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Reportagem

50 anos em clausura. "Sabe que o amor tira a monotonia?"

17 out, 2014 • Liliana Carona

Celebram-se no sábado 50 anos de vida religiosa da madre prioresa do Carmelo da Guarda. Vivem em clausura, mas dizem que são as primeiras a saber o que se passa no país.

50 anos em clausura. "Sabe que o amor tira a monotonia?"

Batemos à porta. Abre-se a cortina e, por detrás das grades, surge Teresa de Jesus, de 75 anos. "Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo", diz-nos. "Sempre pensei que fosse morrer mais nova, mas Nosso Senhor não quis, ainda não sou santa."

A madre prioresa do Carmelo da Guarda vive em clausura. Não se lembra da última vez que saiu à rua, mas recorda-se do que pensava quando chegou dos Açores para estudar Filologia Românica em Coimbra.

"Passava muitas vezes em frente ao Carmelo, e costumava pensar: ‘É preciso ser-se muito doida para se meter ali dentro toda a vida’. Mal sabia eu que poucos anos depois seria uma das doidas que lá dentro estaria", conta.

Tinha 22 anos quando foi para um retiro, em Cernache, no concelho de Coimbra. Gostou apenas do lago e dos barcos, mas não se podia andar nos barcos.

"E agora, o que vou fazer aqui?", pensou. Assustou-se: havia "imenso", demasiado, tempo para ocupar. No fim do retiro, o sacerdote que o orientou perguntou-lhe: "Se Deus te chamasse tu ias?". "E, pronto, não foi preciso mais nada", recorda.

Este sábado, são assinaladas as bodas de ouro da madre prioresa do Carmelo da Guarda, presididas pelo bispo local, D. Manuel Felício. No mesmo dia, começam as comemorações do V Centenário do Nascimento de Santa Teresa de Jesus (ou Teresa d'Ávila), fundadora das Carmelitas Descalças.

Antes dos jornais
Uma calçada de pedra leva-nos ao Carmelo da Guarda, construído em 1994, onde moram 12 irmãs. Numa das quatro ermidas, a irmã Teresa de Jesus celebrará as bodas de ouro em retiro.

Dizem que são as primeiras a saber o que se passa no país. Mas como? O telefone toca muitas vezes, com pedidos de oração. Por isso, "as Carmelitas sabem as coisas antes de saírem nos jornais", garante. "No recreio pede-se oração às irmãs".

O silêncio impera. Há apenas duas horas de recreio por dia em que podem falar umas com as outras. "Nunca senti que a clausura me cortasse a minha liberdade. Se houver um incêndio não vamos morrer queimadas porque não podemos sair. Temos uma vida normal de dona de casa e trabalhamos, fazemos escapulários, terços, rendas, hóstias, Não fazemos é com prazos. Tudo o que dá stress deve ser evitado. [A nossa vida] É uma monotonia que não é monotonia. Sabe que o amor tira a monotonia, não é?", graceja.

Teresa de Jesus gosta de ler biografias dos santos e de música clássica. E comer (diz-se que Teresa d'Ávila inventou a batata frita)? "Engraçado: toda a gente gosta de batata frita. Eu também gosto, quem é que não gosta?", diz. Ela prefere outros sabores: "massa folhada e ovos-moles".