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EUA

Barbudos “goleiam” sistema prisional no jogo da liberdade religiosa

20 jan, 2015 • Filipe d’Avillez

As religiões têm muito a dizer sobre o cabelo e os pelos faciais, o que nalguns casos pode levar a conflitos com entidades patronais ou, como neste caso, com o sistema prisional.

Barbudos “goleiam” sistema prisional no jogo da liberdade religiosa
O Supremo Tribunal dos EUA decretou por unanimidade que os reclusos têm o direito a deixar crescer a barba, independentemente das regras prisionais, se for por razões religiosas. A decisão foi uma autêntica "goleada", de 9 votos a favor e 0 contra.

O processo foi interposto por Gregory Holt, um recluso muçulmano a quem uma prisão do Arcansas obrigou a cortar a barba, que queria deixar crescer por razões religiosas.

As regras nas prisões americanas variam de Estado para Estado, mas em muitas é proibido deixar crescer o cabelo ou usar barba. São alegadas razões diferentes, como a higiene e o perigo de utilizar o cabelo para esconder armas, como navalhas, ou outro tipo de contrabando. No Estado do Arcansas, actualmente, os detidos apenas podiam ter “bigodes bem aparados”.

Mas os juízes consideram que o direito à liberdade religiosa dos reclusos está, nestes casos, a ser violado. A decisão do supremo tribunal tem precedência sobre qualquer regulamento estadual ou interno das diferentes prisões.

O caso de Gregory Holt está longe de ser o único. Muitos muçulmanos consideram uma obrigação religiosa deixar crescer a barba, pelo que a situação se repete em várias prisões. Mas não são só os muçulmanos. Alguns judeus invocam o mesmo direito enquanto os rastafarianos e os sikhs, por exemplo, proíbem que se corte o cabelo.

As religiões sempre deram muita importância a questões envolvendo o cabelo e os pelos faciais. O Cristianismo, neste aspecto, é das religiões mais liberais, não impondo qualquer tipo de restrição ou obrigação formal. Contudo, informalmente, há uma curiosa distinção entre a tradição cristã ocidental e oriental.

Adoptando as orientações de Roma, a Igreja Ocidental considerava que as barbas eram sinal de vaidade, pelo que inicialmente os seus clérigos eram proibidos de deixar crescer a barba ou o bigode. Mas no Império Romano do Oriente, centrado em Constantinopla, fazer a barba é que era considerado sinal de vaidade, pelo os clérigos dessa tradição eram encorajados a deixar crescer as suas barbas, de preferência de forma descuidada, algo que ainda hoje se pode observar nos padres e monges das Igrejas cristãs no Oriente, sobretudo as ortodoxas.

No Islão algumas correntes defendem a obrigatoriedade de se deixar crescer a barba. A tendência é visível sobretudo entre os fundamentalistas, embora não só. Estes, sobretudo os sunitas, defendem que se deve imitar Maomé em tudo pelo que deixam crescer as barbas mas rapam o bigode, uma moda claramente visível, por exemplo, entre os combatentes de grupos extremistas como os do Estado Islâmico.

Comprovando que os opostos por vezes se tocam, esta é precisamente a forma escolhida pelos cristãos das comunidades amish, que defendem a não-violência radical, de se apresentarem. Mas num caso absolutamente bizarro, que remonta a 2011, vários membros de uma comunidade amish foram detidos depois de uma disputa interna da comunidade. O seu crime? Rapar as barbas, durante a noite, dos seus inimigos internos, sujeitando-os assim à humilhação.

Mulheres de cabelo tapado
Uma tendência que se aplica a quase todas as religiões do mundo é a recomendação de que as mulheres tapem o seu cabelo, como sinal de modéstia, sobretudo em público ou pelo menos quando se encontram em espaços sagrados.

O Islão ainda o recomenda, bem como o judaísmo ortodoxo. Algumas mulheres judias destas comunidades compram perucas com as quais tapam o seu cabelo natural, cumprindo assim a letra da lei, sem terem de andar com véu.

Entre os cristãos várias são as ordens religiosas que ainda usam o véu, embora não seja comum ver-se, como se via antigamente, mulheres com o cabelo tapado no interior das igrejas.