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Populista, xenófobo e de extrema-direita? O britânico UKIP diz "não, não e não"

27 abr, 2015 • Vasco Gandra, em Bruxelas

Defendem um referendo para a saída do Reino Unido da UE, criticam Bruxelas e defendem o reenvio dos migrantes para África. São rotulados de populistas, xenófobos e de extrema-direita, mas afirmam-se "profundamente democráticos". Entrevista ao líder do UKIP no Parlamento Europeu, Roger Helmer.

Populista, xenófobo e de extrema-direita? O britânico UKIP diz "não, não e não"
Defendem um referendo para a saída do Reino Unido da UE, criticam as instituições europeias e defendem o reenvio dos migrantes para África. São rotulados de populistas, xenófobos e de extrema-direita, mas afirmam-se "profundamente democráticos". Em entrevista à Renascença, o líder do UKIP no Parlamento Europeu, Roger Helmer, define as posições do partido que pode baralhar as contas das eleições britânicas em Maio.

O UKIP (Partido da Independência do Reino Unido) mantém a exigência de realização de um referendo sobre a permanência do país na União Europeia. É a primeira prioridade do partido que concorre às eleições de 7 de Maio.

Se tiver peso no parlamento que vai sair das eleições de Maio, o partido eurocéptico vai exigir a realização da consulta no curto prazo, garante, em entrevista à Renascença, o líder do UKIP no Parlamento Europeu, Roger Helmer.

Helmer contesta ainda a adopção de políticas favoráveis à imigração. Sobre a crise no Mediterrâneo diz: "Deveríamos fazer como os australianos: recolher essas pessoas dos barcos, do mar, e reenviá-los para o sítio de onde vieram."

Muitos portugueses e europeus ouviram falar do UKIP, mas talvez não saibam bem porque é que o partido quer o Reino Unido fora da União Europeia. Por isso, antes de tudo, quero perguntar-lhe: porque é que o UKIP não acredita no projecto europeu?
Há duas grandes questões. Primeiro, a económica. Há economistas muito sérios no Reino Unido que calcularam o custo de pertencermos à UE em cerca de 10% a 11% do PIB. Há um peso morto que representa um enorme custo económico para qualquer país. Estaríamos muito melhor fora. Não só ao nível da nossa contribuição para o orçamento europeu. Também em relação ao custo da regulação (legislação comunitária), que é muito superior ao custo da nossa contribuição para o orçamento da UE, que custa dezenas de milhares de milhões de libras por ano.
Há ainda outro factor. Por exemplo, a política energética. A política energética europeia é um desastre. Está a levar a maior parte da actividade económica do sector para fora da Europa, levando consigo empregos e investimento. Foi o antigo comissário europeu da indústria que disse que estamos a cometer um massacre industrial na Europa.

E, depois, temos o euro. Felizmente, o Reino Unido não está no euro. Isto está a criar todos os problemas que pessoas como eu diziam, há 15, 16, 17 anos, que iam acontecer. E aconteceram.

A questão económica é muito importante, mas a outra questão é a democracia e o prestar contas em democracia. É claro que temos o Parlamento Europeu, mas ninguém imagina que é um verdadeiro parlamento que reflecte as opiniões dos cidadãos comuns através da Europa. Acreditamos apaixonadamente na democracia. Acreditamos que podemos ter uma Europa democrática. Mas só se for uma Europa de Estados-nação democráticos que cooperam e estabelecem relações comerciais entre eles. Não acreditamos que a democracia se constrói inventando estas instituições supranacionais que todos sabemos que não prestam contas e que também não têm em conta a opinião dos cidadãos.

É por isso que é tão importante para o UKIP a realização de um referendo sobre a saída do Reino Unido?
Penso que, em termos práticos, é impossível sair sem se fazer um referendo. Sabemos que a UE odeia referendos. Porque cada vez que obtém uma resposta errada, volta para as pessoas e diz: "Desculpem, mas estão errados. Têm que votar outra vez até termos a resposta certa que nós queremos". Vimos isso na Dinamarca, na Irlanda. Vimos isto com a Constituição Europeia. Com a Constituição não disseram "votem outra vez", decidiram mudar o nome e chamaram-lhe Tratado de Lisboa. Assim, já não precisamos de um referendo, não é? Ou seja, o que quero dizer é que os cidadãos rejeitam mais integração europeia, mas esta é-lhes imposta.

Como é que se pode negociar uma saída do Reino Unido da União?
Como negociamos uma saída? Há duas maneiras. A maneira simples, defendida por alguns dos meus colegas: votar uma lei no parlamento britânico, em Westminster, e revogar o Acto da Comunidade Europeia, de 1972. Mas concordo que seria uma ruptura. Uma forma menos radical é invocar o artigo 50 do Tratado de Lisboa, que prevê um mecanismo de saída de um Estado-membro e que também prevê uma negociação comercial favorável entre a UE e a parte que sai. Há um mecanismo, mas sabemos que este mecanismo foi inserido no Tratado de Lisboa apenas para sossegar os eurocépticos, dizendo-lhes "vocês deviam apreciar o tratado porque vos dá uma oportunidade de sair". Nunca ninguém, referindo-se ao tratado, pensaria que um país utilizaria o artigo 50 para sair. Mas está no tratado, assinámos o tratado e podemos invocar esse artigo.

O UKIP é apresentado na imprensa europeia como um partido populista, por vezes até de extrema-direita, por causa do seu discurso sobre imigração, das posições contra o casamento homossexual. Concorda? Como define o UKIP?
Nunca com esta expressão de "extrema-direita". Se "extrema-direita" significa alguma coisa, significa partidos associados a movimentos nazis que são profundamente antidemocráticos. Nós, em contrapartida, somos profundamente democráticos.

Disse "populista". "Populista" é uma palavra divertida, não é? Eu diria democrático. Diria que reflectimos os valores de sentido comum das pessoas normais. No caso da imigração, esqueça as acusações. Não queremos parar a imigração. O que queremos é uma política sensata, ordenada, baseada em números e nas qualificações, tal como fazem outros países no mundo. Costuma-se mencionar a Austrália, mas muitos países têm uma política de imigração ordenada, não têm as portas abertas.

O que quero sublinhar é que a política levada a cabo, hoje, enquanto membros da UE, é fundamentalmente discriminatória. Discriminamos a favor dos designados europeus. Discriminamos contra o resto do mundo, incluindo a Commonwealth, que integra muitas minorias étnicas. Portanto, aceitaríamos europeus longínquos e sem qualificações, ao mesmo tempo que nos inclinamos a recusar gente muito qualificada da Índia ou de outro sítio.

A tragédia do Mediterrâneo tem estado no centro da discussão europeia. Não lhe parece que precisamos de uma acção europeia comum para gerir este tipo de situações?
Não concordo que um grupo particular de 28 países tenha qualquer responsabilidade especial ou diferente da de outro país. É um facto de que se trata de um problema no Mediterrâneo e pesa mais sobre os países da região. Certamente que apoiamos uma acção humanitária para salvar os que são arrastados. Qualquer pessoa decente apoia isso. O que não aceitamos é que seja dado o direito automático de ficar na Europa a todos os refugiados ou imigrantes retirados do Mediterrâneo. Esse é o problema: salvamos muita gente, levamo-la para a Itália e outros países europeus, mas não há nenhuma perspectiva realista de irem para outro lado. Acho que deveríamos fazer como os australianos: recolher essas pessoas dos barcos, do mar, e reenviá-los para o sítio de onde vieram.

A partir do momento em que entramos nessa política e dizemos que devemos ter compaixão destas pessoas e deixá-las entrar na Europa, estamos a enviar um sinal a milhões de pessoas através de África e no Médio Oriente, estamos a dizer-lhes: "O que devem fazer é pagar a um traficante, atravessar de barco o Mediterrâneo e têm um lugar garantido na Europa". Em vez de milhares, teríamos milhões de imigrantes. Pode revelar menos compaixão, mas deixá-los na Europa só vai exacerbar o problema.

Vamos centrar-nos na campanha eleitoral no Reino Unido. Quais são as prioridades do UKIP se for governo?
A primeira coisa em que vamos insistir, se tivermos uma posição de influência no próximo parlamento, é que só apoiaremos um partido no governo se obtivermos o firme compromisso de realização de um referendo, no curto prazo. Por outras palavras, não aceitaremos uma promessa de referendo dentro de cinco, dez ou mesmo dois anos.

Queremos um referendo nos próximos meses e queremos que seja um referendo justo, que seja uma campanha equilibrada. E há outra coisa muito importante para nós: é que isto é um referendo sobre o futuro do nosso país e, por isso, pensamos que só os cidadãos britânicos devem poder votar. Sei que noutras eleições os cidadãos europeus podem votar. Mas, tratando-se de um voto sobre o futuro do Reino Unido, é absolutamente fundamental que sejam apenas os cidadãos do Reino Unido a votar.