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“As fronteiras hoje são porosas”

11 abr, 2015

Os escritores João Tordo e Bruno Vieira do Amaral foram desafiados a falar sobre as “Fronteiras para o seculo XXI”, no festival Fronteira de Castelo Branco.

“As fronteiras hoje são porosas”

É de fronteiras que se fala no Festival Fronteira em Castelo Branco. A Biblioteca Municipal encheu-se numa tarde de sábado para escutar dois escritores premiados. João Tordo, Prémio Saramago 2009, autor de “O Bom inverno” e Bruno Vieira do Amaral, Prémio Fernando Namora 2013 e autor de “As primeiras coisas”, conversaram levados pelas perguntas do moderador Pedro Vieira, também escritor premiado com o Prémio PEN Clube com a obra “Última paragem Massamá”.

Desafiado a falar das fronteiras do século XXI, João Tordo começou por explicar a fronteira entre o Homem e a tecnologia e referiu a forma como hoje as “pessoas estão voltadas pra dentro e vivem agarradas a máquinas”. Esta marca que para o escritor que prepara para breve novo livro, define o nosso século “inibe-nos do contacto”. Tordo afirmou que a “tecnologia passou a ser o primeiro palco de acesso ao mundo, mas com isso fomos perdendo mundo”.

Bruno Vieira do Amaral começou por considerar um privilégio viver o momento presente, “o único da História da Europa de paz prolongada e de diluição das fronteiras”. Ao falar da livre circulação “que também deveria ser de bens e de ideias”, Amaral sublinhou contudo as ameaças que isso desencadeia. Para o autor que acaba de publicar “Aleluia!” na colecção Retratos da Fundação Francisco Manuel dos Santos, esse clima de ameaça “faz com que haja um reforço das micro-identidades.”

“Por um lado os países abdicaram de factores de independência e soberania, mas ao mesmo tempo percebe-se que a perda dessa soberania veio afectar a questão da identidade. Os grupos ficam cada vez mais pequenos, porque as pessoas querem pertencer a algum lado”, explicou Bruno Vieira do Amaral. O autor concluiu que não acredita “no fim das fronteiras” porque “temos uma necessidade permanente de estabelecer fronteiras. A fronteira exclui, mas também define.

Já João Tordo considera que “as fronteiras hoje são porosas”. A imagem serve-lhe para afirmar que “vamos encontrando diferenças e semelhanças quando atravessamos fronteiras”. O autor de “As três vidas” dá o exemplo dos “irmãos mais novos de 25 anos que já percorreram a Europa” e confessa que “se eu tivesse tido essa oportunidade, se calhar a minha integração no mundo seria mais fácil”. Num olhar critico, Tordo fala da cidade de Lisboa hoje em dia e da sua “transformação” e diz que “hoje é difícil encontrar um português na rua”.

Tanto Bruno Vieira do Amaral como João Tordo se afirmam como “escritores portugueses”. Para ambos a questão dessa pertença é fulcral. Contudo, João Tordo acrescenta à conversa o ingrediente da internacionalização da literatura portuguesa. “Talvez Saramago tenha aberto as portas, com esse rebentamento das fronteiras”. Ao lembrar que muitos dos últimos livros do Nobel não têm como cenário Portugal, mas sim o “espaço literário” de Saramago, João Tordo abordou a importância da “ressonância da língua portuguesa lá fora”.

Considerando positivo o à vontade com que os escritores vão tendo para falar do mundo, Tordo concluiu quer “a literatura portuguesa renovou-se completamente. Faltava falar sobre Portugal pós-revolucionario, o que aconteceu antes e depois” e isso está na nova literatura nacional.