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Santana Lopes "atordoado" com as acções do Syriza. "Os democratas são uns naïfs"

03 jul, 2015 • José Pedro Frazão

Os comentadores do programa “Fora da Caixa” analisam a relação entre a Europa e o Governo grego. Santana Lopes está surpreendido com algumas decisões do Syriza. António Vitorino admite que o Syriza desapontou algumas pessoas em Bruxelas.

Santana Lopes "atordoado" com as acções do Syriza. "Os democratas são uns naïfs"
Os comentadores do programa “Fora da Caixa” analisam a relação entre a Europa e o Governo grego. Santana Lopes está surpreendido com algumas decisões do Syriza. António Vitorino admite que o Syriza desapontou algumas pessoas em Bruxelas.

Os gregos não ajudaram à solução do seu próprio problema. É a conclusão a que chegam Pedro Santana Lopes e António Vitorino, comentando o impasse que leva à realização de um referendo no próximo domingo.

Ainda que as autoridades europeias, incluindo governantes influentes, tenham  desvalorizado o peso da consulta popular no processo negocial - a tese é de António Vitorino - as acções do Syriza são também criticadas pelos comentadores do “Fora da Caixa” da Renascença.
 
"Tudo o que se tem passado é dificilmente compreensível. Tentar perceber os objectivos, as atitudes... O que mais me impressionou foi o envolvimento da soberania de um povo - a arma de um referendo - num processo negocial, da maneira como foi tratado. Tinha olhado para estas pessoas do Syriza como quem faz parte de um sistema democrático, que lhe querem bem. Fiquei agora atordoado nessa avaliação", diz Pedro Santana Lopes no debate semanal de actualidade europeia na Renascença.
 
Já António Vitorino sublinha dois factores que podem explicar uma resposta “timorata” de Bruxelas às posições do Governo grego.

“Em primeiro lugar, havia desconfiança desde o início, por razões ideológicas, de um lado e do outro. Em segundo lugar, os gregos encarregaram-se de alienar os poucos apoios e simpatias que tinham. Não é possível chamar nazis e depois esperar qualquer tipo de boa vontade do outro lado. Isto teve influência no processo. Não se pode começar por insultar a outra parte. Quem é que negoceia de boa-fé com alguém que nos insulta a torto e a direito?”, questiona o antigo comissário europeu.

António Vitorino diz que o Syriza só se pode queixar dos fracos resultados que apresentou neste semestre no poder em Atenas.

“O Syriza nunca apresentou um modelo alternativo de reformas estruturais. Se o Syriza acabou confinado a discutir mais ou menos um ponto no IRC, se as ilhas pagavam IVA ou não, foi porque não apresentou uma estratégia alternativa.”

O comentador socialista diz ter testemunhado que, quando o Syriza ganhou as eleições, “havia uma certa  expectativa nos meios europeus de que um Governo descomprometido com as oligarquias dominantes, seria rapidamente capaz de pôr no terreno algumas das reformas, nomeadamente no domínio fiscal, atingindo certos sectores cruciais da economia que eram factores de entorpecimento económico. O balanço que se faz hoje em Bruxelas do que o Syriza fez nestes cinco meses e meio é zero”.
 
Santana Lopes concorda e até ensaia uma comparação com forças políticas congéneres em Portugal. “Por muito que, no debate político interno, se tente dizer que o PS gosta do Syriza, o Syriza não é social-democrata nem socialista. O Syriza, cá, é o equivalente ao Bloco de Esquerda e essa ‘zona’ [política]. Era como se estivéssemos a negociar em Bruxelas com um Governo do Bloco de Esquerda em Portugal. Devo dizer que estou convencido que, pelo que conheço do Bloco, que a coisa não seria tão complicada como está a ser aqui”, admite o antigo primeiro-ministro, que deixa um desabafo sobre a natureza da política.
 
“Os democratas são uns ‘naïfs’. É a conclusão a que chego. Nós todos somos ‘naïfs’. Independentemente do homem bom ou mau de Rousseau, nós acreditamos na natureza humana, na boa vontade. Seja de direita ou esquerda”, remata Santana Lopes.

O programa "Fora da Caixa" é uma parceria Renascença/Euranet, para ouvir depois das 23h00 de sexta-feira.