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Guiné Equatorial na CPLP. Entre os direitos humanos e o factor petróleo

21 jul, 2014

Ferro Rodrigues alerta para os "sérios problemas de direitos humanos" no país. Martins da Cruz, antigo MNE, defende a adesão: a CPLP poderá vir a deter 20% da produção mundial de petróleo.

Guiné Equatorial na CPLP. Entre os direitos humanos e o factor petróleo

Enquanto o Presidente da República se remete, para já, ao silêncio, são várias as personalidades que se têm oposto a que o regime de Teodoro Obiang faça parte da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Mas também há quem a defenda.

Ferro Rodrigues, vice-presidente da Assembleia da República, foi um dos signatários de uma carta endereçada aos chefes de Estado e Governo dos países da CPLP a contestar a adesão da Guiné Equatorial, que deverá ser aprovada na quinta-feira, na cimeira da organização, em Díli, Timor-Leste.

À Renascença, Ferro Rodrigues afirma que não há razões para que esta integração aconteça. A começar por "uma questão básica" que boa parte do país não cumpre: falar português.

A Assembleia Nacional da Guiné Equatorial aprovou o português como língua oficial do país, a par do espanhol e do francês (oficializado em 1997), em 2011, mas a língua portuguesa ainda não é ensinada nas escolas. O governo de Obiang promete que português será ensinado em breve nas escolas primárias.

"Em segundo lugar", diz o histórico socialista", "há sérios problemas de direitos humanos e de transparência nesse país e que deviam ter sido tomados em conta".

Classificado como "ditadura" por vários relatórios internacionais, o país é governado há mais de três décadas por Teodoro Obiang. Várias organizações de direitos humanos lembram que o país pratica a pena de morte, mas também há relatos de prática de tortura e de outros condicionamentos de liberdades civis e políticas.

Em Fevereiro, o Presidente da Guiné Equatorial assinou uma resolução que suspende a pena de morte, uma das condições impostas pela CPLP para a adesão, mas a legislação em vigor mantém a pena capital.

Para que serve a CPLP?
Para Ferro Rodrigues, há razões económicas ou geoestratégicas que podem explicar a provável adesão.

"Esta entrada vai mudar a natureza da CPLP. A comunidade tinha uma ideia de valores e de língua portuguesa e agora vai passar a ter como maiores determinantes os interesses financeiros, petrolíferos e económicos", observa.

Interesses que Ferro considera "importantes, mas que não podem pôr em causa os valores de um país ou de uma organização de países".

O factor petróleo
Já para o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, António Martins da Cruz, que defende a entrada da Guiné Equatorial na CPLP, as questões económicas não são um pormenor e devem ser consideradas como uma vantagem.

"Os países da CPLP, incluindo a Guiné Equatorial, produzem neste momento 7% do petróleo e do gás que se produz no mundo. Daqui a 20 anos, provavelmente a produção de petróleo e gás da CPLP, incluindo a Guiné Equatorial, atingirá os 20% da produção mundial, tanto quanto produz agora o Médio Oriente", diz à Renascença.

Em resposta aos que acham que há um problema de direitos humanos, Martins da Cruz argumenta:  "Entre a Guiné Equatorial e o que se sucedeu nos últimos anos na Guiné Bissau, que se transformou num ‘narco-Estado’, e onde o Presidente da República foi assassinado à catanada na casa dele, em frente da família, não vejo qual é a diferença. E não vejo essas pessoas a preocupadas com a Guiné-Bissau".

"Se a França não levanta nenhuma objecção à presença da Guiné Equatorial na comunidade de países de língua francesa, por que é que Portugal há-de levantar este problema?", questiona.

Martins da Cruz salienta ainda que a eventual entrada da Guiné Equatorial na CPLP pode abrir portas às relações com outros países geoestratégicos, tais como a Namíbia, a Índia ou o Japão, que já mostraram interesse em fazer parte da comunidade.