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Reportagem

Pós-Varoufakis. "Eles tinham medo dele. Talvez as negociações melhorem"

06 jul, 2015 • Catarina Fernandes Martins, em Atenas

Os gregos estão de novo à espera. Mas agora sentem que têm uma vitória – só não sabem de que tamanho.

Pós-Varoufakis. "Eles tinham medo dele. Talvez as negociações melhorem"
Depois de uma semana de manifestações e bancos fechados, os gregos disseram "não" à proposta dos credores internacionais e acordaram esta segunda-feira sem saber se os cenários avançados nos últimos dias pelos meios de comunicação – falta de medicamentos nas farmácias, de produtos alimentares nos supermercados e de dinheiro nos bancos – se concretizariam. Nas ruas, poucos duvidam de que o Governo e a troika chegarão a acordo.

Atenas está de novo à espera, sem saber o que pode acontecer nos próximos dias. Esta segunda-feira, as consequências visíveis do referendo da noite passada não foram as esperadas. As esplanadas continuam cheias, não falta comida nos supermercados, nem remédios nas farmácias. Logo pela manhã, uma surpresa: Yanis Varoufakis anunciava a sua demissão como ministro das Finanças, escrevendo no seu blogue que o fazia para facilitar as negociações entre o governo de Alexis Tsipras e a troika de credores internacionais.

Os gregos ouvidos pela Renascença não parecem muito incomodados com a saída de Varoufakis. Compreendem a demissão à luz da justificação dada pelo antigo ministro, o que parece indicar confiança num novo acordo. "Acho que é uma boa estratégia", diz Natasha, 29 anos, música.

"Eles tinham medo dele. Talvez agora as negociações sejam melhores", continua. Nikos, um produtor de mel de 35 anos, tem uma esperança semelhante: "Se a demissão de Varoufakis ajudar a chegar a um novo acordo, então está tudo bem."

Koutsouflakis, 77 anos, diz que nos últimos cinco anos perdeu cerca de 70% da reforma. Foi por isso que votou 'Não', diz. "Já não tenho medo de nada. Quando te cortam 70% da pensão já não há muito mais que possam levar", afirma este antigo médico à Renascença.

Limitações aos levantamentos bancários continuam a fazer parte do quotidiano na Grécia. Foto: Alexandros Vlachos/EPA

Koutsouflakis não tem dúvidas de que nos próximos dias haverá um acordo com a União Europeia. "Não acho que a Grécia vá sair do euro. A Zona Euro vai aceitar que a Grécia comece de novo. Olhe à sua volta: há pessoas que não têm o que comer e que procuram comida no lixo."

"É tudo muito confuso"
Mirto, uma analista financeira de 34 anos, diz que "votou 'Sim' com a cabeça e não com o coração". Ao contrário dos outros gregos com quem a Renascença falou esta segunda-feira, Mirto não está confiante num novo acordo favorável aos gregos. "Acho que agora temos de aceitar aquilo que nos derem. As novas medidas vão ser mesmo muito duras."

Katarina, 34, advogada, votou 'Não' e não faz ideia daquilo que vai acontecer. "Acho que não há nenhum cenário possível de prever", diz.

"É como se estivéssemos a um olhar para um daqueles espelhos que distorcem a nossa imagem. É tudo muito confuso", prossegue. Votou 'Não' para que "as escolhas sobre o futuro voltem a estar nas mãos dos gregos."

Katarina tem consciência das possíveis consequências do seu "Não", mas parece estar preparada para arriscar: "Se calhar, temos de perceber aquilo que conseguimos fazer sozinhos. Eu sei que o euro é a melhor solução, mas ninguém tem dinheiro… Por isso, não importa a moeda que usamos", conclui.
 
De novo à espera
Junto à praça Plastera, os gregos que tentavam levantar os 60 euros diários numa caixa multibanco já sem dinheiro sorriam, orgulhosos, ao revelarem que votaram 'Não' no referendo.

Quando lhes perguntávamos se estavam assustados com a possibilidade de os bancos continuarem fechados, respondiam sem perder o sorriso e de forma algo desafiante: "Os gregos já não têm dinheiro nos bancos de qualquer forma"; "Assustados? Não! Há coisas mais importantes do que os bancos".

Depois, muitos seguiam para a caixa multibanco mais próxima, onde esperavam oito a dez pessoas em fila. No final do dia, do multibanco da praça Plastera saíam, novamente, notas de 20 euros.

Já se sabe que os bancos vão continuar fechados até quarta-feira. Mas não se sabe mais nada. Parece que pouco mudou entre a semana que passou e o início desta.

Os gregos estão de novo à espera. Mas agora sentem que têm uma vitória – só não sabem de que tamanho.