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Novo livro de Michael Cunningham tem título igual a Hans Christian Andersen

27 nov, 2014 • Maria João Costa

"A Rainha da Neve" é o novo livro do escritor de "As horas". Michael Cunningham está de regresso com nova obra em português.  

Esteve em Lisboa numa tarde de muita chuva, numa maratona de entrevistas que tiveram de ser reagendadas porque um voo lhe trocou as voltas. Michael Cunningham, Prémio Pulitzer, autor do aclamado “As Horas” tem novo livro. “A Rainha da Neve” é o seu mais recente título. Em entrevista à Renascença explica que uma obra é um “presente” para o leitor. Enquanto já sonha com o seu novo romance do qual já tem 100 páginas escritas, o autor norte-americano explica que roubou o título de “A Rainha da Neve” a Hans Christian Andersen.

“A Rainha da Neve” é um título de um conto de Hans Christian Andersen?
Pode dizer-se que eu pedi emprestado, ou mesmo “roubei”, o título do conto de Hans Christian Andersen, mas não voltei a reescrevê-lo. É um conto sobre o desespero, sobre um rapaz que tem de ser resgatado da “Rainha da Neve”, não só fisicamente mas também espiritual e emocionalmente.

Como é que surgiu a ideia para o título?
Tive o título logo no início. O que não é muito comum em mim. Mas sabia que era esse o título. Raramente entro em desacordo com o meu editor, ele está comigo desde o início da minha carreira. Ele não gostava da ideia do romance ter este título emprestado a um conto de Hans Christian Andersen, mas eu disse-lhe: "Sabes, se alguém devolver o livro e disser que este não é o conto de Hans Christian Andersen", eu pessoalmente devolvo o dinheiro a essa pessoa".

Já o fez?
Ainda não. Mas estou preparado para isso. Todos os que nos estão a ouvir - se comprarem o livro e ficarem desapontados, digam-me, eu mesmo envio-vos um cheque.

Este “Rainha da Neve” fala de amor, solidão, doença. Sobre o que quis escrever?
Com qualquer romance pretendo criar um mundo. Não acho que tenha uma lição para dar aos leitores. Sinto que o principal objectivo de um romance é ajudar quem lê a sentir-se menos só neste mundo. Quem lê cria uma certa intimidade com as personagens. Não quero tornar o leitor uma melhor pessoa, porque provavelmente já o é, só quero contar-lhe sobre estas personagens, o que lhes acontece e porquê.

E quem são estas personagens, os irmãos Meeks, sobre quem nos escreve?
Este livro é um pouco fora do normal para mim. A maior parte das minhas personagens nos meus romances são inventadas, apenas uso partes de gente que conheço, mas aqui duas das personagens - o músico Tyler que usa drogas e a sua namorada Beth que está muito doente, são baseados em pessoas que conheço. Perguntei-lhes antes de começar a escrever se não se importavam. Depois mostrei-lhes o livro acabado e perguntei se estava tudo bem? Disseram que sim.

Escrever é só inspiração, ou tem também muito trabalho?
Não se pode escrever romances se não nos sentimos inspirados, e se não temos vontade de trabalhar muito. Eu preciso de um certo equilíbrio na minha vida. Preciso de uma certa solidão enquanto escrevo, mas depois preciso desesperadamente de estar entre uma grande multidão de pessoas. Aquela história da pequena casa de campo... não dava para mim, matava-me em três semanas. Não ando nas ruas de Nova Iorque a tomar notas, mas os romances são sobre pessoas. Como é que os vais escrever senão te manténs em contacto com pessoas. As pessoas são o nosso material.

Quando acaba um livro ele deixa de ser seu?
Qualquer romance é uma espécie de presente para o leitor. Pode não ser o presente que o leitor quer, pode não ser do seu tamanho ou cor. Pode não servir, mas sim, é uma espécie de presente. Quando acabo um romance, acabo! Sigo para o próximo. Já escrevi 100 páginas do meu novo livro. Não é que não me preocupe com “A Rainha da Neve”, mas está por sua conta. Já estou a escrever o novo livro, e é muito melhor.