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Escritora israelita fala do seu livro, do Médio Oriente e da Síria

11 out, 2013 • Maria João Costa

"O povo da eternidade não tem medo" foi agora lançado em Portugal.

A poucas horas do Portugal-Israel, a Renascença entrevistou uma jovem escritora israelita que acaba de lançar em Portugal o seu novo livro. "O povo da eternidade não tem medo" é uma obra que retracta a vida das jovens israelitas que têm treino militar.

Shani Boianjiu tem 26 anos, nasceu em Jerusalém, é filha de uma iraquiana e de um romeno. Cresceu a pouco quilómetros do Líbano e da Síria. “O meu livro tem três personagens principais. São novas, são mulheres e são israelitas”, disse.

O livro já foi traduzido em mais de 20 línguas. “Eu escrevi-o entre os 20 e os 23 anos e depois publiquei quanto tinha 24, quase 25 anos. Agora acabei de fazer este Verão 26 anos”.

E, apesar da sua idade, Shani Boianjiu já serviu no exército israelita, tal como as personagens do seu livro. “Em muitas partes do livro estas mulheres estão no liceu, noutras estão fora do exército. Em grande parte do livro, eu diria em cerca de um terço, quase dois terços, elas estão no exército porque isso é algo que acontece tal como aconteceria aqui em Portugal se alguém fosse escrever um livro que reflectisse a situação socioeconómica falaria de uma jovem na escola ou que fosse empregada”.

Mas, tal como a escritora que diz que escreve livros para ganhar amigos nos explica, "O povo da eternidade não tem medo" é também um livro sobre outras personagens que habitam o Médio Oriente.

“Há muitas personagens no livro e muitas não são jovens, nem mulheres, nem israelitas. Há crianças soldado libanesas, há um refugiado sudanês, há um ucraniano vítima de tráfico humano, há soldados egípcios, há soldados israelitas, há um pai líbio que é empreiteiro, há uma mãe iraquiana que é professora. Há gente de Jerusalém e de Telavive. Há pessoas de aldeias, árabes israelitas, palestinianos alguns em posto de controlo próximos de Hebron que vêm das grandes cidades para trabalhar em Israel. Portanto há muitas personagens que não são jovens, mulheres ou israelitas”, acrescentou.

Apesar de coser a história de todas estas personagens, Shani Boianjiu não se considera uma escritora. “Eu sempre escrevi, mas por causa da forma como hoje é definido um escritor, nunca me apercebi que era isso que estava a fazer. Não me considero uma escritora, porque não era isso que eu queria. Eu estou a meio do meu segundo livro, mas não é o que eu quero ser e não é como me vejo. Sou boa em matemática, e sou tradutora. Também escrevo livros, é algo que faço. Mas sou tradutora, faço matemática e escrevo sobre realidades paralelas que é outra forma de escrita.”

Diz que escreve em inglês, mas com o inglês usado na internet e nas redes sociais. Shani Boianjiu começou a escrever cedo e quando esteve no exército israelita tinha mais tempo para por as ideias no computador.

“No exército esperamos muito. Estás de guarda três horas por dia, mas não é só aí. Podes todos os dias estar de guarda três horas por dia, mas esperas muito. Eu tinha de ir à boleia para uma estação de comboios no norte. Depois daí tinha de esperar por um autocarro e depois por outro para chegar a uma espécie de base. Ou esperamos por 48 horas para fazer uma tarefa que leva cinco minutos. Nesses momentos tinha algumas ideias, fragmentos...às vezes era apenas uma frase vinda de qualquer lado. Com isso começava uma história que contava a mim própria vezes sem conta durante 5,6 semanas até chegar a um computador - porque não sou capaz de escrever com caneta e papel - e transformar essa informação em texto e salvá-la”.

Shani Boianjiu estudou em Harvard, mas não esquece onde é a sua casa. Fica mesmo na fronteira com a Síria. Quando a Renascença lhe perguntou sobre a actual situação no país liderado por Bashar Al-Assad, o tom de voz da autora israelita sobe e exalta-se quando fala dos ataques químicos.

“Toda a questão das armas químicas é ridícula! Como se os judeus não tivessem sido assassinados nos campos de concentração em 1941. Era usado um comboio estupido que andava para trás e para a frente. E agora, vamos esperar por 2014 e se não houver armas químicas tudo estará bem?! Isto é ridículo!! Precisamos de um milhão, dois milhões de sírios mortos para dizer ‘Oh, se calhar devemos fazer alguma coisa"?!?! O que é que se passa? Estou confusa! Estes são seres humanos! Falo dos judeus porque é o que aconteceu antes. Agora são os sírios!”

No mesmo tom revoltado, a escritora diz estar disponível para usar o seu treino militar na Síria para ensinar aos outros a protegerem as crianças sírias. Shani Boianjiu fica incrédula com as histórias que vê acontecerem ao seu lado.

“Algumas pessoas da Galileia que são meus vizinhos, eu percebo a sua revolta. Uma família que vive a meia hora de carro de mim perdeu 18 membros da família num único ataque químico na síria! Portanto, alguns deles entraram na Síria e juntaram-se aos rebeldes. Agora, eu posso não ser autorizada a ir para a Síria, mas se quiserem eu vou! Com o treino que tenho, porque sou uma mulher israelita, estou disponível para ir para a Síria e treinar até sempre quem quiser ir proteger as crianças sírias. Pode levar 20, 30, 40 anos, não importa”.

O livro "O povo da eternidade não tem medo" é editado pela Alfaguara em Portugal.