apela ao ministro da Saúde "para que reconheça a influência destes factores na segurança e qualidade dos cuidados a que os cidadãos têm constitucionalmente direito, não os banalizando e confundindo com factores económicos".

A Ordem dos Enfermeiros lembra um estudo publicado recentemente pela Universidade Católica, que identificou um nível de exaustão significativo nos enfermeiros portugueses, bem como uma enorme insatisfação com a progressão na carreira e com o seu nível salarial.
 
Existem, para além disso, estudos que relacionam os níveis de exaustão dos enfermeiros com resultados adversos para os doentes, identificando maiores riscos de erro, quase-erro ou resultados aquém do esperado. Os turnos longos (por falta de enfermeiros nas instituições), o elevado número de doentes por enfermeiro, e o trabalho nocturno e por turnos estão entre as principais razões apontadas para este estado de exaustão dos enfermeiros.