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Saiba como começou o caso das contrapartidas dos submarinos

14 fev, 2014 • Matilde Torres Pereira

Consórcio alemão Ferrostaal vendeu dois submarinos a Portugal, no valor de 880 milhões de euros, quando Durão Barroso era primeiro-ministro e Paulo Portas ministro da Defesa. O caso tem levantado polémica nos últimos anos, e esta sexta-feira, após uma série de manobras processuais, é finalmente conhecida a sentença.

Saiba como começou o caso das contrapartidas dos submarinos
Já passou mais de um ano desde o início do julgamento do caso das contrapartidas, ligado à aquisição por Portugal de dois submarinos à empresa alemã Man Ferrostal. O veredicto é finalmente anunciado esta sexta-feira.

Nas alegações finais, a 13 de Novembro, a defesa, sem surpresas, pediu a absolvição para os dez arguidos. O Ministério Público (MP), por seu lado, pediu, para todos, uma pena de prisão inferior a cinco anos, eventualmente suspensa, pelos crimes de burla e falsificação de documentos. A condição imposta para a aplicação de pena suspensa foi que os dez arguidos pagassem solidariamente ao Estado uma verba de 104 mil euros.

O procurador justificou a pena suspensa pela falta de antecedentes criminais dos arguidos, sublinhando que a sanção a aplicar aos três alemães tem de ser mais pesada, dado que foram os principais beneficiários do negócio.

Os portugueses acusados são José Pedro Ramalho, Filipe Moutinho, António Roquete, Rui Moura Santos, Fernando Gonçalves, António Lavrador, e José Medeiros. Os três alemães, Horst Weretecki, Antje Malinowski e Winfried Hotten (administrador da Ferrostaal), fizeram-se representar na instrução pelo advogado Godinho de Matos.

As “luvas” e as escutas do caso Portucale
O consórcio industrial alemão Ferrostaal vendeu, no valor de 880 milhões de euros, dois submarinos, o "Tridente" e o "Arpão", a Portugal quando Durão Barroso era primeiro-ministro e Paulo Portas ministro da Defesa. O caso tem levantado polémica nos últimos anos, com acusações de que faltam documentos  - algo que o Ministério Público já confirmou -, e de que a Justiça não tem querido ou podido investigar.

A investigação do caso começou com um documento retirado do processo de investigação do caso Portucale, onde, através de buscas e escutas telefónicas entre o ex-director financeiro do CDS-PP, Abel Pinheiro, Paulo Portas e António Pires de Lima, líderes do partido, foi identificada uma conta bancária na Suíça que terá alegadamente sido usada para esconder “luvas” pagas pelos alemães.

Foi nesse processo que surgiram as primeiras suspeitas de que terão sido pagos 30 milhões de euros pagas à Escom, uma empresa do grupo Banco Espírito Santo, pelo consórcio alemão que venceu o concurso público para a venda de submarinos. Esse dinheiro foi, de acordo com investigadores alemães, circulado por “paraísos” fiscais das Bahamas e Ilhas Cayman, e foram detectadas ligações entre essas transferências e depósitos em numerário de mais de um milhão de euros numa conta do CDS –PP.

Contornos internacionais do caso
A partir da investigação da compra dos submarinos surgiu então o caso das contrapartidas dos submarinos, em que os três empresários alemães ligados ao consórcio vencedor do concurso e sete portugueses foram acusados de burla qualificada e falsificação de documento. A 25 Janeiro de 2011, o Tribunal Central de Instrução Criminal decidiu levar a julgamento todos os arguidos.

Antes, em Junho de 2011, a directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Cândida Almeida, declarou que a investigação do processo ficou paralisada por não haver meios suficientes, e apesar de a directora ter feito vários pedidos ao Procurador-Geral da República para adjudicação de meios ao inquérito.

Meses depois desta suspensão do processo, dois ex-gestores da empresa alemã Man Ferrostaal, Johann-Friedrich Haun e Hans-Peter Muehlenbeck, começaram a ser julgados na Alemanha por suborno de funcionários públicos estrangeiros, incluindo o ex-cônsul honorário de Portugal em Munique, Jürgen Adolff, no âmbito da venda de submarinos a Portugal e à Grécia.

Os dois executivos alemães admitiram que pagaram subornos nos dois países para conseguir que ambos os países se decidissem pela compra de submarinos ao consórcio e foram condenados a pagar coimas de 36 mil e 18 mil euros, respectivamente, e pena suspensa. A Ferrostaal, também arguida no processo por crime de obtenção de vantagem económica através dos dois funcionários, terá de pagar uma coima de 140 milhões de euros até 2014.

Na Grécia, o ex-ministro da Defesa, Akis Tsochatzpoulos, foi detido por corrupção no âmbito de um negócio envolvendo submarinos e a Ferrostaal. A Grécia comprou, sob a sua tutela, em 2000, quatro submarinos à empresa por 2,85 mil milhões de euros. As investigações comprovaram que o antigo governante estava na lista dos beneficiários de 62 milhões de euros pagos em comissões.

As contrapartidas inexistentes
O Ministério Público defende que as contrapartidas garantidas ao Estado português para firmar o negócio dos submarinos - a captação de dez negócios com sociedades portuguesas que fabricam componentes para a indústria automóvel - são “fictícias”, porque não houve participação dos alemães na captação destes negócios, que terão resultado de relações comerciais já existentes.

Na óptica do MP, não houve, por isso, qualquer mais-valia proporcionada pelo consórcio alemão à economia nacional — o objectivo das contrapartidas — ficando o Estado português lesado em quase 34 milhões de euros.

Já depois da acusação, a Ferrostal fez chegar ao Governo português uma proposta alternativa, que passava pela reconstrução do Hotel Alfamar, no Algarve. Com base nesta proposta, a defesa dos arguidos alemães chegou a pedir aos juízes que declarassem a extinção do procedimento criminal, e cancelassem o julgamento, mas o MP opôs-se e o pedido foi recusado pelo tribunal.