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Plano para erradicar rato-preto das Berlengas divide especialistas

30 jul, 2015

Defensores do roedor lançaram uma petição. Defendem que não se faz ciência baseada em argumentos preventivos.

Plano para erradicar rato-preto das Berlengas divide especialistas

Há um rato que está a pôr biólogos e cientistas em diferentes lados de uma discussão que tem como epicentro a ilha da Berlenga, ao largo de Peniche.

O rato-preto, que habita a ilha, vai ser erradicado porque poderá, no futuro, revelar-se uma ameaça para as aves marinhas que ali nidificam. A decisão surge no âmbito do projecto LIFE Berlengas, promovido pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), mas os argumentos não convencem dezenas de especialistas, que pedem a suspensão da iniciativa com direito a financiamento europeu.

Em declarações à Renascença, Pedro Geraldes, o técnico do projecto LIFE Berlengas, alega que a conservação das plantas endémicas e das aves marinhas que habitam a Berlenga obriga a exterminar o pequeno roedor.

“O rato-preto está classificado como uma das 100 piores espécies invasoras do mundo. Não há uma avaliação científica que suponha que, na Berlenga, este animal terá um comportamento diferente do que tem em todo o resto do mundo. Além disso, há vários indícios do seu impacto nas Berlengas. Já foram vistos a predar aves”, explica Pedro Geraldes.

A Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves entende que é necessário actuar “de forma preventiva” para “evitar a extinção” de aves marinhas como as cagarras, que têm na Berlenga o único local da costa portuguesa onde nidificam. Contudo, nos últimos 20 anos a população de cagarras aumentou cinco vezes.

O biólogo Raúl Santos, antigo técnico da Reserva Natural das Berlengas e um dos promotores de uma petição que pede a suspensão da iniciativa de erradicação do rato-preto, argumenta, em declarações à Renascença, que não se faz ciência baseada em argumentos preventivos.

“Não há nenhum trabalho credível científico, não há nenhum trabalho feito mesmo, que comprove que há uma interacção negativa do rato-preto com qualquer espécie de ave. Pelo contrário, há um trabalho da SPEA, de 2013, que diz, claramente, que não foi observada predação. É quase ilibar o rato. Não se pode generalizar o que se passou noutros sítios e dizer ‘se aconteceu no meio do Pacífico, ou seja onde for, se calhar também está a acontecer na Berlenga, então é melhor matarmos já’. Isto não faz sentido nenhum”, defende Raúl Santos. 

Biólogos, catedráticos e jubilados na área argumentam que o pequeno rato-preto está integrado no ecossistema da Berlenga. Acrescentam que aquele rato, isolado na ilha, tem elevado interesse científico para o estudo da genética e dos mecanismos de evolução das espécies.

A Reserva Natural das Berlengas é considerada Reserva Mundial da Biosfera da UNESCO e estima-se que visitem anualmente a ilha cerca de 40 mil pessoas.