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Imolação de refém criticada por simpatizantes do Estado Islâmico

03 fev, 2015 • Filipe d’Avillez

Há quem diga que este tipo de execução é expressamente proibida pelo islão, mas outros adeptos da jihad justificam-se com base no Alcorão.

O método usado para assassinar o piloto jordano Mu'ath Al-Kasasbeh - queimá-lo vivo - foi tão violento que mesmo muitos simpatizantes do grupo terrorista Estado Islâmico estão a questioná-lo nas redes sociais.

Ao contrário da maioria dos outros reféns e presos do Estado Islâmico, que foram decapitados ou mortos com tiros na nuca, Kasasbeh foi colocado dentro de uma jaula e queimado vivo.

O acto está a gerar muita discussão nas redes sociais. De fora a condenação é unânime, mas mesmo entre os simpatizantes do Estado Islâmico há opiniões diferentes.

Pela sua própria natureza, de autoproclamado expoente máximo do islão, o Estado Islâmico procura justificar todos os seus actos com citações do Alcorão ou dos hadites, os ditos de Maomé que foram sendo passados oralmente até serem codificados e que formam, juntamente com o livro sagrado do islão, os dois pilares de todo o sistema jurídico islâmico.

É precisamente num dos hadites que pegam os que questionam a forma como Kasasbeh foi morto. O dito em questão afirma que Maomé proibiu expressamente que alguém seja morto pelo fogo, uma vez que essa forma de castigo estaria reservada a Deus.

O hadite 6922, coligido por Muhammad al-Bukhari, diz: "Alguns ateus foram levados a Ali e ele queimou-os. A notícia chegou a Ibn Abbas, que disse: 'Se fosse eu não os teria queimado, uma vez que o Mensageiro de Deus o proibiu, dizendo: 'Não castigues ninguém com o castigo de Deus (fogo)'".

Segundo este artigo, o acto levado a cabo pelo Estado Islâmico poderia mesmo ser considerado herético e deveria ser condenado por todos os muçulmanos.

Contudo, os simpatizantes e membros do Estado Islâmico apontam para outras tradições de sentido contrário, incluindo uma citação do Alcorão, a autoridade máxima, que diz que os agressores deviam ser mortos com o mesmo instrumento que utilizaram para ferir as suas vítimas. No caso do piloto, esse instrumento é o fogo, alegam, uma vez que ele bombardeava os territórios ocupados pelo grupo terrorista: "Quando castigardes, fazei-o do mesmo modo como fostes castigados".

Os defensores da imolação citam também outro alegado dito do profeta, desta feita proferido por um dos seus companheiros, Al-Baraa ibn Malik al-Ansari, que terá atribuído a Maomé o seguinte: "Quem queimar um muçulmano até à morte, também o queimaremos; e quem afogar um muçulmano, também o afogaremos".

Mal surgiram as primeiras imagens da morte do piloto jordano, muitos simpatizantes do Estado Islâmico começaram a publicar nas redes sociais imagens de crianças feridas e desfiguradas, alegadamente devido a bombardeamentos levados a cabo pela coligação internacional em Raqqa e outras cidades ocupadas pelos terroristas, justificando dessa forma o acto.

Outros confessaram que o vídeo, que mostra o soldado aos gritos enquanto é queimado vivo, os tinha deixado mal-dispostos, mas relativizaram: é uma questão de hábito, disseram.

Contudo, alguns especialistas que seguem o Estado Islâmico consideram que a brutalidade deste acto apenas servirá para hostilizar as bases de apoio do grupo.