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Primavera árabe

“Esta é uma batalha do povo sírio e os cristãos apoiam-na”

25 jan, 2012 • Filipe d'Avillez

Os patriarcas cristãos da Síria têm variado entre o silêncio cauteloso e o apoio claro ao regime de Assad, mas há relatos de cristãos nas ruas a participar e até a morrer nos protestos.

“Esta é uma batalha do povo sírio e os cristãos apoiam-na”
Chamam-se Cristãos Sírios pela Democracia (CSD), formaram-se há cerca de dois meses e dizem representar um grande número de cristãos na Síria que desejam a queda do regime de Bashar al-Assad.

A CSD está sedeada em Washington, onde desenvolve um trabalho de “lobbying” junto das instituições americanas, mas George Stifo, porta-voz do grupo, garante que este tem muito apoio no interior do país árabe incluindo representantes de todas as facções cristãs: católicos, ortodoxos e protestantes.

“Temos recebido muitas mensagens de apoio vindas de cristãos na Síria. Muitos grupos e muitos indivíduos têm entrado em contacto connosco para nos dar o seu apoio”, explica Stifo.

O sentimento anti-regime de muitos cristãos reflecte-se nas ruas, explica o porta-voz da CSD: “Tem havido cristãos a participar nos protestos desde o início. Uma das principais organizações a fazê-lo é a Organização Democrática Assíria. Têm-no feito de forma pública, os seus membros têm sido detidos e alguns até mortos. Vemos muitos cristãos nos protestos, lado a lado com os seus irmãos muçulmanos.”

Na opinião de Stifo estes cristãos não fazem mais do que o seu dever patriótico: “Os cristãos são nativos da terra da Síria, são-no há milhares de anos. Têm combatido nas batalhas da Síria há milhares de anos. Esta é mais uma batalha do povo sírio e os cristãos são parte desta comunidade e apoiam-na, como tal têm apoiado e continuarão a apoiar os protestos.”

Patriarcas pressionados
Este apoio contrasta claramente com a atitude da hierarquia cristã na Síria. Até agora os vários bispos e patriarcas que existem naquele país, onde os cristãos representam 10% da população, não têm criticado directamente o regime de Damasco. Uma situação compreensível, tendo em conta o contexto, considera Stifo: “Ditaduras como esta da Síria não permitem ao povo que expresse as suas opiniões. As hierarquias estão sob forte vigilância do Governo, pelo que estão fortemente restringidas em relação ao que podem dizer.”

Contudo, a situação parece estar a mudar, alerta o activista: “Se repararem nos últimos meses o tom tem mudado de apoio aberto ao regime para uma atitude mais passiva, ou meros apelos à paz. Compreendemos as restrições a que as hierarquias estão sujeitas, vivemos neste país há anos e sabemos o que se passa e sabemos como o regime age, como intimida as pessoas. Não é nada de novo e vai continuar enquanto este regime existir”, afirma.

George Stifo dá o exemplo do Patriarca Melquita Gregorios III, a mais importante figura da Igreja Católica na Síria: “Afirmou que os cristãos na Síria não estão presos a qualquer regime ou pessoa e que apoiam qualquer regime ou pessoa desde que tenha o apoio do resto do povo”, uma forma discreta de distanciar a sorte dos cristãos do regime.

Contudo, este apoio dos cristãos é compreensível. Na Síria têm vivido em paz e sem ameaças do fundamentalismo islâmico. À luz do que tem acontecido no Iraque e no Egipto desde a queda dos seus respectivos regimes, temem que a democracia traga perseguição e ponha em risco a sua estabilidade.

É por isso, precisa George Stifo, que a CSD se formou: “O nosso objectivo é acalmar estes receios e garantir que a oposição e qualquer grupo que trabalha pelo futuro da Síria tenham em conta os superiores interesses do povo, incluindo os cristãos sírios, e que os direitos dos cristãos sejam representados no futuro Governo da Síria”, considera o porta-voz, que se revela confiante nas sucessivas promessas feitas pelos vários grupos da oposição de que querem formar um novo Governo que seja secular e que trate todos os cidadãos por igual.