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Plano não funciona "se PS mantiver a cultura que teve no passado", avisa co-autor

23 abr, 2015 • José Pedro Frazão

Economista Paulo Trigo Pereira pressiona o PS a adoptar 11 medidas estruturais do cenário macroeconómico. "Poria em causa todo o exercício", diz à Renascença.

Plano não funciona "se PS mantiver a cultura que teve no passado", avisa co-autor
Um ministro das Finanças que venha do aparelho do PS pode ser "mais permeável a pressões" do que um independente, admite Paulo Trigo Pereira, um dos 12 economistas envolvidos na construção do cenário macroeconómico socialista.

Em declarações ao programa Conselho de Directores da Renascença, o professor do ISEG diz que não é "candidato a candidato" a ministro e elenca 11 medidas estruturais que dificilmente o PS pode retirar do seu programa.

Seria uma "desilusão" e "poria em causa todo o exercício", avisa. E deixa um aviso: "Se o PS mantiver a cultura que teve no passado, não se consegue implementar isto."

As 11 medidas que dificilmente podem ser substituídas
Cinco que "agravam o défice": "eliminar a sobretaxa de IRS; compromisso para o emprego; a requalificação do património; a política de reposição dos salários; e [a redução do] IVA da restauração".

Seis que "melhoram o défice": "a penalização da rotação excessiva em termos de taxa contributiva; a aplicação da condição de recursos a todas as prestações contributivas; a aceleração da execução dos fundos comunitários; uma que não é medida, mas que tem um impacto no défice: a poupança em juros; o imposto sucessório; e as políticas de pensões."

PS deve abandonar "cultura" do "passado"
"Se o PS mantiver a cultura que teve no passado, não se consegue implementar isto. Há aqui uma transformação e é também para isso que eu escrevo no 'Público', é para tentar mudar a cultura de toda a gente do ponto de vista das finanças públicas, uma cultura que seja consentânea com a nossa permanência no euro."

Ministro das Finanças não independente é mais pressionável
"Ser independente ou não ser independente é irrelevante. Quer dizer, não é irrelevante. Se calhar, é mais permeável a pressões quem for do PS… Mas acho que, se calhar, há gente no PS imune às pressões. O fundamental é ter uma pessoa que, de facto, perceba a situação do país e assuma. Eu não sou candidato a candidato [a ministro]."

"País ingovernável com governos minoritários"
"Sou completamente contra que qualquer Governo neste país seja minoritário. Este país é ingovernável com governos minoritários na próxima legislatura. A próxima legislatura vai ser uma legislatura difícil ainda, de grande contenção orçamental. Só daqui a duas legislaturas é que eu acho que, se tudo correr bem, nós temos a dívida a cair. A principal razão pela qual recorremos a um resgate está agravada, que é o rácio da dívida no PIB, subiu e ainda não começou a descer. Isto é tudo cenários. Nós precisamos ainda de uma legislatura inteira para consolidação orçamental."

Aberto ao escrutínio
A ministra das Finanças sugeriu ao PS que envie as suas contas para análise no Conselho de Finanças Públicas ou na Unidade Técnica de Apoio Orçamental. Trigo Pereira não vê nisso uma ameaça: "Gostava imenso que o Conselho de Finanças Públicas analisasse estas propostas e estas simulações. Teríamos todo o gosto."

"Há medidas que esquerda pode subscrever"
"Partidos como o Livre – conheço bem o Rui Tavares – poderiam perfeitamente endossar isto. (…) Pomos um imposto sobre as heranças, aumentamos a progressividade do IRS, fazemos um forte combate à precariedade. Não tocamos num aspecto muito importante, mas estou em crer que o PS vai abordar: os recibos verdes. Há uma série de medidas que partidos que acham que são de esquerda podem perfeitamente subscrever."

TSU e a aposta no consumo
"A proposta que está no documento é substituir o consumo presente em relação ao consumo futuro. As pessoas consomem mais no presente e consumirão menos no futuro. A necessidade disto é porque estamos numa situação em que é necessário relançar a procura agregada em Portugal. É isso que distingue significativamente esta proposta daquilo que tem sido feito pelo Governo – que é só actuar do lado da oferta e pensar que actuando só aí a economia começa a crescer. Nós achamos que não. Achamos que é necessário algum alívio para as famílias. No fundo, a redução da taxa contributiva dos trabalhadores para a Segurança Social vai aumentar o rendimento disponível das famílias."

Via para investimento: acelerar execução de fundos
"É uma coisa crucial. É o único dinheiro que recebemos e que podemos usar. Estar a esbanjá-lo, ao não executar, é um luxo a que não nos podemos dar. Temos de acelerar a execução, tem de ser feita de forma muito ágil para relançar a economia."

Baixar impostos e uma proposta que não está no plano
"Quero baixar impostos e também quero baixar as taxas que a Autoridade Tributária nos cobra quando nos esquecemos de pagar um imposto. A medida é criar uma lei-quadro das taxas, ou seja, vivemos uma situação inacreditável. Uma pessoa atrasa-se dez dias no IUC e paga, além da coima mínima de 50 euros, 35 euros de custas de mandar uma carta, que é automática. Temos hoje em Portugal uma lei das taxas municipais, deve haver uma lei-quadro das taxas do país. A Autoridade Tributária tem de justificar porque é que cobra um determinado montante ao contribuinte."

Alternativa ao quociente familiar
O PS quer acabar com o quociente familiar, introduzido este ano, por considerar que é regressivo. "Diz que um filho de um rico vale mais que um filho de um pobre", diz. O filho de uma classe muito alta representa um maior abatimento na colecta de IRS do que o de uma família pobre, argumenta. "Isto é justo?", pergunta. Em alternativa, os peritos do PS apostam no reforço do abono de família e nas deduções à colecta.

"Estou convencido que a Grécia vai sair do euro"
"A saída da Grécia do euro, obviamente, tem um impacto imediato, mas não acho que tenha um grande impacto em Portugal. Tinha que ser mais do que isso. Tinha que ser um problema na Ucrânia. A protecção da zona euro, excluindo a Grécia, já foi feita nos últimos três anos. Gostaria muito que a Grécia não saísse do euro, [mas] desde o princípio estou convencido que vai sair".

[Notícia actualizada às 22h58 de quinta-feira]