Tempo
|

1930-2015

Morreu o poeta Herberto Helder

24 mar, 2015 • Eunice Lourenço

É um dos maiores poetas portugueses de todos os tempos. Nasceu na Madeira, há 84 anos, e faleceu segunda-feira em Cascais.

Morreu o poeta Herberto Helder

Herberto Helder, um dos maiores poetas portugueses de sempre, morreu segunda-feira, em Cascais, com 84 anos, confirmou a Renascença junto da editora do autor.

"A Morte sem Mestre" é o título do seu último livro, lançado no ano passado pela Porto Editora, numa edição que incluiu um CD com cinco poemas ditos pelo próprio poeta que recusava prémios e entrevistas e, ao longo da sua vida foi também operário, meteorologista ou bancário.

Nascido em Novembro de 1930, no Funchal, Herberto Helder foi para Lisboa com 16 anos para estudar.

Estudou Direito, em Coimbra, e Filologia Românica, em Lisboa. Foi nessa altura que trabalhou na Caixa Geral de Depósitos e depois como angariador de publicidade.

Publicou o seu primeiro poema em 1954, data em que regressou à Madeira, onde trabalhou como meteorologista.

Mas rapidamente regressou a Lisboa, onde frequentou o mesmo círculo de Mário Cesariny e Luiz Pacheco. Publicou o primeiro livro – "O Amor em Visita" - em 1958, mas nos anos seguintes viveu em França, na Bélgica e na Holanda, exercendo trabalhos sem qualquer relação com a literatura. Chegou a viver na clandestinidade e a ser guia de marinheiros nos circuitos de prostituição.

Repatriado em 1960, foi encarregado das bibliotecas itinerantes da Gulbenkian, redactor de noticiário internacional na Emissora Nacional e tradutor. Volta a publicar: "A Colher na Boca", "Poemacto", "Lugar" e "Os Passos em Volta" são os seus livros da primeira metade da década de 1960.

Em 1968, foi condenado num processo judicial pela sua participação na publicação de um livro sobre o Marques de Sade. Fica com pena suspensa, mas é despedido da rádio e da televisão públicas. Vira-se de novo para a publicidade e trabalha numa editora. Nesse mesmo ano, publicou "Apresentação do Rosto" que foi suspenso pela censura. Seguem-se "O Bebedor Nocturno", "Kodak" e "Cinco Canções Lancinantes".

Em 1971 viajou para Angola onde foi repórter de guerra ao serviço da revista "Notícias", acabando por ser vítima de um acidente e estar três meses hospitalizado. Publica "Vocação Animal", começa a produzir "Antropofagias" e, dois anos depois lança "Poesia Toda". De regresso a Lisboa, após uma passagem nos Estados Unidos, volta a trabalhar na rádio e na imprensa e participa na organização da revista "Nova". Nos anos seguintes ao 25 de Abril publica "Cobra", "O Corpo", "O Luxo", "A Obra", "Photomaton" e "Vox".

Nos anos 80, sucedem-se "A Cabeça entre as Mãos" (1982), "As Magias" (1987), "Última Ciência" (1988), "A Última Ciência"(1988). Na década seguinte publica "Do Mundo" (1994), "Oulof" (1997), "Doze Nós numa Corda e Poemas Ameríndios", ambos em 1997. Ao longo dos anos 90, vai-se tornando uma figura cada vez mais misteriosa e isolada, recusando entrevistas e prémios, incluindo o Prémio Pessoa, em 1994. Já neste século, publicou "A Faca Não Corta" (2008), "Ofício Cantante" (2009), "Servidões" (2013) e "A Morte Sem Mestre" (2014), o último livro com edição limitada, mas a que também deu voz.

A Porto Editora, editora de "A Morte Sem Mestre", anuncia que o funeral, "reservado à família", se realiza na quarta-feira.

A editora dedica à família, aos amigos e aos leitores um trecho de um poema publicado em "A Morte Sem Mestre", que rotula de "premonitório".

"queria fechar-se inteiro num poema
lavrado em língua ao mesmo tempo plana e plena
poema enfim onde coubessem os dez dedos
desde a roca ao fuso
para lá dentro ficar escrito direito e esquerdo
quero eu dizer: todo
vivo moribundo morto
a sombra dos elementos por cima"