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Supremo dá razão a empresas contra “mandato contraceptivo” de Obama

30 jun, 2014 • Filipe d’Avillez

Duas empresas invocam objecção de consciência para não fornecer contraceptivos, esterilizações e pílulas abortivas nos seguros de saúde dos funcionários. É uma derrota do "ObamaCare".

O Supremo Tribunal dos Estados Unidos saiu esta segunda-feira em defesa da liberdade religiosa, dando razão a duas empresas que processaram o Governo, que queria obrigá-las a financiar contraceptivos, esterilizações e pílulas abortivas para os seus funcionários como parte dos seus seguros de saúde.

As empresas, Hobby Lobby e Conestoga Wood, obtiveram assim uma importante vitória, que pode ser vista como crucial na actual disputa entre vários grupos religiosos, incluindo a Igreja Católica, e a administração Obama.

O caso diz respeito a um decreto da reforma do sistema de saúde, a grande bandeira da presidência de Barack Obama, conhecida informalmente como "ObamaCare".

A reforma obriga as empresas a fornecer seguros de saúde aos seus funcionários e, de acordo com o texto final, estes seguros devem incluir a cobertura de contraceptivos, incluindo pílulas abortivas, e esterilização.

Este decreto, conhecido como o "Contraceptive Mandate" ou "HHS Mandate", por ter sido redigido pelo departamento de Health and Human Service, tem merecido forte contestação por parte de grupos religiosos, com o episcopado católico à cabeça, e também por algumas empresas privadas detidas por pessoas ou famílias que invocam objecção de consciência para não acatar esse ponto em particular.

A decisão do Supremo Tribunal foi renhida, com os quatro juízes conservadores a votar no sentido das empresas e os quatro liberais a alinhar com o Governo. O quinto voto, decisivo, foi no sentido da liberdade de consciência das empresas, dando a vitória à Hobby Lobby e Conestoga Wood.

Os juizes da opinião maioritária deixaram claro que a sua decisão diz respeito unicamente ao mandato contraceptivo e não pode ser por isso invocada por empresas que invoquem objecção de consciência para outros produtos ou serviços, como vacinações ou transfusões de sangue, por exemplo. Segundo os juízes, o Governo não demonstrou que o mandato é a forma menos restritiva de avançar o seu interesse em garantir o acesso livre à contracepção. O juiz Anthony Kennedy, que votou com a maioria, disse ainda que o Governo pode, se quiser, cobrir essas despesas.

A decisão fala especificamente em empresas de capital fechado, que pertençam por exemplo a uma família ou uma só pessoa, como é o caso. Não parece haver grande margem para multinacionais, por exemplo, poderem invocar objecção de consciência.

Obama chegou a oferecer uma isenção à Igreja, mas que abrangia apenas os locais de culto e seus funcionários directos, deixando de fora a esmagadora maioria das instituições, como hospitais, escolas, universidades e lares, entre outros.

O peso das multas
O grupo Hobby Lobby, detido por uma família evangélica, e a Conestoga Wood Specialities, cujos donos são menonitas, discordam em particular da inclusão de pílulas abortivas nos seguros que agora são obrigados a fornecer aos seus funcionários.

Enquanto a Consestoga emprega 1.200 pessoas, a cadeia de lojas da Hobby Lobby dá trabalho a 21 mil. O não cumprimento do HHS Mandate implica o pagamento de uma multa de 100 dólares, por dia, por empregado, o que no caso do Hobby Lobby equivale a cerca de 2,1 milhões de dólares por dia, pelo que as empresas terão de aceitar, violando a consciência dos seus proprietários, ou então encerrar.

Em simultâneo com este caso decorre outro que opõe várias instituições católicas ao Estado. A diferença está na característica especificamente religiosa das instituições, por oposição a empresas privadas.

Implicações por esclarecer
As implicações para estes casos, contudo, não são muito claras. Na sentença, a maioria de juízes diz que já existe um mecanismo para salvaguardar o interesse de organizações que advoguem objecção de consciência. Esse mecanismo foi apresentado pela administração de Barack Obama, supostamente para apaziguar as objecções da Igreja, e indica que nesses casos a cobertura dos contraceptivos caberá à seguradora e não à instituição.

Os bispos, contudo, rejeitaram a medida, dizendo que ela apenas tenta camuflar o problema, uma vez que as seguradoras limitar-se-iam a distribuir esse custo pelos prémios do seguro e continuaria a obrigar as instituições a colaborar materialmente com algo que consideram um mal.

Ao indicar essa possibilidade, não é claro que o processo movido pelas instituições religiosas colha no Supremo Tribunal, mas todas as leituras nesse sentido são apenas especulativas neste momento.

[Notícia actualizada às 15h43]