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Papa quer saber porque é que os jovens abandonam a Igreja em Portugal

07 set, 2015 • Aura Miguel, em Roma, e Filipe d'Avillez

"Onde é que escondemos Jesus?", perguntou Francisco aos bispos portugueses, em Roma. "Hoje, a nossa proposta de Jesus não convence" os jovens.

Papa quer saber porque é que os jovens abandonam a Igreja em Portugal

Os jovens estão em "debandada" da Igreja e o Papa Francisco está preocupado. "Hoje, a nossa proposta de Jesus não convence" a juventude, disse aos bispos portugueses, que foram recebidos esta segunda-feira por Francisco.

"A juventude deixa porque assim o decide? Decide assim porque não lhe interessa a oferta recebida? Não lhe interessa a oferta, porque não dá resposta às questões e interrogativos que hoje a inquietam?", perguntou o Papa.

Francisco adianta a resposta: "Não será simplesmente porque, há muito, deixou de lhe servir o vestido da Primeira Comunhão, e mudou-o? É possível que a comunidade cristã insista em vestir-lho?" É que Jesus, entretanto, também cresceu, recorda o Papa aos bispos portugueses. "Que Ele está, não há dúvida; mas onde é que O escondemos?"

Elencando uma série de outros problemas que segundo o Papa afectam as dioceses e paróquias portuguesas, Francisco pediu coragem aos bispos para os enfrentar.

"Não percais a coragem perante situações que suscitam perplexidade e vos causam amargura, tais como certas paróquias estagnadas e necessitadas de reavivar a fé baptismal, que acorde no indivíduo e na comunidade um autêntico espírito de missão; paróquias por vezes centradas e fechadas no 'seu' pároco às quais a carência de sacerdotes, para além do mais, impõe abertura a uma lógica mais dinâmica e eclesial na comunhão."

O Papa referiu ainda a questão de "sacerdotes que, tentados pelo activismo pastoral, não cultivam a oração e a profundidade espiritual, essenciais para a evangelização", bem como "um grande número de adolescentes e jovens que abandonam a prática cristã, depois do sacramento do Crisma; um vazio na oferta paroquial de formação cristã juvenil pós-Crisma, que muito poderia obstar a futuras situações familiares irregulares".

"Enfim, necessidade de conversão pessoal e pastoral de pastores e fiéis até que todos possam dizer com verdade e alegria: a Igreja é a nossa casa", concluiu o Papa.

Francisco lembra ainda que não há motivo algum para uma pessoa – seja ela quem for – se auto-excluir do olhar terno de Deus e que, por isso mesmo, os catequistas e comunidades devem passar do modelo escolar a um percurso global e não apenas do conhecimento cerebral, mas apostando no encontro pessoal com Jesus.

"Hoje, a nossa proposta de Jesus não convence. Eu penso que, nos guiões preparados para os sucessivos anos de catequese, esteja bem apresentada a figura e a vida de Jesus; talvez mais difícil se torne encontrá-Lo no testemunho de vida do catequista e da comunidade inteira que o envia e sustenta, apoiada nas palavras de Jesus: 'Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos.'"

Tantos jovens desocupados e o Reino à "míngua de operários"
Num discurso longo e programático, Francisco elogiou a Igreja portuguesa e o zelo pastoral dos seus responsáveis, incentivando-os a não desanimarem porque também os apóstolos e o próprio Pedro "eram homens fracos".
 
Terminando numa nota de esperança, Francisco sublinhou aquilo de que a Igreja precisa mesmo: "A Igreja em Portugal precisa de jovens capazes de dar resposta a Deus que os chama, para voltar a haver famílias cristãs estáveis e fecundas, para voltar a haver consagrados e consagradas que trocam tudo pelo tesouro do Reino de Deus, para voltar a haver sacerdotes imolados com Cristo pelos seus irmãos e irmãs."

"Temos tantos jovens desocupados e o Reino dos Céus à míngua de operários e servidores… Deus não pode querer isto. Que se passa então? 'É que ninguém nos contratou' (Mt 20, 7). Precisamos de conferir dimensão vocacional a um percurso catequético global que possa cobrir as várias idades do ser humano, de modo que todas elas sejam uma resposta ao bom Deus que chama: ainda no seio da mãe, chamou à vida e o nosso ser assomou à vida; e, ao findar a sua etapa terrena, há-de responder com todo o seu ser a esta chamada: 'Servo bom e fiel, entra no gozo do teu Senhor' (Mt 25, 21)", referiu o Papa.

A visita "ad limina" deve realizar-se de cinco em cinco anos, permitindo um contacto mais directo entre o Papa e as dioceses locais, mas devido a vários atrasos esta realiza-se com três anos de atraso.