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Pode uma bolha imobiliária rebentar em Portugal?

06 mar, 2012 • Mara Dionísio e Teresa Abecassis

Mais de 6.900 famílias e promotores imobiliários viram-se forçados a devolver as casas aos bancos em 2011. Os bancos apertam cada vez mais o acesso ao crédito, mas vendem com financiamento os imóveis que têm em carteira. “Concorrência desleal”, dizem alguns agentes do sector, que temem uma ruptura no mercado.

Pode uma bolha imobiliária rebentar em Portugal?
No ano passado, por dia, cerca de 10 empresas de construção fecharam portas. As vendas de imóveis estão cada vez mais difíceis. Em 2011, venderam-se 194 mil casas, menos 7,2% do que no ano anterior. E há ainda quem já não consiga dinheiro para pagar o crédito à habitação. O retrato de um país onde a construção e o imobiliário estão em queda livre.
O presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP) vai directo ao assunto. "Sempre disse que não existia - e não existe - uma bolha imobiliária em Portugal, mas estão ser criadas algumas condições que podem ser problemáticas", refere Luís Lima.

Os construtores partilham da mesma opinião e consideram que a forma de actuar da banca está a desvirtuar o mercado. "O que nos preocupa é uma forma de estar da banca pouco clarividente", começa por dizer o presidente da Associação de Empresas de Construção e Obras Públicas (AECOPS), Ricardo Pedrosa Gomes.

"Quando [a banca] entra numa situação em que reduz drasticamente o valor do imóveis para os colocar no mercado rapidamente e permite acesso a crédito, desde que sejam deles, entra numa concorrência desleal com promotores que estão ao lado. E, seguramente, está é a acelerar que esses mesmos promotores venham a ser os próximos incumprimentos”, alerta Ricardo Pedrosa Gomes.

“É um ciclo vicioso que acaba por degradar o valor da propriedade, que não é real e é perigoso”, acrescenta o presidente da AECOPS.

O cerco às famílias
Com bolha ou sem bolha, o que é certo é que a crise de que tanto se fala está a apertar o cerco às famílias, que deixam de conseguir suportar tanta despesa.

Em 2011, foram 6.900 as famílias e promotores imobiliários que se viram forçados a devolver as casas aos bancos. Segundo a APEMIP, é uma subida de 17,9% face aos 5.900 imóveis devolvidos em 2010.

Mas as circunstâncias em que as casas são devolvidas colocam algumas dúvidas. O grande problema de devolver o imóvel ao banco, explica Natália Nunes, do gabinete de Sobreendividado da DECO, “ tem que ver com o facto de ser necessário fazer uma avaliação do imóvel hoje, avaliação essa que é feita pela própria instituição que concedeu crédito, com a qual se está agora a negociar a entrega do imóvel e vai ser essa avaliação que vai ser confrontada com o valor em dívida”.

Ora, diz Natália Nunes, "como muitas das pessoas compraram casa há cinco ou seis anos a esta parte, significa que ainda não abateram nada no capital". "Muitas vezes, quando se confronta o valor em dívida com o valor actual, aquilo que se verifica é que o valor do imóvel não é suficiente para liquidar o valor em dívida", precisa a a especialista da DECO. 

Quer isso dizer que "as famílias ficam sem casa porque as entregam aos bancos e ficam ainda a suportar a diferença entre a avaliação e o valor do crédito", prossegue Natália Nunes. "E [são] valores muitas vezes significativos. Muitas vezes, estamos a falar de 20 mil, 30 mil euros, o que é um valor bastante significativo para pessoas que já estão em dificuldades económicas”, conclui.