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Balanço real do Ano da Fé "só Deus o tem"

21 nov, 2013

Em entrevista à Renascença, D. José Policarpo faz balanço do Ano da Fé e fala sobre a esperança com que devem ser lidos os sinais dos tempos.

Balanço real do Ano da Fé "só Deus o tem"
Em entrevista a Graça Franco, D. José Policarpo fez balanço do Ano da Fé e falou sobre a esperança com que devem ser lidos os sinais dos tempos.

“O balanço real do que significou este Ano da Fé só Deus o tem. Passa pela dimensão secreta, silenciosa com que foi vivido no coração dos crentes”, avalia o cardeal D. José Policarpo. Em entrevista à Renascença, o Patriarca emérito de Lisboa diz que é possível avaliar as actividades colectivas, mas remete o verdadeiro balanço para o que se passou no coração de cada um e na sua relação com Deus.

D. José Policarpo alerta para o perigo que é pensar que o desafio acabou quando o ano especial acaba. “Estes anos especiais são para acentuar uma dimensão permanente da vida cristã”, afirma o cardeal, reforçando que o desafio agora é manter bem vivo, na vida de todos os dias, nos desafios no meio do mundo da política, do trabalho, da economia tudo aquilo que este Ano da Fé despertou.

O Ano da Fé, que termina oficialmente no domingo, foi convocado pelo Papa Bento XVI e vai ser encerrado pelo Papa Francisco, que, para D. José “trouxe uma frescura surpreendente”. O essencial é o mesmo, mas “há uma sensibilidade nova”, afirma o Patriarca emérito, lembrando o discurso feito aos núncios apostólicos em que o Papa Francisco pediu que escolham pastores e não doutores para estar à frente das dioceses.

Nesta entrevista a propósito do encerramento do Ano da Fé, D. José Policarpo diz-se “sensível à busca silenciosa de muita gente” e reflecte sobre os sinais dos tempos. “A expressão sinais dos tempos são sinais de esperança: é não julgar o mundo todo com o mesmo adjectivo. Mas só pode ler os sinais dos tempos quem está inserido na sociedade com amor e com uma perspectiva que é a que Jesus Cristo me comunica.” 

É com esperança que o cardeal encara a presença dos cristãos na política, manifestando empenho na formação de mais cristãos tendo em vista o que considera ser “uma necessidade a longo prazo para a transformação da sociedade. “Há muita gente com amor à justiça e amor à verdade, cristãos praticantes e não praticantes e que fazem o melhor que podem”, diz D. José Policarpo, que alerta: “Na política, para além de haver generosidade, tem de haver competência.” E tem de haver sentido de missão, continua o cardeal em entrevista à Renascença.

“A política não pode ser uma profissão, a política é uma missão e deve ser exercida por gente que está treinado, na sua especialidade, na maneira como construiu a sua vida, a lutar pelo bem para a comunidade”, afirma D. José, acrescentando que “quando a politica é uma profissão é um perigo para a pessoa e para a sociedade, porque faz rapidamente perder a competência”.

O Patriarca emérito salienta dois pontos da actual crise em que é preciso valorizar ideias-mestras. Primeiro, em matéria de trabalho. “O trabalho é um direito, mas é um direito também que eu construo e que eu conquisto. Não posso estar à espera que me venha do céu por um buraco e aqui o céu é, muitas vezes na mentalidade dos portugueses, o Estado”, afirma D. José Policarpo, comentando a recente nota da Conferência Episcopal sobre o mundo do trabalho.

O segundo ponto, ligado ao primeiro, é a necessidade de religar política e economia.

“A tendência da grande finança foi autonomizar da economia e conseguir lucros que não são os da economia. É um problema internacional, não é um problema que se pode resolver só aqui. Tem de se criar uma harmonia e uma convergência sadia, construtiva, generosa. Tem havido pouca generosidade no mundo da finança, não se pode enriquecer com um clique de computador”, acusa o cardeal, que pega nas palavras do Evangelho para distinguir: “Não é pecado ser rico, não é pecado ter muito dinheiro. Simplesmente é mais exigente. Porque é que o senhor diz que é tão difícil um rico entrar no reino dos céus?”