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Ramalho Eanes eleito Presidente há 36 anos

27 jun, 2012 • Dina Soares

Ramalho Eanes venceu as primeiras Presidenciais democráticas a 27 de Junho de 1976. "Foram as circunstâncias e a necessidade de ter alguém com legitimidade para reorganizar as Forças Armadas que determinaram a minha entrada na corrida presidencial”, recorda o general, em declarações à Renascença.

Ramalho Eanes eleito Presidente há 36 anos

Foi a primeira vez, na História portuguesa, que um Presidente da República foi eleito, livremente, por sufrágio directo e universal. A 27 de Junho de 1976, António Ramalho Eanes recolhia 61,59 por cento dos votos expressos, tornando-se, assim, no primeiro chefe de Estado a ser escolhido democraticamente pelos portugueses.

“A minha candidatura não era óbvia. Tinha alguma preparação política teórica, mas faltava-me a prática. Foram as circunstâncias e a necessidade de ter alguém com legitimidade para reorganizar as Forças Armadas que determinaram a minha entrada na corrida presidencial”, recorda hoje Ramalho Eanes, em declarações à Renascença.

Proposto pelo Conselho da Revolução e apoiado pela esquerda moderada e pelo centro-direita, Eanes deixou logo claro o seu projecto político: “Se me candidatar e for eleito, serei extremamente rigoroso na exigência do cumprimento da Constituição”. Uma declaração curiosa, vinda de quem defendia uma revisão do texto constitucional. Eanes explica: “A Constituição era um referencial de legitimidade, numa altura em que abundavam as legitimidades. Por isso, aquele texto, bom ou mau, tinha que ser respeitado”.  

Esta declaração inicial – saudada pelos partidos - e, sobretudo, o prestígio que ganhou na chefia das forças que vencenram o confronto militar de 25 de Novembro de 1975, conduziram-no facilmente à vitória. O general não valoriza, no entanto, o facto de ter sido o primeiro presidente eleito democraticamente. “O importante era que a população portuguesa percebesse que só há uma via para a democracia, que é a via da exigência popular. Pela primeira vez, tínhamos uma porta aberta para que a sociedade civil assumisse os seus poderes e responsabilidades”. 

Apesar de curta, a campanha foi recheada de episódios. “Estávamos muito perto do PREC. Por isso, foi uma campanha em que a racionalização deu lugar às paixões. O ambiente era de grande emoção e dramatismo”. Ramalho Eanes não se detém nos pormenores, mas sempre vai recordando aquele comício em que foi apedrejado, o outro em que, à saída, foi recebido a tiro, ou aquela viagem em que puseram óleo na estrada, na tentativa de que houvesse um acidente. “Todos os dias havia notícias de que eu ia ter problemas”, remata.

Como primeiro Presidente pós-PREC, coube a Ramalho Eanes defender um sistema democrático embrionário e reconduzir as Forças Armadas às suas missões tradicionais, numa época em que os quartéis estavam divididos, ideológica e emocionalmente. “Resolver estas contradições não era fácil. Era necessário um militar com legitimidade democrática”.

O seu primeiro mandato ficaria também marcado pelos governos de iniciativa presidencial. “A solução estava prevista na Constituição e já existia noutros países da Europa”, sublinha o general. Em 1977, com o Governo de Mário Soares a ser derrubado por uma moção de censura, Eanes ainda consegue forçar um entendimento entre o PS e o CDS para a formação do II Governo Constitucional, que duraria apenas sete meses. “Mas, depois da queda do II Governo Constitucional, não havia solução partidária possível”, recorda. “PS e CDS estavam zangados, o PSD estava numa situação complicada, depois de Sá Carneiro ter abandonado a liderança do partido. Além disso, o PS não podia aliar-se ao PCP e eu tinha dito que só aceitaria um governo com uma maioria estável e um programa coerente”. Acresce que a lei eleitoral ainda não tinha sido aprovada e o recenseamento precisava de ser concluído, o que significa que não se podiam convocar novas eleições.

Neste contexto, Eanes nomeia Alfredo Nobre da Costa como Primeiro-Ministro de um governo de iniciativa presidencial que nem chegaria e governar, devido ao chumbo do seu programa, no Parlamento. Sem acordo entre partidos, o Presidente nomeia outro Primeiro-Ministro. Mota Pinto resiste pouco mais de seis meses - o chumbo do Orçamento de Estado e o veto à Lei de Amnistia de infrações de natureza política levam-no à demissão.

“Primeiro, tinha optado por um governo de técnicos, que não hostilizasse os partidos. Não resultou. Procurei, então, uma solução de meio-termo”. Só que o país não saía do impasse. O PSD faz finca-pé numa nova ida às urnas e Eanes considera que as condições para a realização de eleições tinham sido, entretanto, reunidas. Para o período entre a demissão de Mota Pinto e as eleições, Eanes ainda nomeia um terceiro governo de iniciativa presidencial, desta vez liderado por Maria de Lurdes Pintasilgo, para gerir os negócios do Estado até às legislativas de 2 de Dezembro. 

As eleições haveriam de gerar a primeira maioria absoluta da democracia, mas não conseguiram trazer a paz política ao país. Logo na posse de Sá Carneiro como Primeiro-Ministro, ficam claras as profundas divergências políticas entre o chefe do Governo e o chefe de Estado, que levariam o PSD e os seus parceiros da Aliança Democrática a apoiarem o general Soares Carneiro como rival de Ramalho Eanes na corrida presidencial seguinte. Eanes apresenta-se ao segundo mandato com o apoio do PS e da ASDI. É reeleito a 7 de Dezembro de 1980, à primeira volta, com 56,44 por cento dos votos.