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Livro revela história da biblioteca de Auschwitz

24 jan, 2014 • Maria João Costa

Existiu no meio do horror do campo de concentração e tinha apenas oito livros, que serviram de janela para o mundo a um grupo de crianças que ali estava.

"A Bibliotecária de Auschwitz" é o nome do livro do espanhol António Iturbe, que conheceu pessoalmente Dita Dorachova, a guardião da pequena biblioteca.

Escondida no Bloco 31, a biblioteca tinha apenas oito livros. No barracão no meio do horror de Auschwitz, um professor ensinava um grupo de crianças a ver o mundo lá fora. Era talvez a biblioteca mais pequena do mundo.

A curiosidade de António Iturbe foi despertada pela história contada num livro do escritor argentino Alberto Manguel.

“É um dos especialistas mundiais na história da leitura e eu gosto muito de ler os seus livros. Eu não sou nenhum especialista em Holocausto ou Segunda Guerra Mundial. Chego ao tema de Auschwitz não pelo lado do holocausto ou do nazismo, mas sim pelos livros”, explica à Renascença.

“ ‘A biblioteca à noite’ de Alberto Manguel fala de grandes bibliotecas da história. Foi por aí que comecei. Fiquei com a curiosidade de saber como é que isso tinha sido possível. Que livros tinham, como lá chegaram e o que faz uma biblioteca no local mais horrendo da história”, acrescenta.

Jornalista de cultura há duas décadas, António Iturbe investigou, juntou os dados e meteu mãos à obra. A história está num livro agora publicado em Portugal e intitulado "A bibliotecária de Auschwitz".

“No princípio, realmente tinha muito pudor em misturar o que são os acontecimentos com a ficção. A minha primeira ideia foi fazer um livro de ensaio. Mas a verdade é que estava a sair uma coisa muito fria, muito distante com alguns factos, números, com dados da documentação. No final, apercebi-me de que o jornalista precisa também de certas ferramentas para contar a verdade. Eu acredito que uma notícia bem contada não é apenas uma soma de acontecimentos. Uma notícia bem contada são os acontecimentos, mais o olhar do jornalista que os conta, contextualiza, explica a sua importância e te diz qual o porquê das coisas. Isso não vem nos dados! Só o olhar te pode dar”, sustenta.

Os livros foram uma espécie de passaporte de saída do campo de concentração: “Nesse lugar horrível, onde quando olhas para fora apenas vês chaminés que deitam as cinzas das pessoas queimadas, vês lama, gente armada, cães a ladrarem, de repente entras num barracão, abres um livro e esse livro leva-te para as pirâmides do Egipto ou para a revolução francesa ou para a conquista da América”, afirma ainda.

Antonio Iturbe conheceu pessoalmente Dita Dorachova, a guardião da pequena biblioteca. “Não quis perguntar-lhe por certas coisas, porque acho que há coisas nas quais uma pessoa não se deve meter. Não deve entrar em certos recantos de dor. Dei-me conta que por vezes estava com um olhar perdido, que ficava calada com os pensamentos às voltas. Percebi que essas memórias estavam lá; 40 anos depois continuam presentes. E quando falamos de temas como a vingança disse-me que não a sente, mas não esquece o que aconteceu. Não pode esquecer. Tinha 70 anos, mas essa opressão e a perda dos seus pais são coisas que lhe ficaram gravadas para sempre”, recorda.

"A bibliotecária de Auschwitz" chega às livrarias portuguesas pela mão da editora Planeta. Pode ouvir mais sobre o livro no programa “Ensaio Geral”, da Renascença, que vai para o ar pouco depois das 23h00, na Edição da Noite.