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Refugiados. “Esta gente está a tentar salvar a sua vida”

27 ago, 2015 • André Rodrigues

Representante do ACNUR explica à Renascença que a solução para o drama não está na construção de muros ou na intervenção do exército, como quer a Hungria. “Estas pessoas fogem da guerra”.

Refugiados. “Esta gente está a tentar salvar a sua vida”
A cada dia, um novo recorde. Nas 48 horas de segunda e terça-feira, mais de 4.500 refugiados deram entrada em solo húngaro, num fluxo migratório sem precedentes desde a II Guerra Mundial e que parece estar longe, muito longe do fim.

Atravessaram a Macedónia e a Sérvia e procuram refúgio seguro no primeiro país da União Europeia que encontram. Chegam da Síria, do Iraque, do Afeganistão. Exaustos, com fome.

Na sociedade húngara, as opiniões dividem-se. Em declarações à Renascença, Ernö Simon, representante do Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) no país, fala de uma dualidade de sentimentos.

“O que nos preocupa não é apenas o discurso xenófobo dos políticos na Hungria, é também o sentimento generalizado de rejeição a estes refugiados que se constata diariamente nas ruas. Por outro lado, vemos centenas, milhares de voluntários disponíveis para ajudar estas pessoas, seja na fronteira com a Sérvia, seja até nas estações de comboios de Budapeste. Dão-lhes comida, água, cobertores, produtos de primeira necessidade para as crianças, assistência médica. Dão-lhes até informações sobre como aceder aos centros de registo, quais são os seus direitos. Esse é o desenvolvimento mais positivo no meio de tudo isto”, descreve.

Na fronteira da Hungria com a Sérvia, a tensão é constante. Na quarta-feira, a polícia usou gás lacrimogéneo junto ao posto fronteiriço de Roszke para conter um grupo de refugiados. E a polícia foi chamada a reforçar as fronteiras com mais de 2.100 efectivos.


Foto: Ziotan Balogh/EPA

O Governo admite que o envio de militares pode ser o passo seguinte – uma medida que Ernö Simon não tem dúvidas em classificar de ilegal.

“Ainda não é uma decisão final. É apenas uma ideia e não sabemos muito mais. De qualquer maneira, isto é muito mais delicado. Para tomar uma medida como esta, seria necessária uma alteração à Constituição da Hungria. De acordo com a lei fundamental do país, o uso do exército para travar uma situação destas é ilegal. Por outro lado, de acordo com as leis internacionais, o Governo húngaro não tem o direito de impedir quem quer que seja de apresentar um pedido de asilo. Por isso, todos os que entram pela fronteira com a Sérvia ou qualquer outra fronteira têm o direito a tratamento imparcial na concessão de asilo”, defende.

Enquanto isso, está prestes a ser concluído o muro de 175 quilómetros ao longo da fronteira com a Sérvia. Mas na opinião do responsável do ACNUR, nem isso conseguirá travar a entrada de refugiados.

“Metade do muro já foi erguida. Mas nós sabemos que estas pessoas que fogem da guerra na Síria, no Iraque, no Afeganistão... Elas vão continuar a chegar à Europa. Por isso, estes obstáculos nunca vão conseguir deter esta vaga. Esta gente está a tentar salvar a sua vida, a vida dos seus filhos e das suas famílias. Por isso, esta não é a solução para a Hungria e muito menos para a Europa”, contesta.


Foto: Ziotan Balogh/EPA

Chegados à Hungria, a viagem prossegue. A Europa que estes refugiados procuram tem dois nomes: Reino Unido e Alemanha.

Na quarta-feira à noite, em Genebra, o alto comissário das Nações Unidas para os refugiados, António Guterres, defendeu ser urgente a criação de centros de acolhimento e de triagem na União Europeia, de modo a responder ao fluxo dramático de migrantes e refugiados.

Guterres afirmou ainda que confia na capacidade da Europa para partilhar responsabilidades na resposta a este drama humanitário.