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"Milhões de livros escolares estão a ir para o lixo", muitos à margem da lei

31 ago, 2015

Manuais devem ter um período de vigência de seis anos mas, pelo terceiro ano consecutivo, as escolas adoptaram livros novos, acusa o Movimento Reutilizar. Estabelecimentos de ensino negam irregularidades.

"Milhões de livros escolares estão a ir para o lixo", muitos à margem da lei

Às portas de novo ano lectivo, pais e Movimento Reutilizar acusam escolas e professores de violarem a lei que define que os livros escolares devem ter um período de vigência de seis anos.

As queixas são muitas e vão chegar ao provedor de Justiça no dia 15 de Setembro, altura em que também será entregue um abaixo-assinado que visa a criação de um banco de livros em cada escola.

Pelo terceiro ano consecutivo as escolas adoptaram manuais escolares novos por causa da entrada em vigor das metas curriculares aprovadas pelo ministro da Educação, Nuno Crato.

Novos livros representam mais despesa para as famílias que não podem aproveitar os manuais de irmãos para irmãos, de amigos ou dos bancos de livros.

Em declarações à Renascença, Henrique Cunha, responsável pela Reutilizar - Movimento pela reutilização de livros escolares, afirma que a adopção de novos manuais é ilegal e explica porquê.

“Ilegalmente, uma vez que as metas curriculares não exigem novos livros, as escolas não estão a aceitar os livros anteriores às metas curriculares. Mais grave ainda, devido a essa adopção pelo código ISBN, há escolas que não estão a aceitar o livro igual do ano anterior que, por ter um código ISBN diferente significa que foi, eventualmente, repaginado. Quer dizer, por exemplo, que o exercício em vez de estar na página 17 está na página 19."

Henrique Cunha diz que, por isso, "estão a ir milhões de livros para o lixo". Critica ainda a disparidade de critérios numa mesma escola e apresenta casos concretos.

“Nós temos denuncias que dizem, claramente, que o professor de Português aceita o manual anterior e que o professor de Matemática não aceita o manual anterior. Em que é que ficamos? Como é possível esta medida ser tão discricionária, como é que não há uma autoridade que se imponha a esta disparidade de critérios”, questiona o responsável do Movimento Reutilizar.

No próximo ano lectivo há novos livros para a maioria das disciplinas do 9.º e do 12.º anos. No 10.º ano também há livros novos para Física e Química, Português e para as Matemáticas.

O Movimento Reutilizar quer acabar com  tanta mudança ao mesmo tempo que luta pela criação de um banco de empréstimo em cada escola, adoptando um parecer do Conselho Nacional de Educação. O manifesto já reuniu mais de cinco mil assinaturas para acabar com o isolamento de Portugal nesta matéria.

“Estamos isolados em toda a União Europeia como único país que não tem um sistema organizado na escola para reutilizar os livros. Não faz nenhum sentido que a escola que ensina a separar lixo, que não ensine antes disso a reutilizar os próprios livros”, lamenta Henrique Cunha.

"As escolas limitam-se a cumprir a lei"
Já o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE) garante que a lei está ser cumprida. Manuel Pereira argumenta que a adopção dos manuais pelo seu número de identificação promove a igualdade entre todos os alunos.

“As escolas limitam-se a cumprir a lei. Do nosso ponto de vista, devia haver um acordo entre o Ministério da Educação e das editoras no sentido que os manuais tivessem outro tipo de construção gráfica e que pudessem ser utilizados por mais tempo”, defende.

“O que acontece é que, por uma ou por outra razão, os manuais em cada ano são alterados e, por uma questão de equidade e de igualdade, as escolas e os próprios pais, às vezes, sentem-se um pouco confusos quando recebem um livro com a capa diferente – não sabemos se o interior está completamente modificado ou não – ou então com um ID ligeiramente diferente. Isso tem a ver com o receio que as escolas, às vezes, têm de não estar a garantir a igualdade dos alunos”, refere Manuel Pereira.

Também ouvido pela Renascença, o presidente da Confederação Nacional de Pais (Confap), Jorge Ascenção, aponta o dedo ao Governo e ao modelo educativo que exige demasiados livros.

"A alteração, por vezes, antecipada desse período é responsabilidade de um qualquer Governo, de um qualquer ministro, que altera programas e altera metas e obriga a fazer a renovação dos manuais. É também uma consequência do modelo de aprendizagem de ensino que nós temos, que é um que está formatado para seguirmos um determinado manual", afirma Jorge Ascenção.

[notícia actualizada às 19h48]