Emissão Renascença | Ouvir Online

Despejos no Porto. “Estou a pagar pelo meu erro, mas a minha família não tem culpa”

23 jun, 2015 • Cristina Branco

O alegado envolvimento em casos de tráfico de droga levou a autarquia do Porto a querer despejar 41 famílias das suas casas. A Renascença foi conhecer o caso de uma mãe que recebeu a notificação e ouviu a explicação da autarquia.

Despejos no Porto. “Estou a pagar pelo meu erro, mas a minha família não tem culpa”
A Câmara do Porto diz não tolerar o alegado envolvimento de alguns habitantes dos bairros sociais de Lordelo do Ouro em situações de tráfico de droga. O crime pode ter sido cometido apenas por um membro do alegado familiar, mas, a confirmar-se, o despejo é para toda a família, incluindo menores.

Patrícia Rodrigues é uma das que recebeu a notificação. Cumpre pena de prisão suspensa por dois anos e pode ficar sem tecto. Ela, o filho de 15 anos e os três outros familiares que com ela moram: uma irmã de 46 anos e dois sobrinhos, de 23.

“Há uns anos tive um processo por tráfico, tráfico que não era muito pesado, tanto que apanhei dois anos de pena suspensa. É mesmo por causa disso”, conta Patrícia à Renascença, sentada na mesa da exígua sala, praticamente às escuras.

Recebeu, em seu nome e de um dos sobrinhos, a notificação de despejo da Câmara Municipal do Porto, por tráfico de droga, por utilizar a habitação social como local de negócio. A carta chegou há cerca de um mês, com dez dias para contestar e 60 para deixar a casa.

Por conselho do advogado que está a apoiar alguns dos 41 casos de famílias notificadas, Patrícia contestou a notificação de despejo e pediu à Câmara para sair apenas ela, a responsável pela situação.

“A minha irmã não tem culpa, nem o meu filho nem um dos meus sobrinhos. O outro sobrinho também está com pena suspensa no mesmo processo, mas sofreu um acidente e está dependente da mãe e de terceiros”, explica. “Não têm que pagar pelo meu erro”, acrescenta.

A casa onde vivem, num dos blocos da Pasteleira Velha, em Lordelo do Ouro, ao lado de Serralves, tem três quartos para quatro adultos e um jovem. Foi onde Patrícia nasceu há 38 anos e que está na família há 46 anos, primeiro com os pais, depois com os filhos.

A confirmar-se o despejo, Patrícia sai com uma mão à frente e outra atrás, sem trabalho e sem esperança. Pede, por isso, uma segunda oportunidade: “Errei, acho que estou a pagar pelo meu erro, que não foi tão grave assim. Se fosse, eu não estaria aqui, estaria detida. Peço ao presidente [da Câmara] uma segunda oportunidade, peço-lhe para perdoar.”

Sem ter ainda resposta da Câmara, Patrícia não sabe se sai sozinha ou se terão de sair as cinco pessoas que vivem na casa. O prazo para ir para a rua está em contagem decrescente.

Tolerância zero contra a droga
O vereador Manuel Pizarro diz à Renascença que compreende a situação das famílias, mas garante que a autarquia está firme na sua decisão. “Quero ser claro: nós não vamos tolerar que as casas da Câmara sejam utilizadas para tráfico de droga, porque isso significa deixar desprotegidas todas as pessoas que, por razões económicas, têm de viver nos bairros e não podem ser obrigadas a conviver com o tráfico de droga”, explica.

Manuel Pizarro considera que, “se é verdade que temos de ter preocupações com a família das pessoas que traficam droga, não é menos verdade que temos a obrigação de proteger a comunidade do tráfico de droga, que é um crime que causa graves consequências”.

O vereador confirma que todas as famílias notificadas responderam ao processo “no período de audiência prévia”, estando agora a Câmara “a analisar os argumentos” expostos.

A decisão final levará ainda em consideração “a força das evidências que fomos reunindo ao longo do tempo e que nos indica que aquelas casas são usadas para tráfico de droga.”