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Secretas internacionais podem ter informações sobre Camarate

04 dez, 2013 • João Pedro Vitória

Tragédia ocorreu há 33 anos e os deputados já vão na 10ª comissão de inquérito. Investigações continuam.

Há 33 anos morriam o primeiro-ministro, Sá Carneiro, e o ministro da Defesa, Adelino Amaro da Costa, em circunstâncias que ainda hoje estão por esclarecer, quando a 4 de Dezembro de 1980 um pequeno avião caiu nos arredores de Lisboa. À 10ª comissão parlamentar de inquérito, há novas linhas de investigação que podem ajudar a obter respostas sobre o que aconteceu em Camarate.

A Renascença olha para o que os deputados na Assembleia da República apuraram até agora em mais de 40 audições. Os deputados acreditam que as secretas dos Estados Unidos, da Alemanha e do Reino Unido podem ter informações relevantes sobre a queda do avião que matou Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa e por isso, pela primeira vez em três décadas, Portugal pediu a colaboração destes países.

À porta fechada, ao longo das audições da 10ª comissão de inquérito à tragédia de Camarate, alguns testemunhos afirmaram que a STASI, a polícia secreta da República Democrática da Alemanha, tinha forte presença no nosso país no início dos anos 80: espiões e escutas ilegais.

O Parlamento já pediu para ouvir as respectivas embaixadas e decidiu suspender os trabalhos da comissão de inquérito até Março, que é quando espera obter os documentos solicitados.

A comissão de inquérito aguarda também que os tribunais autorizem o acesso às imagens da RTP emitidas naquele dia de 1980, a emissão em bruto, que a estação pública recusou, mas foram pedidos mais documentos.

Também para daqui a três meses é esperado um relatório das Finanças sobre o fundo militar de defesa do Ultramar, que em comissões anteriores foi apontado como a possível chave de Camarate.

Este ano veio a público um documento que punha a nu o conflito entre o Governo e os generais sobre a gestão daqueles dinheiros, num fundo com origem no Estado Novo e que não figurava no Orçamento do Estado: no Cessna, naquela noite de 1980, seguia um comunicado de imprensa que nunca chegou a ser distribuído. No documento o Governo acusava os chefes militares de não terem competência para fazer o que já tinham feito — legislar sobre os destinos do Fundo Militar de Defesa do Ultramar, que o ministro da Defesa, Amaro da Costa, estava a investigar.

Entretanto, foi ouvida pela primeira vez uma pessoa muito próxima do então primeiro-ministro, que não foi interrogada na altura pela investigação judicial. A secretária pessoal de Sá Carneiro, que era quem marcava as viagens, nunca fora ouvida pela Justiça nem pelo Parlamento até ao mês passado. E isto é relevante porque a escolha do avião em que Sá Carneiro e Amaro da Costa voariam para o Porto, em plena campanha presidencial, sempre foi objecto de dúvida.

Aos deputados, Isabel Veiga de Macedo revelou que o chefe do Governo previu até ao final da tarde daquele dia 4 de Dezembro que voaria num avião particular, de um financiador da campanha presidencial — a Refinaria Açúcar Reunidos — e que tinha uma reserva na TAP, só por segurança.

Contudo, Sá Carneiro viria a descartar essa aeronave, e acabaria por embarcar noutro Cessna, com Amaro da Costa.

Esta comissão de inquérito pediu ainda que fossem feitas novas análises às circunstâncias da morte de uma testemunha que morreu poucos dias antes de ser chamada a depor na primeira comissão de inquérito.

E o Instituto de Medicina Legal, que voltou a analisar amostras recolhidas há três décadas, concluiu que José Moreira, proprietário de um avião que já tinha sido utilizado por Amaro da Costa, terá morrido por intoxicação de monóxido de carbono e gás, mas de forma forçada, indiciada pela ruptura dos alvéolos pulmonares, desvalorizada na altura.

O actual presidente da Medicina Legal disse mesmo aos deputados que a investigação médico-legal feita naquele caso tinha deficiências e insuficiências difíceis de aceitar nos dias de hoje.

Os trabalhos da 10ª comissão parlamentar de inquérito à tragédia de Camarate estão suspensos, pelo menos até Março, à espera de documentos pedidos à Alemanha, ao Reino Unido e aos Estados Unidos.