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Vai investir em obrigações do Benfica, Porto ou Sporting? Leia este artigo

02 jul, 2015 • João Carlos Malta

Rendem juros muito acima da média do mercado, mas têm riscos proporcionais. Analista de mercado deixa conselhos.

Vai investir em obrigações do Benfica, Porto ou Sporting? Leia este artigo
A moda dos empréstimos obrigacionistas entre os clubes de futebol parece que veio para ficar. No início desta semana, foi o Benfica a lançar a subscrição de 55 milhões entre este ano e 2018. É a terceiro operação deste género dos três grandes em dois meses.

Estes investimentos rendem juros muito acima da média do mercado. Olhe-se para os três "grandes" do futebol português: o Sporting está a pagar 6,25% brutos, enquanto o FC Porto paga 5% e o Benfica 4,75%. Os valores líquidos são um pouco mais baixos.

Aliciante? Sim, mas o risco é proporcional. A Renascença falou com Pedro Lino, especialista em mercados financeiros, que enquadra este tipo de investimentos e deixa um conjunto de conselhos.

Lino chama a atenção para as dívidas das sociedades anónimas dos três maiores clubes portugueses: "Estão tecnicamente falidos e por isso mais sujeitos a reestruturações."

OOs três "grandes" têm lançado nos últimos dois meses um conjunto de empréstimos obrigacionistas. Em primeiro lugar, o que é um empréstimo obrigacionista?
É quando uma empresa precisa de dinheiro e, ao invés de ir aos seus accionistas, vai procurar esse financiamento junto de investidores e emite obrigações. A empresa fica com a obrigação de voltar a pagar o dinheiro que o investidor emprestou, acrescido de um juro. Daí a diferença entre obrigacionista e accionista. Porque o accionista é dono da empresa e às vezes faz suprimentos. Um obrigacionista não tem direito ao património, tem direito ao rendimento e ao capital que lá colocou.

Este tipo de investimento que envolve dinheiro e futebol rege-se pelos mesmos padrões de racionalidade?
Não. O investimento em clubes de futebol é muito mais emotivo e sentimental, tem mais a ver com a filiação no clube do que com um investimento racional, isto se olharmos para as contas. Para isso não é despiciendo que não haja casas de investimento que analisem os clubes de futebol e que dêem preços de referência. Se olharmos para os balanços dos clubes, eles tecnicamente estão falidos. Têm dívidas muito elevadas e dependem das jornadas de cada campeonato para que possam gerar receita. É um mercado muito específico que atrai os investidores pelas taxas de juro.

As taxas de juro que vemos nas emissões obrigacionistas dos três grandes são muito altas para a média do mercado. Como é que é possível fazer uma retribuição tão elevada?
Como este é um negócio de maior risco, está associado a uma maior taxa de juro. O que os investidores têm de perceber é que sempre que existe uma emissão de obrigações ou uma empresa que paga uma taxa de juro superior isso quer dizer que o nível de risco é maior.

É o que acontece nos clubes: se olharmos para o balanço do Benfica no ano passado, o capital próprio era negativo (significa que se o clube fosse encerrado ainda ficava a dever dinheiro). Este ano, felizmente, já tem capital próprio positivo de 5,8 milhões de euros. Mas este é um exemplo muito interessante, porque tem um passivo total de 408 milhões para um capital próprio de apenas cinco milhões e pretende emitir ate 55 milhões.

É um negócio diferente do de uma empresa onde se consegue perspectivar a evolução futura da actividade. Neste caso, é um negócio que só ano a ano se consegue prever qual a actividade do clube.

Referiu as dívidas elevadas que os clubes têm, nomeadamente o Benfica. Quais é que são os riscos destas operações para os investidores?
É que, em caso de dificuldades, o clube pode ver a sua dívida reestruturada, ou seja, [os investidores] podem ter colocado mil euros e de um momento para o outro o clube renegociar e pagar apenas 500 euros ao investidor. Existe um risco de reestruturação caso o clube não consiga vencer campeonatos ou gerar receitas suficientes. Este é um risco real, daí a taxa de juro elevada que tem de ser paga aos investidores.

Que conselhos daria aos investidores antes de investirem nestas obrigações?
Primeiro, lerem o prospecto resumido que foi publicado na CMVM – se bem que o prospecto total tem 125 páginas [no caso do Benfica], o que é algo muito fastidioso para qualquer um ler. Mas só por aí também se percebe que existe um capítulo substancial ligado aos riscos. O conselho é que os investidores coloquem só o dinheiro que não precisam, mas que mesmo assim coloquem uma muito pequena parte do seu capital em operações deste nível. Apesar de a taxa de juro ser elevada, o risco também o pode ser.

Os clubes de futebol parecem estar cada vez mais viciados neste tipo de operação. A CMVM devia apertar as condições em que permite estas iniciativas?
A CMVM já obriga o Benfica a ter um prospecto de 125 páginas e posso-lhe dizer que nenhum ou poucos investidores que vão subscrever o vão ler. Por isso, os riscos estão já todos detalhados. Há 15 páginas sobre eles, a questão é mais sobre a iliteracia financeira dos investidores. E as pessoas não olham para os riscos que lá estão. A CMVM exigiu que eles fossem publicados. A CMVM também não pode dizer se os investidores podem ou não subscrever. Os riscos estão lá, cada um tem de tomar as suas decisões.