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Cavaco Silva a "pensar o futuro de Portugal" renova apelo a compromissos

25 abr, 2015 • Marta Grosso

Tolerância, desafios, relação entre cidadãos e instituições e inclusão são as palavras-chave do Presidente da República no seu discurso na Assembleia da República.

Cavaco Silva a "pensar o futuro de Portugal" renova apelo a compromissos
Foi com os olhos colocados no futuro que Cavaco Silva fez o seu último discurso como Presidente da República na cerimónia comemorativa da revolução de 25 de Abril de 1974. Tolerância, desafios, relação entre cidadãos e instituições e diálogo são as palavras-chave do Presidente da República no seu discurso na Assembleia da República.
Foi com os olhos colocados no futuro que Cavaco Silva fez o seu último discurso como Presidente da República na cerimónia comemorativa da revolução de 25 de Abril de 1974. O chefe de Estado falou dos muitos desafios que se colocam a um país, agora, de “contas externas equilibradas, respeitado e credível” e que tem como “maior herói o povo”.

Para enfrentar esses vários desafios, “que não se esgotam no horizonte temporal de uma legislatura”, o Presidente lembra que é preciso envolver os portugueses, criando condições para que confiem nas instituições e no Estado.

“Ao fim de quatro décadas de democracia, os agentes políticos devem perceber, de uma vez por todas, que os portugueses não se revêem em formas de intervenção de conflito, que colocam interesses partidários e de ocasião acima do superior interesse nacional”, afirmou, lamentando que o debate político se faça hoje baseado no ataque pessoal e em “querelas estéreis, na calúnia e na difamação”.

Isso “afasta os cidadãos da vida da República, fomentando o desinteresse cívico”, avisou.

Numa clara alusão ao ciclo eleitoral que aí vem – legislativas e presidenciais – Cavaco Silva avisou, assim, para a violência verbal no combate político, que afasta os cidadãos da vida do país e corrompe a confiança dos portugueses nas instituições.

E pediu a todos os agentes políticos “que contribuam para elevação do debate público e para a qualidade da democracia em Portugal. Só assim será possível alcançar os compromissos imprescindíveis para enfrentar com êxito os desafios que o futuro nos coloca. Só assim foi possível concretizar muitos dos sonhos de Abril.”

Fazer nascer e defender jovens talentos
O primeiro desafio apontado por Cavaco Silva no seu discurso foi a promoção da natalidade. Portugal tem poucas crianças e muita população idosa, o que é “mau para a economia e significa que, no futuro, teremos menos jovens empreendedores, menos trabalhadores qualificados”.

Mas, além de se promover a natalidade, o chefe de Estado defende ser “essencial fomentar o regresso daqueles que, em resultado da crise, partiram rumo ao estrangeiro”.

“O país viu sair muitos dos seus jovens, a maioria dos quais altamente qualificados. É agora, enquanto os laços com Portugal ainda se mantêm vivos, que se deve promover o seu regresso, para que o seu talento e capacidades possam frutificar entre nós".

“Muitos jovens não têm emprego, outros têm emprego precário, são forçados as mudar suas opções de vida. Portugal que já enfrenta um grave problema de natalidade e desperdiça os seus jovens”, criticou.

Por outro lado, defende o Presidente, é importante “adaptar uma estratégia de captação de talentos”. Sendo Portugal “um país tolerante e inclusivo, onde cidadãos de todo o mundo podem trabalhar e viver de forma harmoniosa, importa apostar na integração das comunidades estrangeiras”.

Durante o seu discurso, foram várias as referências à tolerância que caracteriza o povo português e que deve permanecer como base de construção do futuro.

Combate à corrupção
Outro dos desafios apontados por Cavaco Silva é o combate eficaz e rigoroso à corrupção, crime que prejudica “o relacionamento entre os cidadãos e o Estado, diminuindo a confiança nas instituições e criando a falsa ideia” de falta de transparência no exercício das responsabilidades.

Além disso, afirma o chefe de Estado, “a corrupção põe em causa a coesão do tecido social”, um “importante activo” do país, graças ao qual atravessámos sem radicalismos “um período de inúmeros sacrifícios”.

O Presidente defende, neste contexto, a promoção de uma política de justiça “centrada nos interesses colectivos”. “Só assim Portugal poderá afirmar-se como um Estado de Direito consolidado”, sustenta, pedindo, por isso, “consensos político-partidários.”

Cavaco Silva aproveitou para criticar, nesta altura, o modo como os partidos têm reagido à reforma do Estado e defendeu uma administração pública feita de “funcionários qualificados e com dirigentes escolhidos exclusivamente pelo seu mérito”.

“Melhorar a eficiência do Estado é também contribuir para a qualidade da democracia e para o prestígio da classe política”, sublinhou Cavaco Silva.

A saúde mais do que uma questão financeira
Apesar do muito que se construiu “ao fim de 40 anos de democracia”, o Presidente diz que o país está “insatisfeito” e “ambiciona mais”, nomeadamente ao nível da educação e da saúde.

“A excelência na educação e a qualidade do Serviço Nacional de Saúde permanecem grandes desafios que devem mobilizar a Assembleia da República na próxima legislatura”. E avisou: “o Serviço Nacional de Saúde não pode ser encarado apenas do ponto de vista financeiro. É acima de tudo, um imperativo de justiça e de salvaguarda da dignidade humana”.

(Ainda) O mar e a segurança dos portugueses
Cavaco Silva voltou a sublinhar a importância do mar na economia de Portugal. Reconhecendo os avanços feitos nos últimos anos, reforçou a necessidade de haver, na próxima legislatura, uma política definida e coesa para o mar, “independentemente da tutela governativa”.

Noutro domínio, o Presidente chamou a atenção para a importância de garantir a segurança dos cidadãos face a ameaças terroristas. “Portugal é uma sociedade aberta e tolerante” e “para assim continuar tem de rejeitar com firmeza os extremistas e ser intransigente com a violência”, defendeu.

Portugal no centro do Mundo
O chefe de Estado terminou o seu discurso com uma visão geoestratégica do país. “Olhando para o mapa da Europa, Portugal surge como um país pequeno e periférico, mas as imagens enganam. Somos um país coeso. O mar projecta-nos e engradece-nos. No mapa do Mundo, Portugal ocupa um lugar central”, afirmou, para defender que, neste tempo global em que vivemos, “é para o mapa do Mundo que devemos olhar”.

Recordando o tempo dos Descobrimentos e a “vaga de democratização” iniciada por Portugal aquando do 25 de Abril de 1974, Cavaco Silva sublinha que foi nas alturas de maior turbulência que os portugueses foram “mais fortes e corajosos”.

“Foi a esperança de um tempo novo que deu motivo aos militares para avançar. É a esperança de um futuro melhor que nos deve juntar todos num futuro melhor, em nome de Portugal e dos portugueses”, concluiu, num derradeiro apelo ao compromisso.