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Passos falhou na polémica do "piegas"? A palavra aos portugueses

08 fev, 2012 • Matilde Torres Pereira

Diz quem sabe - o dicionário - que "piegas" equivale a "quem é muito sensível ou assustadiço". Revela também que é um termo de "origem obscura" e que tem valor "depreciativo". A Renascença andou pela baixa de Lisboa para descobrir se a rua atribui o mesmo valor depreciativo às declarações de Passos Coelho, que apelou aos portugueses para serem "menos piegas".

Passos falhou na polémica do "piegas"? A palavra aos portugueses

Caso tenha mesmo "origem obscura", tal como aponta o dicionário, "piegas" saiu das sombras. O termo adoptado pelo primeiro-ministro para apelar a portugueses mais exigentes e menos complacentes continua a gerar polémica e, a atender ao que a Renascença registou nas ruas de Lisboa, a delicadeza do chefe de Governo não saiu particularmente beneficiada. Há ainda casos que ficam a meio caminho - há quem explique que começou por criticar e depois acabou a encontrar "sentido" no apelo de Passos.

É o caso de Carolina, jornalista de 40 anos que prefere não revelar o apelido. Conta que, num primeiro momento, foi mais cáustica quando ouviu o que o chefe de Governo disse. Mas depois recuou.

“Trabalho num jornal e a minha colega fez um comentário acerca disso. O meu primeiro comentário foi: ‘Se eu tivesse a vida dele, também não seria piegas’”, começa por dizer.

“Só que depois fui ler a reportagem e achei que, dentro daquele contexto, o que ele disse fez todo o sentido. Ele estava a falar para miúdos numa escola – e sim, temos de deixar de ser piegas, deixar de nos queixar e temos de trabalhar mais. Não sou fã do Pedro Passos Coelho, só que tem de haver algum consenso e acho que ele teve algum nexo naquilo que disse”, sustenta Carolina. 

Jorge Carvalho, jurista de 46 anos, não subscreve. “Isso é uma autêntica tontice. Estão a tirar os direitos às pessoas e é com toda a razão que as pessoas se queixam”, defende.

Depois de ser interpelado pela Renascença quando descia a Rua Garrett ao início da noite, Jorge Carvalho até soltou uma gargalhada quando ouviu a pergunta. “Não é uma questão de pieguice, é uma questão de direitos que foram conseguidos com a revolução e que têm estado constantemente a ser retirados. Não pode, de maneira, alguma ser sinónimo de piegas quando as pessoas fazem alguma coisa ou se queixam de alguma coisa”, argumenta o jurista.

"Piegas é um termo que não se deve associar aos portugueses"
Ana Margarida, 49 anos, bancária nos Estado Unidos, está de férias em Portugal e passeia no Chiado com a família inteira. Não está a par do discurso de Passos Coelho, mas o marido faz uma síntese e Ana Margarida até se ri.

“Mas quando é que os portugueses foram piegas?”, questiona. “Os portugueses nunca foram piegas. Foram sempre muito trabalhadores e muito merecedores de tudo o que está disponível e de todas as regalias que nós temos. 'Piegas' é um termo que não se deve associar aos portugueses”, refere Ana Margarida. “As medidas todas que se estão a implementar em Portugal dão razão para as pessoas se queixarem - mas não é serem piegas”, sublinha.
 
Um pouco mais à frente, João, um ilusionista com 25 anos de idade que também prefere não revelar o apelido, considera que os portugueses devem trabalhar mais, mas critica a escolha de palavras do primeiro-ministro. "Trabalhar mais? Sim. Acho que os portugueses deviam mesmo trabalhar mais. [Já] 'piegas' considero um termo um bocado lamechas."

Numa das esquinas da Rua Nova do Almada, António, estudante com 24 anos, prefere "ocupar o tempo com assuntos mais sérios". “Como costumam dizer”, diz, “devemos ocupar o nosso tempo com coisas úteis e devemos usar o nosso tempo de forma interessante e acho que há pessoas [Passos Coelho] que simplesmente não merecem o nosso tempo”, afirma.

"Devia ser mais delicado"
Diante de uma loja de gelados, Frederico Belo, estudante de 21 anos, conversa com uma amiga, Ana Borges, de 23 anos, trabalhadora que não especifica o ramo. Frederico até concorda “em certa parte” com as palavras do primeiro-ministro. “Acho que nesta altura são necessários alguns esforços. Percebo o lado das pessoas que se queixam, mas acho que nesta altura se tem de pedir um esforço a cada um. Percebo perfeitamente que não haja tolerância de ponto no Carnaval”, afirma.

Ana apressa-se a rematar: “Claro que vai fazer falta esse feriado, mas percebo perfeitamente e estamos numa altura em que temos é que trabalhar, para que o país ande para a frente”.

E o termos “piegas”? “Foi um bocadinho agressivo”, considera Ana.” Se as pessoas já estão irritadas e contrariadas, não é a melhor maneira de chegar às pessoas. É a forma como disse. Devia ser mais delicado."