25 set, 2014 • Raul Santos
“Os Maus da História de Portugal” é o título do livro, mas o autor, Ricardo Raimundo, não deixa de reconhecer que ele traduz uma visão “redutora e maniqueísta”, porque “não há bons nem maus”.
Ricardo Raimundo, 33 anos, mestre e doutorando em História Moderna, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, explica que “a História é feita de pessoas, com os seus lados bons e os seus lados maus”.
No seu mais recente livro procura dar a conhecer “o lado mais obscuro de algumas figuras que se destacaram por factos bastante notáveis”.
Notando que, “com as lentes de hoje, vemos muitos actos que consideramos brutais e que, na época em que se verificaram, eram aceites”, Raimundo sublinha que na obra elenca actos que “na sua própria época eram já vistos como condenáveis”.
Surpresas da História
O novo livro de Ricardo Raimundo, editado pela Esfera dos Livros e que é lançado no Porto esta quinta-feira, poderá surpreender, uma vez que alguns factos apanharam o próprio autor se surpresa. Um exemplo: Vasco da Gama, figura de quem Raimundo tinha “a imagem de um herói sem mácula”.
“Vasco da Gama mandou afundar uma embarcação, na qual seguiam homens, mulheres e crianças, quando as normas internacionais desse tempo admitiam o afundamento de embarcações onde estivessem apenas homens”. O acontecimento, sublinha ao autor, “foi considerado, à época, um acto bárbaro”.
Ricardo Raimundo aponta também o caso dos irmãos Pedro e Miguel de Bragança, os reis D. Pedro IV e D. Miguel, que “tinham bastante desregramento, comportamentos que eram reputados por maus e que, na sua época, chocaram a sociedade”.
Essas atitudes dos irmãos-inimigos não deixavam de traduzir as clivagens da época - entre liberalismo e absolutismo -, as tensões decorrentes das Invasões Francesas e até o clima de desavença conjugal dos pais de Pedro e Miguel, o rei D. João VI e Carlota Joaquina.
Cronologicamente, o último “mau” do livro é José Júlio da Costa, o homicida de Sidónio Pais, em 1917.
Os "maus" de hoje
Olhando para o presente, Ricardo Raimundo recusa o repto da Renascença: apontar nomes de hoje que possam constar de um livro similar ao seu, a publicar dentro de um ou dois séculos.
“Não me quero comprometer”, argumenta, rindo-se. Diz só que os tempos que se vivem, em Portugal e na Europa, têm “matéria-prima” e poderão vir a fazer com que alguns actores sejam, no futuro, duramente julgados.
“Esta tendência de julgar o ser humano como mais um número, como mais uma despesa, poderá ter graves consequências e a História poderá julgá-la de forma negativa”, sublinha Ricardo Raimundo.
A História "vende" livros
Antes de “Os Maus da História de Portugal”, Ricardo Raimundo editou “Os Escândalos da Monarquia Portuguesa” e “Vidas Surpreendentes, Mortes Insólitas da História de Portugal”, lançamentos que se enquadram no “boom” editorial de temáticas históricas que se verifica em Portugal.
Raimundo reconhece a existência de um fenómeno que se traduz “no desejo de conhecer alguns factos mais ‘suculentos’ da História, que se assemelham a histórias das revistas cor-de-rosa da actualidade” e também em "algum desinteresse pela História do ponto de vista académico”.
O clima de descrença e desânimo face às dificuldades em que o país vive também ajuda. “Impele alguns a procurar no passado uma espécie de explicação para aquilo que se passa hoje”.