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Comandante Falé Borges: Havia aviso para evitar céus da Ucrânia

17 jul, 2014 • José Bastos

"Não há risco para a TAP", que não sobrevoa a Ucrânia, garante o comandante de linha aérea. Espaço aéreo ucraniano é "perigoso para a aviação comercial".

Comandante Falé Borges: Havia aviso para evitar céus da Ucrânia

Mesmo voando para Moscovo, a TAP não tem rotas no espaço aéreo ucraniano. "Os aviões portugueses não utilizam sequer pistas da Ucrânia como alternativas de emergência", afirma à Renascença o comandante de linha aérea Falé Borges, que afasta o risco de um incidente idêntico ao voo MH17 - que, esta quinta-feira, caiu na Ucrânia e matou pelo menos 295 pessoas - envolvendo um avião de bandeira portuguesa.

Sendo prematura qualquer especulação sobre as causas da queda do Boeing 777, Falé Borges lembra existirem recomendações para a aviação civil evitar o espaço aéreo ucraniano. O piloto do Airbus em que o Papa Bento XVI viajou do Porto para Roma em 2010 sublinha que a Ucrânia é "potencialmente perigosa para a aviação comercial".

Com os dados disponíveis – ainda escassos e alguns contraditórios – que protocolo de controlo aéreo terá sido – se é que foi - desrespeitado?
Existem, de facto, protocolos para evitar acidentes e ocorrências deste tipo. O avião terá sido, aparentemente, abatido no espaço aéreo ucraniano. O que é aplicável na Europa e no resto do mundo, porque obedece às mesmas regras da ICAO – organização da aviação civil internacional – é que, em operações normais, os diferentes estados fazem a gestão do espaço aéreo em coordenação com as entidades militares. O objectivo dessa colaboração é o de que, quando existem áreas de utilização do espaço aéreo definidas pelos militares, o que faz o ATC – órgão de gestão civil do espaço aéreo – é separar os aviões civis dessas áreas que são, ou podem ser, potencialmente perigosas para a aviação comercial. Essa separação de tráfego aéreo civil e militar é feita – e posso dar o exemplo de Portugal – acrescentando cinco milhas ao desenho da área sob coordenação militar, ou seja algo como oito quilómetros de exclusão de segurança. Mesmo em termos de corredores aéreos – o espaço aéreo tem "desenhadas" várias linhas, os chamados corredores – existem "buffers" de segurança que vão de cinco a dez milhas (de oito a, mais ou menos, 16, 17 quilómetros). São áreas restritas de circulação para impedir o convívio, ou aproximação, dos dois tráfegos aéreos: o civil e o militar.

Mas numa zona de instabilidade, de conflito, onde aviões militares já foram abatidos a menor altitude que a usada na aviação civil, não havia razão para um redesenho de rotas civis em nome da segurança?
O quadro de regras em vigor, neste momento, é composto pelas informações do Eurocontrol, o organismo de gestão do tráfego aéreo para operadores europeus, recomendando a não utilização e sobrevoo do espaço aéreo ucraniano. Tenho também informações que a própria FAA (Federal Aviation Administration), dos Estados Unidos, defende a mesma política de não sobrevoo do espaço aéreo ucraniano. As razões são as mesmas: é considerado um espaço aéreo potencialmente perigoso para a aviação civil. De modo que para evitar esse risco não há sobrevoos dessa área.

Mas era um conselho, não uma proibição?
É uma recomendação. A proibição deverá ser da responsabilidade da autoridade nacional [de aviação civil] ou do próprio operador [companhia].

Há informações de que na mesma área do acidente com o voo MH17 um caça Sukhoy terá sido abatido pouco tempo antes. Era claramente uma área a evitar pela aviação civil?
Concordo. Deveria ser obviamente evitada pela aviação civil. Não dispomos ainda de dados rigorosos para chegar a conclusões. Só mais tarde todas as variáveis serão ponderadas. Os elementos disponíveis indicam que o avião fazia a rota Amesterdão-Kuala Lumpur e, por qualquer motivo, surgiu nesse espaço. Essas razões só mais tarde serão apuradas. As variáveis podem ser múltiplas e não todas, necessariamente, lineares. Poderá estar o piloto do avião a desviar-se de uma frente meteorológica, por exemplo, e entrar nessa área de sobrevoo. Pode ter sido o controlo do espaço aéreo a definir uma alteração de rota dando instrução para ligações directas do ponto A para o ponto B, saindo dos corredores aéreos previamente definidos por um conjunto de múltiplas variáveis. Portanto, é ainda muito prematuro avançar com explicações sobre o problema que terá ocorrido e que justifica a presença do avião na área em que foi, alegadamente, atingido. É muito cedo para fazer essa avaliação e avançar com causas.

O avião terá sido atingido a mais de dez mil metros de altitude?
Creio que foi a uma altitude considerável, no nível de voo 3.3.0. Portanto, 33 mil pés, aproximadamente dez mil metros de altitude.

A TAP voa para Moscovo atravessando, entre outros, o espaço aéreo da Polónia, Bielorrússia e Rússia. Corre algum risco do tipo do voo MH17?
Não. Não existe nenhum risco desse tipo. Os aviões portugueses da TAP não sobrevoam o espaço aéreo ucraniano. Não utilizam sequer os aeroportos da Ucrânia como pistas alternativas, quer de rota quer de destino de emergência. De modo que esse risco não existe.