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"Crise de vocações" preocupa missionária vencedora do prémio Norte-Sul

01 jul, 2015 • Maria João Costa

Maura Lynch perdeu a conta ao número de mulheres que ajudou a tratar. O acesso aos cuidados primários de saúde é muitas vezes uma questão de sobrevivência no continente africano, diz a médica-cirurgiã e obstetra em entrevista à Renascença.

"Crise de vocações" preocupa missionária vencedora do prémio Norte-Sul

Maura Lynch é uma missionária irlandesa no Uganda. Em entrevista à Renascença, a vencedora do Prémio Norte-Sul do Conselho da Europa mostra-se preocupada com a crise de vocações para prosseguir a obra em África.

Só a cruz que traz ao peito deixa perceber que Maura Lynch é missionária. Esta médica-cirurgiã e obstetra, que nasceu há 76 anos na Irlanda, vive há mais de duas décadas no Uganda. Antes passou outros 20 anos em Angola, mas lembra-se todos os dias que ainda é uma cidadã da Europa.

Esta avó, como lhe chamam os ugandeses, trabalha ao serviço das Missionárias Médicas de Maria. A congregação religiosa fundada em 1937, na Nigéria, pela irmã Marie Martin, está presente em 14 países e presta ajuda médica.

Maura Lynch preocupa-se hoje com a crise de vocações e a continuação do trabalho destas missionárias. “Hoje há uma crise de vocações, já não são como há 30 anos. Mas o espírito permanece, por isso esperamos que estes hospitais e clínicas que foram montados por missionários continuem nas mãos de pessoas com uma mente religiosa ou de religiosos locais “, afirma a missionária.

Cuidados médicos não têm religião
Uma das principais preocupações de Maura Lynch é tratar a fístula obstétrica, que afecta milhares de mulheres no Uganda. Dedica grande parte da sua acção à defesa dos direito das mulheres daquele país e é a elas que dedica o Prémio Norte-Sul do Conselho da Europa.

“É um prémio também para as mulheres que se deixaram tratar por mim e que me deixaram entrar nas suas vidas. Tornaram isto possível. É uma honra que vou levar de volta. Para mim isto dá um sinal de esperança de que há uma voz para os sem voz. Quer dizer que há quem ouça e isso dá-nos esperança.”

O acesso aos cuidados primários de saúde é, segundo Maura Lynch, muitas vezes uma questão de sobrevivência no continente africano. Para esta irlandesa católica, os cuidados médicos não têm religião.

“Alguns podem acreditar num Deus diferente, mas o facto é que todos temos fé. É a fé que nos move, por isso, não tenho qualquer dificuldade. Tenho doentes de diferentes fés e acho que há um lado bom em todos eles. É assim que vejo as coisas e alguns deles são um exemplo.”

"Deus está sempre ao meu lado"
São as palavras de Deus que segue sempre que executa o seu trabalho e é o Seu exemplo que olha quando enfrenta circunstâncias difíceis.

“Deus está sempre ao meu lado. Ele é o nosso exemplo. Quando Jesus Cristo, o filho de Deus, veio à terra, veio cheio de compaixão e amor. Ele tocou nos intocáveis. Naquele tempo havia lepra e era impensável tocar num leproso, mas Jesus fê-lo. É isso que eu também devo fazer. Faz parte da cura”, sublinha.

Maura Lynch venceu o Prémio Norte-Sul já antes atribuído a figuras como Kofi Annan, Simone Veil, a Rainha Rania da Jordânia, Mary Robinson, Mário Soares, Bob Geldof, Lula da Silva, Graça Machel e Aga Khan.

O prémio foi entregue esta quarta-feira, no Parlamento, pela mão do Presidente da República, Cavaco Silva.

O outro galardoado foi André Azoulay, conselheiro sénior do Rei de Marrocos desde 1991 e um dos fundadores do Grupo Aladin, que actua para a promoção da compreensão mútua e das relações interculturais entre a comunidade Islâmica e o resto do mundo.