Tempo
|

Retirada de calçada portuguesa gera críticas em Olhão

20 abr, 2014

Moradores falam numa "ofensa ao património". Autarquia nega que a operação esteja a retirar identidade à cidade.

Retirada de calçada portuguesa gera críticas em Olhão

Moradores de Olhão estão indignados com a retirada de calçada portuguesa nos bairros históricos da Barreta e do Levante, ao abrigo de uma intervenção da câmara, que acusam de ofensa ao património.
 
As obras abrangem os largos João da Carma, do Gaibeu, da Fábrica e do Carolas e a praça Patrão Joaquim Lopes, onde grande parte da calçada está a ser substituída por lajes para diferenciar o piso dos locais que vão integrar a rota das lendas, disse à agência Lusa o presidente da autarquia, António Pina.
 
Fernando Cabrita é um dos moradores que discordam da intervenção, que classifica como "uma ofensa ao património", afirmando não compreender por que razão se decidiu substituir a calçada por outro material que não apresenta qualquer mais-valia e que se vai degradar, tal como acontece com a calçada, se não for devidamente tratado. 
 
"Não havia razão nenhuma razão para retirar a calçada, é um capricho", resume o advogado, lamentando a sua substituição por lajes, que são "apátridas", por existirem em "todo o lado", e se degradam facilmente, como aconteceu, por exemplo, junto ao auditório municipal e ao parque de estacionamento do Levante, onde há poucos anos foram colocadas lajes. 
 
António Pina nega que a operação esteja a retirar identidade à cidade, sublinhando que apenas em 10% da área daqueles dois bairros foi retirada calçada e que a ideia é associar cada largo a uma lenda de Olhão, tal como a lenda da Floripes e do Menino dos Olhos Grandes. 
 
"Trata-se de um projecto em que o arquitecto entendeu provocar esta diferença, através da diferenciação do piso, para que quem chegue lá perceba o que ali há de novo", argumentou o autarca (PS), acrescentando que originalmente o piso daqueles dois bairros era de terra batida. 
 
Fernando Cabrita defende, por seu turno, que se a ideia era diferenciar aquele caminho, poderiam ter sido usadas as próprias pedras de calçada para criar letras ou inscrições no piso, que indicassem a rota, já que essa é uma das "virtudes" da calçada portuguesa. 
 
"Ter o chão diferenciado não serve de nada, as coisas distinguem-se com sinalética", observa, sublinhando que é mais fácil repor pedras de calçada do que lajes e que esta é permeável, permitindo o escoamento de água, ao contrário das lajes. 
 
Opinião semelhante tem António João Bento, que vive no concelho de Olhão e é um acérrimo defensor da calçada portuguesa, piso que escolheu para os jardins e parte do interior da sua casa. 
 
O pugilista sugere que havia hipóteses mais baratas para criar uma rota de ligação entre os largos, como, por exemplo, a colocação de pedras de calçada em forma de setas, a indicar o caminho. 
 
"Em vez de preservarem o que é nosso, inventam e vão copiar coisas a outros países", lamenta o pugilista, conhecido como Bento Algarvio, opinando que a operação deve ter como base um negócio, para "servir os interesses de alguém".  
 
Já Manuel Batista, apesar de não gostar da parte estética da intervenção, por considerar que a combinação das lajes com a calçada está "mal feita", admite que alguns largos foram valorizados, pois estavam degradados.    
Contudo, considera que o material usado devia "identificar-se mais com a cultura portuguesa" e não ser uma cópia do pavimento que existe noutros locais e que não tem nada de português. 
 
António Pina recusa que o trabalho esteja mal feito, explicando que os remates entre a calçada e as lajes são propositados e fazem parte da visão do arquitecto que criou o projecto. 
 
A intervenção, executada ao abrigo de apoios comunitários, deverá estar terminada em Julho, concluiu.